CLUBE DE DETECTIVES |
TORNEIO
JARTUR MAMEDE Problema
nº 8 |
||
|
Solução de: A TRILHA
DO MORTO Autor:
Mário Campino Como sempre, sou
parco nas soluções. Limitei-me ao essencial, sempre com fundamento no texto
base, já que entendo que as grandes explicações e interrogações próprias
pertencem aos solucionistas, em ordem a valorizar
os seus trabalhos. Começo por
esclarecer que, no enigma em análise, só o crime é pura ficção; as
personagens são reais em 80% dos casos. Tudo o mais, conflitos e amizades com
a natureza, ora hostil ora benigna, lugares, citações, a maneira de falar típica
da classe rural – que a memória me traz em sons activos e me enchem o coração
de saudável saudade – são reais, reportados aos finais dos anos quarenta do
último século; ainda hoje se encontram resquícios… só que, naqueles tempos, a
linguagem, parecendo rude, talvez brutal, era ingénua, sincera, geradora de
empatia. Mas vamos à solução: Releva a motivação
na pessoa de Quim Faia. Devem ter-se encontrado,
algures, perto da casa do Jerónimo. Ciúmes? Duvido. Talvez para se defender
da prometida “cachaporrada” do To Zé. Atacado,
atacou com uma pedra, ágil, rufia; depois, com um pau do adversário, terminou
a obra. Lembramos, em favor do exposto, que deixou os óculos azuis sobre a
arca do Casal e que, ao fugir, não os levou, porquanto aparece ao Zé Vicente
sem eles – o Vicente notou mesmo, nos olhos acastanhados, a ansiedade, talvez
medo. Quando chegou de Benfica e levou o raspanete de Jerónimo, levava-os na
cara (ver texto). A Ana não voltou a vê-lo e ele não poderia entrar no Casal
sem ser visto. Recordemos, ainda, que o To Zé, quando o foi procurar, levava duas
lembranças; uma, a cachaporra; a outra, adivinha-se,
seriam os óculos com que a vítima o iria confrontar pela sua presença na
casa. O Quim aproveitou para os reaver. Dirão os
leitores que poderia ter comprado outros. Fora de questão! Naqueles tempos,
em Portugal, eram raridade, mesmo na capital do país… Posto isto, uma
teoria possível para explicar os acontecimentos: o Tó
Zé, quando chegou aos Paços, tomou conhecimento de que o Quim
estaria em casa do Jerónimo – a falta de memória do Zé Vicente é como uma
confissão do receio de se ter comprometido. A vítima encontra o rival a dar
de comer aos animais; ainda não tivera tempo de ordenhar as vacas (o que não
chegará a fazer, pois a Rosa Leiteira acusa o Jerónimo de não lhe ter deixado
o leite duas vezes - próprio dia e seguinte; as próprias vacas são
testemunhas barulhentas do facto pelo evidente sofrimento das tetas super
cheias, pois mugiam e não comiam. (Não há que admirar que a leiteira, quando
procurou o leite, não encontrasse o Quim, antes ou
depois da morte; naqueles tempos, as bilhas de zinco, com tampas também em
zinco, eram postas às portas dos produtores. A informação é secundária para
os solucionistas - que não têm obrigação de
conhecer usos - e cita-se por ser um facto real). Do encontro resulta
a morte. Quim desespera… Tem de ir para Benfica,
para afastar suspeitas, mas não pode deixar ali a prova do seu crime. Pensa
deixá-la à porta do Casal… Talvez ninguém o tivesse visto, nos Paços. Vai,
pois, buscar o burro, coloca o cadáver entre um dos dois molhos de canas e a
bicicleta, que fica em cima destes. Quando a noite se aproxima, começa a
chover, o que o favorece quanto a possíveis encontros no caminho. Mete-se à
estrada, arenosa, mas tem dificuldades em manter a carga, dado o
desequilíbrio do peso do corpo (ver texto). Próximo do Casal, depara com a
seara e irá deixar o corpo bem à vista. Resolve não se aproximar do Casal,
pois a “Ruiva” pode estar à espera do ausente. Ao ver a grade, tem uma ideia
(pensa ele) genial. Consegue pôr os tirantes no burro; depois de tirar as
canas, coloca o corpo sobre a grade, sobe ele, também, para ela e toca o
burro até ao termo do terreno lavrado. Volta pelo mesmo sítio e larga o corpo
no centro do terreno, deixando a grade tal como a encontrou. A chuva dessa
noite oculta prováveis indícios, mas deixará um só, bem patente: ao nono dia
de semeadura, o trigo a despontar é arrancado e não
voltará a nascer, deixando em seu lugar uma trilha – a trilha do morto!!! Foi pôr as canas na
rima do Daniel Bicho, soltou o burro que (como burro) procura a casa, mas
vinga-se nas couves! Ele… monta a bicicleta e dirige-se a Benfica, para que o
vejam, regressando no dia seguinte, para ajudar (?) nas buscas. É tanto
quanto me lembro das conversas que ouvi, dos contactos com todos os
personagens e, sobretudo, da voz tranquila, repousante, assisada,
do Avô Palaló. { publicado na secção “Mundo dos Passatempos” do jornal “O Almeirinense” em 1 de Maio de 2009 } |
|
|
© DANIEL FALCÃO, 2009 |
|||