Autor Data 2 de Janeiro de 2008 Secção Competição Problema nº 5 Publicação O Almeirinense |
SONHO OU PESADELO? Daniel Falcão Pouco
passava da meia-noite. Não havia forma de a insónia que se estava a
manifestar naquela noite se retirar para bem longe. Foi nessa altura que me
apercebi que alguém tinha colocado sobre a mesa, situada ao lado do sofá em
que estava refastelado, um dos romances da rainha do crime: “O Crime do
Expresso do Oriente”. É claro que já o tinha lido demasiadas vezes, mas foi
exactamente por essa razão que recomecei a minha enésima leitura. A minha
esperança era que, sendo conhecedor da trama, o sono chegasse rapidamente e
pudesse finalmente descansar. Infelizmente,
nada do que previra acontecera. A minha leitura já se prolongava há quase
três horas e a insónia permanecia bem presente. O que fazer? Bom, se o sono
não aparecia, iria passear um pouco, pois podia ser que encontrasse alguém
que estivesse a padecer o mesmo sofrimento. A
praia ficava muito próxima da casa de férias que alugara e foi por isso mesmo
que decidi passear no areal. O areal àquela hora era imenso, visto que a maré
tinha vazado completamente. O que tinha uma vantagem: a probabilidade de
tropeçar em alguém era substancialmente reduzida. Enquanto
caminhava pelo areal, comecei a escutar sons de música provenientes de uma
vivenda muito perto da praia. A música ia-se escutando cada vez com maior
nitidez, conforme me ia aproximando. Já estava a trautear a melodia que
escutava, quando me apercebi que se tratava de uma canção original de Michael
Bublé intitulada “Save the Last Dance for Me”. Ao passar pela vivenda,
reparei que muitas das jovens que dançavam no jardim exterior envolviam o seu
corpo com páreos e, além de grinaldas na cabeça, traziam colares de conchas e
de flores de tiaré. “Uma festa taitiana!” – foi o que pensei. A
minha caminhada continuou, até que voltei a ter na minha companhia apenas os
muito leves ruídos nocturnos. Inesperadamente, escutei o som de um disparo. O
som que escutara proviera algures da vivenda ao lado da qual passava naquele
preciso momento. Corri imediatamente nessa direcção na expectativa de
surpreender quem disparara. Demorei apenas um par de minutos a encontrar o
local onde estava a pessoa que fora vitimada pelo disparo. Boiando
na piscina da vivenda, mas muito próximo da borda, lá estava um corpo no qual
pude observar, graças à luminosidade lunar proveniente da Lua Cheia, o local
bem no meio da testa por onde entrara a bala fatídica. Não pude deixar de
reparar na água límpida da piscina, convidativa para um mergulho. Preparava-me
para telefonar às entidades competentes, dando conhecimento da ocorrência,
quando apareceu um indivíduo com um aspecto muito estranho. Este, sem que eu
lhe tivesse dirigido a palavra, disse-me que escutara um tiro e perguntou o
que havia acontecido. Antes de lhe responder, prossegui o meu telefonema. Só
depois de executar os procedimentos habituais, naquele género de situação, é
que me dirigi ao sujeito. Depois
de me identificar, coloquei-lhe uma série de questões. Pelas suas respostas,
fiquei a saber que aquele homem que usava óculos fumados e um laço ao
pescoço, era de nacionalidade brasileira, chamava-se Xico Surucucu e vivia há
já cinquenta anos na cidade de Tavira. Naquela noite estivera num casino, na
companhia de mais alguns amigos, onde as coisas não lhe tinham corrido muito
bem. Acrescentou que apanhou um grande susto, o que era especialmente
complicado no seu caso particular, visto que sofria de insuficiência cardíaca
e tinha uma arritmia diagnosticada como supraventricular. Foi
precisamente depois destas declarações que escutei, primeiro de uma forma
muito ténue, mas depois de uma forma mais vigorosa alguém a chamar-me pelo
nome… –
… Aranha… Aranha… Aranha…. –
Sim? O que se passa?... –
Acorda, pá! O que te deu para adormeceres?... Só
então verifiquei que estava sentado num sofá, no renovado Clube do Aranhiço,
rodeado por vários amigos. Entre as mãos, tinha o resultado de um trabalho
elaborado pelo Daniel e dedicado aos concorrentes da secção
PÚBLICO-Policiário. Afinal, tudo não passou de um sonho (ou seria antes um
pesadelo?). Já
completamente acordado, resolvi partilhar o sonho com os meus amigos. –
Eh, pá! Mas que interessante. Com certeza, apercebeste-te facilmente das
inconsistências presentes no teu sonho… –
Claro que sim! Por isso mesmo, espero que ponham os vossos dotes de
detectives amadores em acção e que me indiquem quais são, na vossa opinião,
essas inconsistências. |
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© DANIEL FALCÃO |
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