CORREIO POLICIAL Publicação: “Correio do Ribatejo” Coordenação: Domingos Cabral Data: 11 de Novembro de 2011 |
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PROBLEMA POLICIAL MORTE
PARA UM TIRANO Autor:
M. Constantino Era uma vez um rei. Rei glutão. Rei brutal, egoísta, jamais se dignara olhar o povo esfarrapado e faminto, sacrificado… a não ser no necessário à satisfação dos seus reais apetites! Naquele dia… Naquele dia, Primavera na natura, Inverno impotente nos corações, o rei fazia anos. Afadigavam-se mais uma vez os bons súbditos, vindos dos mais longínquos cantos dos vastos domínios, a ofertar-lhe os mais requintados acepipes. Carnes, vegetais superiormente cozinhados, frutas… O rei olhava desdenhosamente, servia-se voraz do que lhe agradava, afastando com o pé, ou com o forte bastão, brutal e superfluamente, o submisso ofertante. Todos os alimentos eram, porém, antecipadamente sujeitos a rigorosa prova contraveneno, pelos cães, pelos escravos, e até pelos coelhos que lhe serviam de cobaias, porque o rei em ninguém confiava. Não raras vezes um ser humano acabava na ponta de uma corda ou sob o azorrague do carrasco. Mais um escravo ajoelhou, submisso, mostrando apetitosa salada de alface. Os olhos do monarca luziram de gula. Pontapeou o ofertante, deu a provar a um coelhinho branco que conservava ao colo, e só se banqueteou depois de eliminada qualquer suspeita de envenenamento. Contudo… o coelhinho branco alegre e saltitante, viveu; o rei, chamados à pressa os magos da ciência daqueles tempos de antanho, só puderam verificar o seu estado alarmante, que se resumia em diminuição da acuidade visual, pela midríase, secura da boca (dificuldade de deglutição), rigidez dos membros, o delírio, a coma, e por fim… era uma vez um rei… fora uma vez um rei… Vieram os medicamentos, os feiticeiros, os magos mais magos, mas o rei… continuava morto. E, como sempre acontece… rei morto não dá pontapé… não reclama… Reuniu o conselho dos “velhos”, troaram pelas praças, pelos vales e montes os rufares dos tambores e a voz dos arautos, procurando um rei, um novo rei. Uma condição: responder à pergunta que andava nos lábios de toda a gente e que, parecia, ninguém poderia responder: – Como fora envenenado o tirano? Da serra, onde vivia com o seu rebanho, desceu o jovem pastor. Prometera à sua amada um reino, um reino de sonho… Traz, na sacola, o magro pão dos pobres, no olhar uma promessa de bondade, no coração uma vontade indómita. Deus é grande! Diante do conselho reunido, ouviu, raciocinou e RESPONDEU!... Hoje, o povo desse reino sonha realmente. Vive feliz e adora o rei. O rei-pastor e a sua pastorinha. Na bandeira que se avista a léguas em redor, pode ver-se um gentil coelhinho branco sobre um feixe de mandrágoras do monte, de grandes folhas verde-escuras. Bandeira que jamais se desfraldará para a guerra, símbolo de um reino, realmente, de sonho. À lareira, nas longas noites de Inverno, após a história ser contada e recontada, ainda se ouve a obrigatória pergunta: – Como foi morto o rei, apesar da sua precaução? |
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© DANIEL FALCÃO |