Autor Data 9 de Fevereiro de 2019 Secção Competição Prova nº 7 Publicação Audiência GP Grande Porto |
IDA AO TEATRO Bigode Beltrão apanhara o comboio
precisamente à tabela. Sentado na carruagem, rumo
a Lisboa – para ver a revista “Passa por mim no Rossio” – lia avidamente, um
livro policial, no frenesi de descobrir o criminoso. Trazia debaixo de olho
uma bonita e distinta senhora, e não sabia agora onde estaria sentada. Fez
uma pausa na leitura e mirou discretamente em volta à sua procura. – Ah! Ei-la ali, de perna
traçada – pensou para si próprio. Encontrava-se outra vez
embrenhado no enredo do livro, quando anunciaram a chegada à estação de Santa
Apolónia. Desceu da carruagem e foi
até ao bar, tomar um café retemperador. Saiu, e porque se estava a
aproximar a hora, chamou um táxi que o levou até ao Politeama. No fim do
espetáculo encontrou à saída a dama – esteticista – que tinha visto no
comboio. Companheiros de viagem, trocaram impressões sobre a revista. – Foi esplêndido – disse
Beltrão. – Sim – concordou a
senhora. E cantarolou, com voz melódica: – Quando o pano sobe… Respondeu Beltrão num tom
desafinado: – …e
o espetáculo começa… Cada um se fazendo de
“surdo” à sua maneira prosseguiram. O cavalheiro achou conveniente mudar de
assunto, e perguntou se a senhora gostava de futebol. – Detestava futebol senhor…
– como é o seu nome? – Beltrão. – Respondeu. – Maria – retorquiu a
senhora. E continuou: – Mas desde que este ano
assisti à final do Mundial de Futebol de Juniores, entre os rapazes de
Portugal e os do Brasil, em que fomos campeões pela segunda vez, que me rendi
à magia desse desporto. – Que alegria os putos nos
deram – retorquiu Beltrão. Neste momento dobravam uma
esquina, quando, saídos de um vão de escada, dois delinquentes aparecem a
barrarem-lhes o caminho, e a ameaçarem-nos. Maria assustada deu um
berro estridente, e Beltrão aproveitou o momento para aplicar uns golpes de
karatê e neutralizar os assaltantes. Uma patrulha da polícia estava perto, ao
ouvir o grito da senhora e o barulho da escaramuça, acudiu também. Foram todos para a
esquadra. Apresentada a queixa, Beltrão e Maria seguiram em paz. Novamente de Táxi viajaram
até ao hotel. Fora de horas para jantar, mas com apetite para a ceia. Degustando um
portuguesíssimo bacalhau à Zé do Pipo, acompanhado com um não menos português
tinto do Cartaxo, chegou-lhes ao ouvido uma conversa na mesa ao lado. – Amigo, lhe estou dizendo,
seu Ayrton, dobrou, bicampeão de Fórmula 1. – É isso aí, cara, no
sábado. Acabada a refeição, chegou
a hora de Beltrão acender o seu charuto e saboreá-lo, beberricando o whisky
enquanto Maria bebia também o seu. Disfarçava a perturbação
que a mulher loira lhe causava, e que Maria intuiu naturalmente. Sem assunto
uma vez mais, Beltrão indagou à colega sobre literatura. – Gosta de ler? Quais os
autores preferidos? – Sou fã como você, de
literatura policial, Agatha Christie. Gosto também
de Eça, Tolstoi, Saramago, Érico Veríssimo, John Dos
Passos…. “As Palavras” é agora o meu livro de cabeceira. – Ainda não ouvi falar –
confessou Beltrão. – É do Nobel deste ano. Perceberam
ao mesmo tempo que bocejavam. Foram-se deitar. O vale dos lençóis recebeu-os
para o merecido descanso. O enigma proposto contém
quatro erros de palmatória, que importa descortinar. |
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© DANIEL FALCÃO |
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