Autor Data 5 de Dezembro de 1986 Secção O Detective [13] Competição 1ª Supertaça Policiária -
Cidade de Almada Problema nº 6 Publicação Jornal de Almada |
CRIME NO MUSEU A Lampadinha 8.45h.
A manhã estava húmida e os telhados ainda gotejavam da chuva que havia caído
durante a noite, quando o Inspector Pardal foi
chamado ao Museu da cidade, a fim de resolver um intrincado caso. 8.55h.
Após ter subido as escadas do dito museu e ter ouvido o chilrear de um
pássaro pousado no telhado sob a sua cabeça, não passou sem mirar a alvura do
mármore a seus pés que brilhava aos primeiros raios de sol e que lhe batiam
obliquamente, deixando entrara, através da larga porta de vidro, uma
atmosfera morna, própria de um dia de Primavera que se avizinhava. Entrou,
seguido pelo tenente Pascoal, quando o director do
museu se lhes dirigiu apressadamente, vindo do escritório que se situava no
primeiro andar do edifício assim como o telefone. Mesmo ao lado, ficava o
vestiário dos empregados. Posto
ao corrente do que se havia passado, começou por averiguar o local do crime:
um dos guardas, jazia estendido junto a um pedestal,
cujo busto desaparecera como que misteriosamente, pois nada se encontrava
fora do lugar, a não ser uma pesada estatueta, caída junto do morto, intacta
e limpa, assim como o lajedo da superfície do solo que pisavam. O
corpo franzino, de bruços, apresentava uma brecha bem funda e enviesada, no
ombro esquerdo, em direcção ao pescoço, cujo osso
se encontrava quebrado e onde alguns jorros de sangue haviam ensopado a farda
do morto, com algum já seco, outrora arroxeado, como as manchas que Simões
tinha nas suas partes baixas. Passaram
à sala contígua e notaram o ténue pó que rodeava o lugar vazio da estatueta
caída perto do cadáver, assim como o das maravilhas antigas que estavam
expostas. Seguiram em frente e entraram na terceira sala do rés-do-chão,
dedicada à pintura. Como estava em serviço, o Inspector
Pardal deixou que a sua admiração pela arte ficasse para outro dia e assim,
subiram até ao 1º andar. Penetraram na sala das armas. Todas as espécies
estavam expostas: mosquetes, espingardas, pistolas, facas primitivas,
machados, lanças… que os transportavam aos tempos mais remotos. O
tenente Pascoal abeirou-se duma janela aberta que deixava entrar o aroma das
flores, vindo do jardim, situado nas traseiras do museu e, enquanto o Inspector Pardal averiguava o escritório do director, Pascoal desceu até ao andar de baixo. Abrindo a
porta do jardim, deu de caras com outro guarda, homem alto e bem constituído,
que chegava para fazer o turno de dia. Quando soube da morte do colega ficou
algo surpreendido e pesaroso, correndo para dentro e deixando atrás de si
marcas de lama que se juntaram a outras que já se encontravam no pátio do
jardim. Entretanto,
o Inspector descia os degraus quando o tenente
Pascoal se lhe foi juntar, para então começarem o interrogatório, já na
esquadra da polícia. O
primeiro interrogado foi a mulher da limpeza que dera o alarme. Mulher forte
e desinibida, teve um certo à vontade com o inspector
que pensou para si que, se aquela mulheraça lhe desse um abraço, lhe havia de
quebrar todas as costelas. –
Apesar do homem ser um tanto gabarola e mulherengo, Deus me livre que o
matasse!... – comentou rapidamente sem que Pardal
pudesse articular palavra – …Assim que o vi, ali mais tesinho
que nem um carapau, não toquei em nada e fui logo chamar o Sr. Director que ainda estava em casa… –
Está certo, sim, senhora. Mas se não se importa, preferia que começasse a
contar tudo desde que entrou esta manhã no museu e a que horas o fez – disse
o inspector, pondo ordem. –
Pois bem, Sr. polícia inspector,
entrei pelas traseiras, como faz todo o pessoal. Até o Sr. Director entra pelo jardim!... – olhou
para o policial que a fitava já impaciente. –
Bem, continuando: – entrei pelo jardim, desliguei o alarme para poder entrar,
todos temos a chave do alarme, eram umas 6.30h, como venho sempre. Desejei os
bons-dias ao Simões que estava no cimo das escadas, no 1º andar, e comecei
nas minhas limpezas. Limpei tudo muito bem limpinho e fui arrumar o andar de
cima, enquanto o Simões me observava. Confesso que me irritou porque começou
a atirar-me uns piropos, como fazia quando andava com a minha irmã.
Coitadinha dela, sofreu tanto por ele… Mas
não pense o Sr. polícia que foi por isso que o
matei, até porque não fui eu que o matei! Depois, despachei-me o mais
depressa que pude e fui ao vestiário trocar de roupa, eram cerca das 8.30h,
enquanto ouvia «La Traviatta» de Puccini no pequeno
transistor que trago sempre comigo. Sabe… é que eu
gosto muito deste tipo de música e até percebo alguma coisinha!... Bom,
quando desci as escadas vi um vulto fugir pela porta da frente, deixando o
pobre do Simões ali morto no chão – choramingou. –
Muito bem, Sra. Eufrasina pode retirar-se e muito
obrigado. Faça o favor de fazer entrar o outro guarda, Pascoal!... Mais
um depoimento começou: –
Eu não sei de nada!! Quando vi o meu amigo Simões
vivo, pela última vez, foi ontem às 21 horas; horas a que ele «pega» – isto
é, «pegava» – ao serviço… E é quando eu acabo o meu. Ainda estivemos a falar
sobre a vida que levamos. Até discordámos nalgumas coisas, mas longe de mim
matar o meu amigo!... Quando soube da notícia foi esta manhã ao entrar no
museu! Disse-me o seu tenente – falou cabisbaixo, fugando em seguida. Por
último, entrou o Director que, apesar de já ter
conversado com o Inspector Pardal, no local do
crime, não deixou de se dirigir à delegacia para prestar declarações. Um
homem baixo e balofo entrou limpando a testa das peque-mas gotas de suor que
lhe escorriam, pelo mínimo esforço que fizera ao subir os degraus do 1º andar
onde se situava a esquadra. Arquejando,
começou: –
Vi o Simões ainda cheio de vida, – fez uma pausa, para novamente prosseguir –
empregado exemplar e trabalhador, ontem à noite cerca das 22 horas, quando
fui ao museu para acabar de catalogar umas pequenas peças de arte que estão
no meu escritório, para as poder mostrar ao público na semana que vem. Quando
saí eram mais ou menos 00.30h; despedi-me dele que, como sempre, estava
alerta no seu posto. Esta manhã, recebo um telefonema da mulher da limpeza a
dizer que ele estava morto. Eram umas 8.35h. Pedi â senhora que telefonasse
para a polícia. Vesti-me e dirigi-me imediatamente para o museu. Moro no
outro lado da cidade mas como havia pouco trânsito, meti o acelerador a fundo
– os senhores queiram desculpar, mas uma eventualidade destas… – e cheguei
enfim ao local, depois de algumas derrapagens por causa do piso. Quando
entrei, vi o Simões estendido no chão e o valioso busto de Beethoven
desaparecido. –
Muito bem, pode retirar-se para a sala do lado, que eu já sei quem cometeu
tais crimes!... – pronunciou o inspector. Pois
bem, pergunta-se: 1)
– Quem foi o Inspector Pardal acusar? Porquê 2)
– Justifique pormenorizadamente como tudo se passou. |
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© DANIEL FALCÃO |
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