CLUBE  DE  DETECTIVES

 

TORNEIO JARTUR MAMEDE

Problema nº 7

 

 

Solução de:

 

O APRENDIZ FIDALGO

Autor: Inspector Fidalgo

 

A primeira reacção ao ler o desafio é verificar se se tratou de um acidente ou de um suicídio. Para tal ocorrer, o João teria de accionar a cadeira, inadvertida ou involuntariamente e deslocar-se sozinho até ao cima das escadas.

Depois, por descuido acidental ou suicídio, cair pelas escadas. Só que isso não é possível, pelo seguinte:

– A porta do quarto tem uma mola que a mantém fechada e ela está fechada, segundo o que o criado afirmou, quando por lá passou. O João não tem capacidade para abrir ou fechar a porta, porque mal consegue accionar o comando da cadeira. Se o José, por qualquer motivo, deixou a porta aberta ao sair, o João poderia sair mas não conseguia, depois de passar, fechá-la.

– O José diz que deixou o carregador ligado à cadeira para recarregar a bateria, mas o cabo é recuperado pelo investigador, enrolado, na bolsa da cadeira acidentada. O João não o poderia fazer. O cabo tinha que estar agarrado à tomada ou à cadeira, ou algures no chão, entre o quarto e o fundo das escadas;

– A cadeira só funciona com os cintos de segurança colocados e estes impedem a queda do corpo em todas as situações. O corpo do João não poderia aparecer ao fundo das escadas e a cadeira uns metros à frente.

Se estava amarrado e a cadeira podia trabalhar, tinha que estar preso à cadeira. Se estava separado dela, então não podia estar amarrado e por isso a cadeira não funcionava.

Se a porta estivesse aberta e a cadeira trabalhasse, mesmo assim, a cadeira tinha que accionar o alarme do corredor, ao passar para as escadas.

Em todos os factores temos que ter em atenção que o João mal consegue accionar o comando; portanto, não tinha, sozinho, autonomia e capacidade para mais.

Conclusão: não foi acidente nem suicídio.

 

Excluídas essas possibilidades, temos que chegar ao homicídio.

Há no problema três suspeitos:

Criado: Parece certo que foi levar o Jaime à cama, ajudá-lo a deitar-se. A única maneira era ir até ao quarto do João, depois de o José o deixar, desligar o cabo, enrolá-lo e metê-lo na bolsa da cadeira, transportar o João para o corredor, depois de abrir a porta (largando-a de seguida, fechando-a), levar a cadeira manualmente até ao fio sensor do alarme, levantar as duas rodas dianteiras e passá-las por cima, sem tocar, depois de erguer as duas traseiras e passá-las do mesmo modo, não accionando o alarme. Conduzia o João até ao cimo das escadas, desapertava os cintos e atirava a cadeira com o João pelas escadas abaixo. Regressava rapidamente à porta do Jaime e simulava que ia em direcção às escadas quando o José saiu do quarto.

Tudo parece correcto; mas há um pormenor: o criado é deficiente de uma perna e tem pouca mobilidade; arrasta mesmo a perna doente e como o José veio logo à porta depois do estrondo, segundo afirma, não poderia ter percorrido os 4 metros do primeiro corredor, mais o restante corredor longo, sem ser surpreendido pelo José ainda nesse trajecto de ida.

Para além de, aparentemente, não ter motivo para esse acto, não teve oportunidade, também.

Jaime: dormia como um calhau! Nem acordou com os barulhos nem com as correrias. De qualquer forma, nunca poderia chegar ao quarto do irmão sem passar pelo criado e é, por isso, completamente ilibado por ele.

José: Na sua história, ao levar o irmão para o quarto, como não tinha nada a temer nem a esconder, passaria com a cadeira pelo fio sensor, como sempre fazia, o que accionaria o alarme; mas o criado não ouviu esse toque, porque não aconteceu;

– Não pôs a bateria a carregar, como afirmou, porque o cabo estava enrolado na bolsa da cadeira acidentada e não preso à bateria, à tomada ou largado em qualquer ponto do trajecto entre o quarto e o fim da escadaria. Assim, apenas ele ou outro alguém o poderia fazer, porque o João não se podia soltar sozinho.

– Mas o factor mais determinante e fulcral foi que, ao sair do seu quarto, reparou que o criado vinha lá do fundo a arrastar a perna, mas, em vez de virar à direita para o quarto do irmão, onde o deixara há pouco e de onde seria lógico vir o estrondo (o próprio criado disse que pensou ir para lá, mas depois seguiu o José. Ora, como não tocou o alarme, a única conclusão que poderia retirar era de que o irmão estava ainda daquele lado), mas, em vez disso, foi logo para o sítio menos lógico – as escadas. Não pode alegar que foi atrás dos gritos do piso debaixo, porque ele “correu para as escadas, ouvindo logo depois os gritos dos outros empregados”.

Decidiu, portanto, primeiro correr para as escadas e só depois ouviu os gritos.

 

Apenas o José estava em condições de cometer o crime.

Vindos da rua, subiram pelo elevador. Soltou o irmão e atirou-o pelas escadas com a pesada cadeira, recolhendo rapidamente à porta do seu  quarto, de onde saiu quando o criado apareceu lá ao fundo. Correu para a escadaria…

 

{ publicado na secção “Mundo dos Passatempos” do jornal “O Almeirinense” em 15 de Abril de 2009 }

 

 

© DANIEL FALCÃO, 2009