Autor Data 1 de Dezembro de 2021 Secção O Desafio dos Enigmas
[131] Competição Torneio
de Iniciação A. Raposo Prova nº 8 Publicação Audiência GP Grande Porto |
TEMPICOS DE RASTOS… A. Raposo Na
sua longa atuação na “Judite”, Tempicos prendeu
muita gente. Muito mariola. Alguns por longos e penosos períodos. Prisão que não
redimiu os meliantes. Que não lhes deu horizontes nem futuro. Essa prisão não
ajudou ninguém. Somente tornou os meliantes mais meliantes e rancorosos. Tempicos sabia isso, mas não gostava de pensar que era
ele que iria mudar o mundo. Chegara
o momento em que o mundo do crime desejava ajustar contas com Tempicos. O Sindicato do crime reuniu-se e os sete
magníficos decidiram. Os longos anos de prisão sofridos por muita gente iriam
ser, agora, vingados. Foi
decidido o castigo. Tinha que ser o mais doloroso possível. No
mundo do crime, a globalização também já chegara. O
Brasil dera a sua contribuição, tendo no topo da hierarquia dois dos seus
mais destacados elementos, conhecedores das prisões portuguesas; eram o Xico
Surucucu e o Toto Tijuca. A
eles juntaram-se mais cinco portugueses de gema: João Falcão, Zé Camaleão,
Quim Mula, Manuel Lagarto de Alvalade, Toino Maçacoto. Um
deles – não se sabia quem – fora encarregado de executar o trabalho. Teria
que deixar Tempicos em sofrimento por longo tempo.
O mais longo e doloroso possível. Tão longo como os anos de prisão que
suscitou. O
processo era simples. Um tiro em cada joelho de forma a não dar qualquer
hipótese de fuga. Aproveitaram
o dia de folga da empregada de Tempicos, um dia por
semana, sempre à quinta-feira. Tempicos tivera a
companhia de Kátia Vanessa, a filha da falecida
Nelinha, que se finara no Museu do Teatro em Maio passado, acontecimento que
veio publicado na imprensa cor-de-rosa e noticiado por essa Europa fora.
Porém, a maldosa influência dos outros padrinhos da menina (Onaírda, Nove e Zé-Viseu) levou a que ela fugisse de casa
para lugar incerto, mas provável, que se calcula seja a adega de um dos
padrinhos. Agora Tempicos estava sozinho e muito
mais vulnerável. Apanharam-no
à secretária, onde gastava longos períodos a escrever histórias policiais que
nunca editara. O executor só teve que acertar com toda a precisão um tiro em
cada joelho. Era a dose recomendada. Sentado
estava e sentado ficou, a sangrar. O telefone foi-lhe retirado. A vivenda,
onde habitava sozinho, ficava num bairro seleto, no Restelo, em Lisboa, onde
raros vizinhos passavam a pé. Tempicos ficara com os
joelhos em mau estado, com um tiro em cada um. Foi como se lhe cortassem as
pernas. Pedir ajuda não seria fácil. Deslocação, só rastejando – pensou – e
usando os braços como força motriz. As dores não seriam pera doce! As
balas foram certeiras e as pernas ficaram pendentes sem forças e a sangrar. O
meliante não demorou dois minutos a terminar o trabalho. Era um especialista
competente na sua área. Como entrara saíra fechando a porta no trinco e
levando o telefone móvel. O único existente na casa. Tempicos sabia que podia
morrer; essa seria a hipótese mais provável. Rapidamente resolveu reagir.
Conseguiu rasgar uma parte da camisa e adaptar um garrote a cada joelho.
Assim a perda de sangue minimizava-se e poderia pensar o que fazer a seguir. Pensou
nos seus antigos camaradas da Judite, ainda no activo.
Pensou que – na brincadeira – enviava regularmente aos seus colegas enigmas para
solucionarem. Que eles aceitavam e resolviam em conjunto. Queria
deixar para os seus colegas da Judite o nome do seu algoz, dissimulando a
informação no texto, aparentemente inócuo, para quem o lesse – incluindo o
meliante! Quem
sabe se ele voltaria para acabar o trabalho? Foi
isso que Tempicos resolveu fazer. O bloco que tinha
sempre na secretária serviu perfeitamente. Pegou na caneta e escreveu: MINHA POESIA NÃO É PROVÁVEL SOBREVIVA Á MINHA MORTE! PORÉM, MINHA FAMA SERÁ! A MINHA GRANDE OBRA POLICIARIA DEIXOU-ME AGORA DUM JEITO ASSIM MORIBUNDO RASTEJANTE! Depois,
atirou-se assim a trouxe-mouxe para o chão onde ficou com dores redobradas
mas arrastou-se imediatamente para junto à sua mesa baixa, no meio da sala,
decorada com várias estatuetas tipo “arte nova”, de bronze. Usou-as
para, regularmente, ir atirando às vidraças das janelas da sala. A esperança
estava em que alguém que passasse na rua pudesse ouvir. As
estatuetas foram partindo – regularmente – as vidraças todas, uma a uma. Mas
as forças iam faltando e a ajuda não surgia. A perda de sangue aumentava com
o esforço. Será
que Tempicos se salvaria ou será desta que iria de
vez para os anjinhos? Isso nós, agora, não
poderemos saber, nem é esse o enigma que será necessário descobrir e
resolver. O nome do meliante esse é que será o objetivo da investigação. Esse
é que é preciso que seja acusado, pois não se faz uma maldade destas ao nosso
amigo Tempicos. Seria imperdoável! Podemos fazer a pergunta: quem disparou
nos joelhos de Tempicos? |
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© DANIEL FALCÃO |
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