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(21.Abril.1925 – 30.Novembro.2019) |
CALEIDOSCÓPIO 87 EFEMÉRIDES – Dia 27 de Março Joan Fleming (1908-1980) – Joan Margaret Fleming nasce em Horwich,
Lancashire, Inglaterra. Inicia-se como
escritora de livros infantis e publica o primeiro policiário em 1949, Two Lovers Too Many. É autora de um total de 32 livros – thrillers e novelas góticas. Cria o
personagem Nuri Bey Izkirlak, um detective filósofo
turco que protagoniza os livros com que vence por duas vezes o Gold Dagger: When I Grow Rich (1962) e Young Man I Think You're Dying (1970). René-Charles Rey (1934-2011) –
Nasce em Tunes onde vive até 1964, fixando-se depois em Chilly-Mazarin
nos arredores de Paris. Apaixonado por história, ficção científica e banda
desenhada inicia-se muito jovem na escrita. No entanto só publica o seu
primeiro livro policiário, Descente En Torche em 1974 com o
pseudónimo Emmanuel Errer (iniciais R R do nome) que passa a utilizar nos romances negros com
temas de espionagem ou ficção política. Utiliza ainda o pseudónimo Charles Nécrorian na escrita de alguns romances de terror
notáveis. Sob o pseudónimo Jean Mazarin publica
vários policiários onde os problemas da sociedade são tratados com humor e
onde se destacam os seguintes personagens: Esope Mazonetta, um napolitano que depois de uma passagem por
Tunes se instala na Côte D’ Azur;
Lucien Poirel, o mais
jovem comissário de França; Max Bichon, um repórter
de assassinatos; Julien Jendrejeski,
um agente especial em missões delicadas no estrangeiro; e Frankie-Pat
Puntacavello, detective
privado em Nice. O autor escreve 50 romance e em 1983 recebe o Le Grand Prix
De La Littérature Policière
pelo livro Collabo Song (Jean Mazarin). TEMA – CONTO A CONFERÊNCIA PEDAGÓGICA De René-Charles Rey foi
publicado na revista Les Amies
do Crime Nº14 (1983?), como “Conto Inédito” escrito em 1956, e aqui se
apresenta numa tradução de DJ&JOTA. Era uma
conferência pedagógica como as outras, com essa atmosfera particular que
cheirava a passatempo e a tinta violeta. Olhei em volta para tentar deslindar
os rostos nas caras atentas. Cada um tinha a sua própria forma para se fazer
notar pelo senhor inspector, demonstrado aos
colegas o pouco interesse das palavras do homenzinho gordo que se agitava
diante do quadro negro Num canto, as professoras mais jovens às vezes
galhofavam como estudantes de bancos universitários, desmamadas cedo demais.
Na primeira fila, o jovem loiro sonhava, pensando na sua companheira com quem
faria amor durante a tarde sobre o sofá do seu apartamento, como todas as
quintas feiras. Soltou uma palavra mais alta e corou como se os colegas, de
repente detentores de poderes mágicos, pudessem adivinhar os segredos dos
seus sonhos. Diante do
quadro negro, o homenzinho procurava penetrar nos segredos de uma psicologia
infantil que lhe fugia constantemente. Era um homenzinho bem vestido, com o
nó de gravata impecável, cujos sapatos encarniçados contrastavam de forma
enervante com o azul marinho do fato. Falava com uma
voz clara e por vezes cantante, utilizando palavras simples ou pedantes, por
vezes, que denunciavam o antigo professor. Tinha essa aptidão um pouco sisuda
que as pessoas de um círculo bem definido adquirem. Partiu cuidadosamente um
pedaço de giz, para o impedir de chiar no quadro, sorrindo: – O importante
é o giz. Parti-lo é uma arte. As primeiras
filas fizeram um riso forçado para mostrar que gostavam de piadas. O
homenzinho traçou linhas direitas, bem paralelas, de que se orgulhava e
preparou-se para inserir um quadro sinopse. – Tomem notas,
porque não encontraram isto em nenhum manual. Todos se
atarefaram e traçaram linhas sobrepostas, procurando inserir o que lhes
restava de poesia pessoal. Uma das professoras terminou-as em caracol e
mostrou-as às colegas que se divertiram novamente. De repente
senti uma pressão no peito e tive vontade de vomitar. Lembrei-me então da
mousse de chocolate, que engoli à pressa antes de me vir sentar, como em
todas as quintas feiras, no banco negro e sujo desta escola comunal onde se
jogava o meu futuro. Tenho então vontade de me levantar e de gritar, não
insultos aos meus colegas nem mesmo contra o homenzinho, mas coisas sem pés
nem cabeça, idiotices, só para provar a mim mesmo que, além do mais, eu ainda
existia. O inspector virou-se e o nosso olhar cruzou-se. Ele
olhou-me fixamente e eu olhei-o fixamente, imaginando que tivéssemos, talvez,
os mesmos pensamentos no mesmo momento. Eu acreditava ter descoberto nos
olhos dele uma censura muda, uma desculpa. – Eu sei que
tu não acreditas, nenhum de vocês acredita, mas isso não é da minha conta. Depois
virou-se e consultou uma lista que descobriu na sua agenda: – Menina Dupréaux, venha apresentar-nos
as suas meditações sobre a leitura na escola primária. Houve
sorrisos. A jovem corou e levantou-se, aparentando indignação, mas dentro de
no fundo, estava feliz por ir encontrar sua verdadeira juventude diante de um
quadro negro. Em qualquer outro lugar, a sua atitude teria sido encantadora,
mas aqui pareceu-me inoportuna e irritante. Começou a ler um resumo austero
que deve ter encontrado num livro velho com cheiro a mofo e a escola primária.
A sala estremeceu. Cada um parecia de repente estar entusiasmado com alguma
coisa que desprezara durante toda a semana. Alguns já preparavam os
comentários, não parecendo viver senão para dar luta à jovem, como se o que
alcançassem nela fosse seu próprio medo. Ela resmungou, procurando incentivo
silencioso no olhar paternal do Sr. Inspector. Enfiei a mão
no fundo do bolso interno do fato e os dedos crispados reconheceram o frio
metálico da arma. Não sabia como estava no meu bolso, ou porque é que os meus
dedos a acariciavam, como se acaricia a anca de uma apaixonada. Deve tê-la
guardado inconscientemente esta manhã antes de sair de casa A jovem ficou
em silêncio e um murmúrio de desaprovação encheu a sala. Alguns ansiosamente
levantaram o dedo, mas o inspector fingiu não os
ver, saboreando devagar o súbito interesse deles pelas coisas em que ele se
forçava acreditar. Sorriu inocentemente para a jovem professora e num tom voz
condescendente, para tentar marcar o fosso que os separava, declarou: – Sim menina, mas… O “Mas” do Sr.
Inspector parecia ser o sinal de incentivo que a
morte esperava. Não existiu contenção nesta explosão de arrivismo mesquinho.
Levantei-me e caminhei em direcção ao Sr. Inspector que não parecia prestar-me atenção, porque
iniciava uma longa acusação. Quando passei perto dele, levantou o sobrolho, e
em seguida continuou a declamar: — O Sr. Errer tem
provavelmente vontade de mijar… pensou ele
provavelmente entre duas palavras. Parei em frente do estrado e, lentamente,
tirei a arma, então disparei sem pressa, com calma, olhando para os impactos
sobre o fato azul-marinho onde apareciam manchas mais escuras. Quando a arma
ficou vazia, deitei-a fora e sai para o pátio, sem sequer ouvir os gritos que
sobrevieram o silêncio dos disparos. Foi uma derrota de crianças, que
privadas de repente dos pais procuravam agarrar-se a algo que conseguissem
entender. Saí para a rua
e dei uns passos na calçada. Estava bom tempo e sol espirrou fachadas. No
passeio, à minha frente, uma rapariga veio ao meu
encontro. Uma rapariga com traços vulgares com andar de prostituta. Retribuiu
o meu sorriso e acentuou o balançar das ancas que me tocaram, mas não a
segui. Avancei em passo lento. Os gritos irromperam – Parem-no… o
assassino…o assassino Parecia que
estava a sonhar com uma daquelas histórias de ladrões que haviam feito as
minhas delícias durante as aulas de leitura no curso superior. Encolhi os
ombros e voltei para trás. Tinha perdido, Eles tinham encontrado um novo
mestre René-Charles Rey (1956). M.
Constantino In Policiário de
Bolso,
27 de Março de 2012
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© DANIEL FALCÃO |
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