Autor

Águia Branca

 

Data

13 de Janeiro de 2012

 

Secção

Correio Policial [15]

 

Publicação

Correio do Ribatejo

 

 

ACONTECEU A UMA SEXTA-FEIRA 13

Águia Branca

 

– Senhor inspector, como vê, isto não pode ficar sem solução. Tenho absoluta confiança na criada e, portanto, exijo que seja descoberto o assaltante, com a maior brevidade. Trata-se de uma questão de amor próprio que não quero deixar por resolver. Além do valor do furto, que não é insignificante, fortes razões de ordem emocional me obrigam a tentar descobrir o autor da façanha. Portanto exijo, repare bem, que como autoridade competente e autorizada, cumpra a sua obrigação. Descubra o criminoso, aplique-lhe o castigo que merece e devolva-me o que me foi tirado. É uma ob

– Calma! Por favor não se excite que eu tenho uma zanga serena contra as pessoas que se excitam, zanga que chega a transformar-se em raiva surda quando essas pessoas tentam apontar-me o meu dever. Eu, que como disse, sou a autoridade competente, sei bem o que tenho a fazer. Para já, não sou inspector

– Mas… deixemos isso de parte, e vamos ao que interessa.

1º) Ontem, dia 13, sexta-feira, às 22,30 horas, um visitante inesperado, segundo declarações da sua criada, introduziu-se aqui e, após tê-la cloroformizado, apoderou-se das peças de uma baixela de ouro de significativo valor, que se encontrava…

– Num aparador fechado à chave, na Sala Azul, ao fundo do corredor. Após isso…

– Alto. Vamos por partes.

2º) A sua criada afirma que momentos antes tinha faltado a luz, e que, portanto, tudo se perpetrou na mais densa escuridão. Claro que o quadro geral fica no cubículo da porteira, a qual, nessa noite, não trabalhou por indisposição. Como o senhor viu, pareceu ser a sua casa a única a sofrer a “avaria”, pois na vizinhança não houve falta de electricidade. Adiante.

3º) Além disso, ainda afirma ela que estava só em casa…

– Absolutamente certo.

– …e que, ao apagar-se a luz, ficou num estado de admiração, do qual só despertou ao ouvir o toque da campainha, três toques breves e um longo, o que portanto queria dizer…

– Que era quem tocava. Foi um “bluff” para a fazer abrir a porta. Claro que não pensa…

– Eu não penso, raciocino, que é um pouco diferente, embora este seja uma espécie de pensamento. Continuando, ela corre a abrir a porta… e então alguém lhe atira um pano com clorofórmio sobre o nariz, e depois fez o “arranjo”, do qual ela, como é óbvio, não teve consciência. Segundo as investigações efectuadas, na maçaneta da porta do aparador havia um misto de dedadas da criada, da sua esposa, mas mais nada analisável, pois o resto era uma amálgama indistinta de curvas digitais.

– Acho que são elementos bastantes para descobrir o ladrão. Basta apenas orientá-los e

– Você é desconcertante! Quer vir ajudar-me a fazê-lo? Com que então elementos bastantes?! Não seja brincalhão…

– O senhor toma umas liberdades que a minha personalidade me não permite aceitar. Portanto…

– …O senhor vai ouvi-las todas agora, e chamar-me todos os nomes bonitos da alta burocracia banqueira, depois. Sou o representante da companhia. Compete-me averiguar a verdade, mas apenas debaixo daquilo que eu achar que eu deva fazer.

Bem, bem!...

– Onde se encontrava o

– O produto do roubo, já lhe disse, estava no aparador…

– Não lhe perguntava pelo produto do roubo. Queria saber onde estava o senhor!

– Eu… eu estive talvez até às 9 horas no Clube. Em seguida dei uma volta pelo Banco para pôr uns assuntos em dia, e depois… depois vim para casa…

– A que horas?

– Perto da meia-noite.

– Não me disse que já estava em casa a essa hora?

– Ah! Sim, realmente passei primeiro pelo Café. Já me esquecia disso. Então talvez fosse meia-noite e meia.

– Sua esposa…?

– Foi para uma reunião de caridade e voltou no mesmo instante que eu. Veio no carro dos Andrades.

– Tiveram logo conhecimento do facto?

– Claro. Com um polícia à porta. Só quem fosse cego.

– Bem já chega. Tentarei solucionar o caso o mais rapidamente possível. Claro que há “chuis” metidos no caso…

– Sim. A polícia encarregou-me do assunto, e parece-me estar a tomá-lo muito a sério. Quer um charuto?

– Obrigado. Não fumo nas horas de serviço. Tenho que manter alerta todas as minhas faculdades para cumprir o meu dever.

– Bem, bem…

– Até à próxima. Boa tarde.

E Amélio Sarafano, agente da “Providencial”, deixou a casa de Amaral da Luz, o banqueiro que alguns consideravam já falido, com um sorriso nos lábios.

Quando chegou a casa, foi dormir. Já tinha terminado a hora de serviço, e o caso estava solucionado. Com mais uns interrogatórios e acareações, o assunto arrumava-se e ele podia redigir o relatório.

 

Amigos leitores, sois capazes de fazer o mesmo? Tentem. Comparem, raciocinem, desenvolvam a vossa tese e digam-nos como chegaram a ela.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO