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(21.Abril.1925 – 30.Novembro.2019) |
CALEIDOSCÓPIO 89 EFEMÉRIDES – Dia 29 de Março Jo Nesbø (1960) – Nasce
em Oslo, Noruega. Futebolista, músico e vocalista de uma banda rock,
jornalista e economista inicia-se na carreira de escritor em 1997. Escreve
também livros infantis e tem publicados cerca de uma dúzia de romances
policiários. Cria o personagem Harry Hole um detective brilhante que recebeu treino do FBI e reside em
Oslo. Está traduzido em 40 línguas e na Noruega os seus livros vendem meio
milhão de cópias. O autor tem uma longa lista de prémios e nomeações; o
destaque vai para The Glass
Key Award 1998, prémio
sueco para o melhor romance nórdico de crime com e é nomeado em 2010 para o
Edgar Award para melhor romance com Nemesis. Em Portugal estão editados o 3º, 4º e 5º livros da série Harry Hole, o
1º e o 2º Flaggermusmannen/The Bat e Kakerlakkene/The Cockroaches ainda não
foram publicados. 1 – O Pássaro De Peito Vermelho (2009),
Editora Dom Quixote; Título Original: Rødstrupe (2000), Título da edição inglesa: The Redbreast
(2006) 2 – Vingança A Sangue-Frio (2010), Colecção Ficção Policial, Editora Livros d'Hoje; Título
Original: Sorgenfri
(2002), Título da edição inglesa: Nemesis (2008) 3 – A Estrela do Diabo (2011), Editora Dom
Quixote; Título Original: Marekors (2003), Título da edição inglesa: The Devil's Star
(2005) TEMA – RECORDAR O PASSADO NEM O DIABO RESISTE… No final dos
anos setenta do anterior século passado exercia funções de Agente do
Ministério Público nos Tribunais de 1ª Instância instalados na Rua Braamcamp
em Lisboa, no caminho do escritório de Amigo de longa data, Artur Varatojo em
Campo de Ourique. Telefonava-me, quase sempre a uma quarta-feira para
almoçarmos “Contas do Porto” porque o Varatojo – jeito que lhe ficou da
mocidade cheia de dificuldades, não largava moedas em vão. O “poiso” habitual
do repasto era um restaurante da Rua da Conceição*, pouco antes da Travessa
da Glória, a do elevador. Sentados,
consultada a lista e discutido o prato, entravamos na cavaqueira – interrompida
de quando em quando, por uma pergunta subtil, invariavelmente sobre imposto
sucessório, que ele considerava-me um “ás” ao lado de uma carta
branca; aliás tinha a gentileza de nunca abordar as minhas funções –
retomava com arte de mestre, que era, a conversa interrompida. Era um
“orador” admirável, um conversador de excepção,
entusiasta e encantador, acreditem. A propósito de
Alcobaça, melhor, dos pêssegos expostos na vitrina com a indicação da origem,
contou, com a graça que lhe era inerente, uma crónica que acabara de enviar
para a Capital que, de ordinário eu não lia, porquanto Victor Dimas,
jornalista do Expresso na rua adjacente ao tribunal, me enviava todos os dias
um Diário Popular. Tentarei reproduzir o caso, tal como me lembro trinta e
tal anos depois. Ali para
oeste, numa aldeola do concelho de Alcobaça, ia um rebuliço tremendo com um
menor de 13/14anos possuído pelo demónio há várias semanas. Dominado por uma
força incomum, ninguém o podia segurar. Batia, clamava, saltava, e, com
velocidade diabólica rolava pelo chão, rasgando as roupas sujas… pedras, de
origem desconhecida, caíam frequentemente no telhado e as janelas ostentavam
as marcas dessas armas voadoras. Os factos eram do domínio dos vizinhos que
suportavam receosos que o diabo lhes pedisse contas dos prejuízos nas casas e
quintais anexos, A intervenção do pároco, aparamentado, água benta e cruz,
pronto a exorcizar a “perversa criatura”, rendeu-se incapaz. Um certo
espírita de Lisboa fez uma peregrinação, mulheres de virtude, espíritas, nada
resultou. O rapaz, de olhos esbugalhados, assusta e a tudo resistiu. O pai,
internado no Hospital, não assistia ao domínio do “bode chifrudo” sobre o
filho, a avó materna, de avançada idade refugiava-se de rosário nas mãos
entre as paredes do quarto, morrendo um pouco todos os dias. A mãe, cansada,
consumida pelo mau rumo da vida, sentiu-se um dia eufórica de coragem. Mal o
rapaz começou a rasgar-se, saltou sobre ele com a força da determinação,
pegou-lhe pela orelha e não mais a largou. De nada valeram os berros e a
tentativa de se soltar. E assim se manteve qual lapa presa à rocha: Mãe,
filho e diabo seguros pelos dedos enérgicos da primeira. A noite
chegou, o rapaz adormeceu e o diabo não buliu… poços há que nã resistam a um bom puxão de orelhas: nem o diabo
resiste! M. Constantino * Rua
Conceição da Glória TEMA – FICÇÃO CIENTÍFICA O JOGO DO TEMPO E DO DESTINO – De Severina Fortes Quando os
Caminhos do Tempo ficaram abertos e se pode controlar as distâncias a
alcançar, permitindo o regresso, ninguém qualificado para essas viagens. Fora a época
romântica do Projecto, de muita abnegação e
pioneirismo, criando raízes a uma especialização necessária para melhor
cumprir no futuro. Por fim
gerou-se entre os viajantes uma espécie de cansaço, levando-os a não achar
assim tão importante a procura que por vezes os compelia a executar, com as
suas próprias mãos — no material certo, no local de origem – objectos vários que traziam, enriquecendo o Museu do
Homem, na ala dos remotos. Na verdade
tornara-se numa fase dura de labor intenso. Perante o desgaste físico de toda
equipa. Jorvas, responsável pelo Projecto, suspendeu as últimas viagens para merecido
repouso. Pessoalmente o
ócio cansava-o mais do que o trabalho normal. Sentia necessidade de qualquer
ocupação agradável para preencher o lazer. Lembrou-se
então da sua paixão pela História da velha Europa do século. XVIII,
especialmente durante a corte do Rei-Sol, passatempo que só verdadeiramente
deixara quando aceitara o Projecto dos Caminhos noTempo. Ainda guardava
essa secção da colectânea histórica e decidiu
revê-la. Colocou-a no
leitor especificando o tipo de leitura colhido; mas deu-se conta que não Ihe apetecia ler. Sem
contrariedade, deu preferência ao som, passando a escutar o que, afinal, já
conhecia tão bem. Contudo, não
estava com muita atenção naquele dia. O seu espírito libertou-se, seguindo
uma ideia insidiosa. A ideia bailou
feliz, afastou-se e voltou mais firme. Evitou pensar nela e tornou-se ideia
fixa. E porque
sentia particular fascinação por todo aquele fausto, sobrepondo-se a uma gama
extraordinária de sentimentos – dando lugar às mais nobres e também torpes
potencialidades humanas — aquela ideia tornou-se obcecante. Quantas vezes
já depois dos caminhantes do tempo serem uma realidade, sonhara ir, ele
próprio ao encontro de tais emoções. Arredava-se, porém esse sonho –
estava-lhe vedado viajar no Tempo. Mas, novamente
a tal ideia cativante surgiu mais audaciosa: enviar alguém competente, capaz
de trazer relatos verídicos, o dia a--dia desses tempos de aparato. Porque não? Geo foi o escolhido. Robusto, versátil, culto, frequentara Altas Ciências
e o seu entusiasmo pelas viagens fora factor de
escolha. No entanto, Jorvas, na sua euforia, conseguiu que Geo
compartilhasse do seu interesse, com igual intensidade, estudando ambos qual
o melhor momento a escolher. Tudo correu
bem à partida. As possíveis implicações só seriam avaliadas, não depois da
partida de Geo, mas quando este não respondeu ao
contacto e não voltou. Foram semanas
de tensão em que nada havia a fazer. Começaram
estudos para a nova fase de trabalhos, sem qualquer entusiasmo, até que Geo, já quase inesperadamente, foi recuperado. Havia uma
constante nos Caminhos do Tempo, conhecida e não explicada, em que o viajante
era recuperado quando em perigo de vida. Jorvas não estava presente aquando da sua chegada.
Embora alertado de imediato, só pode vê-lo, por instantes, no visor do seu
gabinete, antes de seguir para a Regeneração. Vinha doente;
o seu aspecto demonstrava-o bem. Todavia, voltara –
o alívio de Jorvas foi enorme. Agora ficaria
na Regeneração. Normalmente, precisaria de três dias para se restabelecer;
depois, falariam certamente, de tudo quanto haveria a saber. Mas Geo não pensava do mesmo modo! Na noite do
segundo dia, fugiu da Sala da Convalescença. Ainda fraco, conseguira chegar e abrir a porta da sala de comandos. Dominando-se,
tentando não perder o sangue-frio perante a agitação que o tomou, colocou-se
rapidamente no passadiço de acesso, mantendo o neutralizador de barreiras a
funcionar. Não queria
surpresas! Sabia que
passaria; mas a ânsia de não errar ordenava-lhe cuidado. Já dentro da
sala, junto ao painel do computador, não se deteve, agindo automaticamente,
mecanizando gestos com precisão sem deixar de se admirar com a facilidade
encontrada. Essa admiração alertava-o para a necessidade de urgência. Trazia já
programadas as coordenadas a introduzir na Alimentação de Programas, com
dados específicos, que não mostrara a ninguém. Queria voltar
ao passado! A experiência
feita durante os longos anos que, por uma curiosa distorção do Tempo, passara
noutra época – nas poucas semanas que mediaram entre a sua ida e a
recuperação temporal – causara-lhe inefável prazer. Estar à
frente, saber mais, atordoar pelo nunca visto, sentir a força da certeza
provada, enchera -o de felicidade. E o curioso
fora que nade fizera, na verdade, além de ocupar um lugar que, dir-se-ia
esperava por si. As circunstâncias existiam e eclodiram à sua chegada,
envolvendo-o como uma teia. E era isso que
não se atrevia a contar a Jorvas! Como lhe
poderia dizer que afinal aquele personagem de lenda, de que tanto tinham
falado – apontado por uns como um mistificador, e por outros como um homem de
poderes fantásticos era Geo? Qual a reacção de Jorvas quando
soubesse que, por o ter enviado para aquela época, fizera o jogo do Destino e
do Tempo, colocando-o no exacto momento e local
para a vivência histórica que, doutro modo, não existiria? O Tempo
recolhera-o no preciso instante da grave doença, em que a maioria das pessoas
o considerava morto. A volta deprimira-o… Em plena actividade, todo o complexo mecanismo vibrava suavemente.
Aqui e ali, pequenas luzes surgiam e desapareciam num ritmo alucinante, em
contraste com outras fixas, mais esparsas. O painel foi
perdendo luminosidade, sussurrando tenuemente, intensificando outros sinais
até aí parados. Subitamente,
tudo se mostrou como que suspenso, assustando-o, temendo não saber tanto como
julgara. Enganara-se.
Radiante viu surgir um vazio cinzento, semelhante a uma névoa, qual sugestão
de nada, que era o princípio do Caminho. Verificou se
as coordenadas aparecidas no visor maior do computador coincidiam com o
desejado. Assim era. Sem hesitar,
apagou os dados com as características pessoais, precaução tomada para o
retorno dos viajantes. Não queria voltar! Como mensagem
a Jorvas deixou em lugar bem visível uma delicada
miniatura sua Com o trajo da
corte, de cabeleira, em seu poder quando fora recuperado, para descobrisse a
verdade – se pudesse… E sem pena,
consciente de seguir a sua vontade e destino, penetrou na névoa cinzenta e
desapareceu. M.
Constantino In Policiário de
Bolso,
29 de Março de 2012
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© DANIEL FALCÃO |
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