Autor Data 21 de Fevereiro de 1986 Secção Detective [2] Publicação Jornal de Almada |
DOSSIER 10: O TELEFONEMA Carlos Estegano Porque
ultimamente a Agência tem tido pouco serviço, fazia eu contas à vida quando o
telefone tocou. Atendi e, para surpresa minha, era
um velho camarada dos tempos da guerra, o Teixeira, há já alguns anos
proprietário de uma fábrica, ali para os lados de Massamá. Depois da natural
troca de saudações, ele perguntou se estaria disponível para investigar um
caso. Foi por isso que, naquela tarde de Outubro, e no meu Bóguinhas, me dirigi para a Teitêxteis.
O caso conta-se em poucas linhas. Naquela
manhã, o Teixeira recebera no seu gabinete um telefonema anónimo, em que o
seu autor – um homem – o informou que uma das empregadas, Fátima, além de
chegar sempre tarde ao serviço, viciava o cartão de ponto e não mostrava
interesse pelo serviço à sua responsabilidade, o que provocava atrasos nos
trabalhos administrativos e causava mal estar entre
os colegas. –
Em suma – disse ele – não era nada que eu já não soubesse. Aliás, já
resolvera não renovar o contrato dessa senhora. –
Então porque é que me chamaste? –
Porque quero saber quem foi o autor do telefonema! –
Se foi interurbano – retorqui – vai ser impossível… –
Não – interrompeu o Teixeira – o telefonema foi interno, pois perguntei à
telefonista e ela não tinha passado qualquer chamada para mim. Estive
pensando e a chamada só pode ter sido feita aqui, no edifício da
administração. –
Porque dizes isso? –
Digamos que – respondeu ele – não vejo outra possibilidade. Temos dois
edifícios, este e o da fábrica; os operários têm horário diferente do pessoal
administrativo, logo não vejo qualquer deles a controlar as entradas da
Fátima, sem falar já no serviço dela. –
Na fábrica existe rede interna? – perguntei. –
Existe, mas os telefones estão colocados em locais de grande movimento.
Ninguém estaria à vontade para uma chamada destas. Esta é uma das razões que
me leva a afirmar que a chamada foi feita aqui. Para
resumir, digo-vos que o edifício da administração tem dois andares; no
rés-do-chão fica o salão de exposições, o stand de
vendas e o cubículo da telefonista, enquanto no 1º andar existe o gabinete do
Teixeira, o escritório e a sala de «design». Todas as salas estão equipadas
com telefone interno. Por
exclusão de partes, eliminei da lista de suspeitos o Teixeira e ainda o Joel,
o Miguel e o Jorge, que trabalhavam juntos no escritório. Eliminei também a
telefonista e a Fátima por motivo óbvio. Mesmo assim fiquei ainda com três
suspeitos: o desenhador, o vendedor e o decorador, ou seja o Ricardo, o
Manuel e o Pedro. Pedi ao Teixeira que me enviasse os três ao gabinete, sem
nada lhes dizer. Quando todos eles estavam já presentes, perguntei-lhes de chofre:
– Qual dos senhores fez esta manhã uma chamada telefónica para o senhor
Teixeira? –
Chamada? Eu!? Que história é esta? – exclamaram
quase em uníssono, olhando uns para os outros. –
Calma, meus senhores – disse-lhes – um de vós telefonou e é grave. –
Eu, quando preciso de alguma coisa – disse o Ricardo – trato directamente o assunto com o senhor Teixeira. Que
gravidade é essa que o senhor fala? –
Só telefono ao senhor Teixeira quando temos alguém interessado na exposição –
exclamou o Pedro – além de que não costumo apunhalar quem quer que seja,
pelas costas. O que é que se passou de grave? –
Eu não fiz hoje qualquer telefonema – disse por sua vez o Manuel – só uso o
telefone interno para transmitir directivas à
fábrica. Que gravidade pode ter um telefonema? –
Bem, os senhores podem retirar-se – exclamei pondo fim à conversa. Depois,
desci ao andar inferior, passei pelo relógio de ponto e entrei no stand onde se encontrava o Teixeira. –
Então, descobriste alguma coisa? –
Sim – disse-lhe – o autor do telefonema foi… Pois
é, quem foi o autor do telefonema é a pergunta que fazemos aos leitores… e já
agora digam-nos como chegaram a essa conclusão. |
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© DANIEL FALCÃO |
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