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CLUBE DE DETECTIVES |
CAMPEONATO
NACIONAL 2003/2004 Prova nº 3 |
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Solução de: A MORTE DANÇA O BOLERO Autor: A. Raposo
Nota prévia: este problema foi-me inspirado numa notícia que li sobre um caso sucedido há uns anos no Vaticano, entre a guarda suíça, e que a revista “Pública” de 12-10-03 retratou… “Tornay foi encontrado morto, de barriga para baixo, com a pistola debaixo do corpo depois de alegadamente se ter suicidado com um tiro na boca. Uma posição insólita, já que quando um homem dispara um tiro na boca, quando o corpo cai por terra, cai de costas! A menos que tivessem imobilizado o corpo e depois disparado.” A partir desta ideia-base construí o problema aproveitando para lhe juntar uns ingredientes para baralhar os solucionistas… Naquela vivenda, onde se passa a acção, temos em simultâneo: 1 – O capitão Magalhães na biblioteca, no 1º andar, preparando-se para tocar na sua aparelhagem um CD, com a gravação do célebre Bolero, de Ravel; 2 – No rés-do-chão e ao fundo da casa a cozinheira a tratar das panelas; 3 – No 2º andar e sobre a biblioteca o sobrinho mais novo a navegar na Net; 4 – Na cave o sobrinho mais velho a carpinteirar com uma lixadora eléctrica; 5 – No jardim, no exterior, o jardineiro a tratar das flores, mas sob a janela da biblioteca, a qual sempre ficou semiaberta, ou melhor, semifechada, para quem prefira. A peça musical de Ravel tem uma
particularidade: tem a duração de 16 minutos, alguns segundos mais, mas para
chegar a ouvir-se a um nível que chegue às outras divisões da casa precisa de
uns dez minutos, pois o som vai sempre Sendo o sobrinho mais velho o único que entra na biblioteca após a morte do capitão e que sai fechando à chave a porta, então precisamos de lhe atribuir também alguns outros dados que o morto não poderia executar: 1 – Tirar o disco do aparelho e colocá-lo junto à caixa sobre o gira-discos; 2 – A cápsula da bala não poderia ter escorregado (rolando), dado que a carpete é espessa e faria a travagem necessária; 3 – E por fim, tal como no caso do Vaticano, um indivíduo em pé, ao dar um tiro na boca, cai para trás e não fica com a arma sob o corpo, a menos que alguém o agarre. O tiro foi dado com a vítima de pé, como o comprova a bala incrustada na parede a um metro e oitenta do chão. O normal seria, a haver suicídio, que o capitão disparasse sentado. Resumindo: neste caso conclui-se facilmente que o capitão foi morto e não se suicidou, e o assassino só poderia ser o seu sobrinho mais velho. Quanto à herança, sucede também um caso interessante. De acordo com o Código Civil (artigo 2166º), é possível deserdar um filho da parte “legítima” a que teria direito desde que se declare expressamente essa vontade e que se enquadre na especificidade da alínea a) daquele artigo do código. Foi o que fez o capitão. Porém, decidiu atribuir a totalidade da sua herança ao seu algoz. O mesmo código, no artigo 2034º, inibe aquele de ser herdeiro, provado o crime. Portanto, segue a herança, na totalidade – a casa –, para o sobrinho mais novo! O móbil do crime: o sobrinho mais velho quis abreviar o recebimento da herança, eliminando o tio. Sabia que tinha o testamento a seu favor. E, como bónus, a parte da “legítima” que não se pode deixar de dar a um filho, excepto naquele caso previsto no Código Civil. O capitão não perdoou ao filho e deserdou-o completamente. Como se teria passado o caso: o sobrinho mais velho apercebeu-se de que o tio iria ouvir música e aproveitou-se do facto. Esperou até a música subir de tom o suficiente e, de posse da pistola do tio, que ele saberia onde encontrar e que estaria operacional, entrou na sala. O tio levantou-se do sofá ao ver o sobrinho com a sua pistola. Este susteve-o com um braço e com o outro enfiou-lhe a pistola na boca, disparando. O corpo caiu assim de bruços. Entretanto deve ter dado sem querer um pontapé na cápsula, que a fez rolar para debaixo do sofá. A seguir fez uma burrice: foi tirar o disco do aparelho e colocá-lo junto à caixa vazia. Os assassinos fazem sempre uma asneira para facilitar aos investigadores… { publicado na secção “Policiário” do jornal “Público” de 15 de Fevereiro de 2004 } |
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© DANIEL FALCÃO, 2004 |
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