Autor

Daniel Falcão

 

Data

10 de Julho de 2023

 

Secção

O Desafio dos Enigmas [166]

 

Competição

Torneio "Solução à Vista!" – 2022

Prova nº 10

 

Publicação

Audiência GP Grande Porto

 

 

Solução de:

UM DIA EXTRAORDINÁRIO!

Daniel Falcão

 

Gustavo Santos começou por organizar os factos disponibilizados. Em primeiro lugar, conhecia o período em que teria ocorrido o homicídio, nos 90 minutos anteriores às 2h45, de acordo com a médica-legista, ou seja, depois da 1h15 da madrugada. Em segundo lugar, conhecia os períodos em que os suspeitos estiveram junto da vítima, confirmados pelas imagens da gravação encontrada: Luís Vilaça, entre a 1h30 e a 1h40; Francisco Sousa, entre a 1h50 e as duas horas; e Artur Pires, após as 2h10. Queria isto dizer que, em princípio, todos se enquadravam no período horário do crime.

Como Artur Pires telefonou à polícia imediatamente após ter entrado no escritório e de lá não saiu (confirmado na gravação) e como não foi encontrada a arma do crime, nem na habitação nem nas suas imediações, tal significa que ele não pode ser o homicida. Entre os outros dois suspeitos, como Francisco Sousa referiu ter conversado com a vítima num horário posterior ao da visita de Luís Vilaça, este último ficaria ilibado, pelo que as suspeitas recairiam apenas sobre o Francisco Sousa.

Mas Gustavo Santos pensava na interrogação colocada pelo amigo: será que, prevendo que algo de muito grave poderia acontecer, a vítima deixara uma pista que poderia conduzir à identidade do seu algoz? Em caso de resposta afirmativa, o que significaria o algarismo cinco, repetido duas vezes, ou seja, o número 55, dentro de um círculo?

Após refletir sobre o nome dos três suspeitos, surgiu-lhe uma resposta possível. Resposta esta que, associada ao facto de existir uma gravação com a fita dos acontecimentos (lembrava-se do “mas não só…” com que o amigo terminara a sua descrição do caso), lhe indicava quem tinha sido o criminoso: fora o Luís Vilaça! O número 55 identificava-o, quando escrito em numeração romana, LV, ou seja, correspondia às letras iniciais de Luís Vilaça.

O crime fora cometido na madrugada de “um dia extraordinário” (um domingo) por um “par” de razões: uma delas era a reunião daquele grupo de amigos; a outra era o facto de se tratar do único dia do ano que durava vinte e cinco horas. Estava-se no último domingo de outubro (nos anos mais recentes), dia de mudança de hora, em que os relógios às duas horas da madrugada regressavam à uma hora da madrugada.

Por isso, sabia agora Gustavo Santos, a gravação era tão importante, pois embora confirmasse as horas de entrada indicadas pelos suspeitos, a ordem de entrada não fora a inicialmente considerada. De facto, naquela madrugada, o agiota reunira primeiro com o Francisco Sousa que chegara à 1h50 (já fora do período de 90 minutos), antes da mudança da hora. A seguir, o agiota reunira-se com o Luís Vilaça (que assim ilibava o primeiro suspeito) e ao aperceber-se que a conversa estava demasiado tensa, rabiscou o 55 na folha de papel, salientando o número ao riscar um círculo à sua volta. E confirmou que tinha razão quando se apercebeu da arma na mão do seu cliente. Mais tarde, Luís Vilaça afirmaria que chegou à 1h30, o que era verdade, mas já depois da mudança da hora.

Gustavo Santos considerava existir uma forte possibilidade de o homicídio ter sido mesmo intencional não apenas porque Luís Vilaça levara com ele a arma (quem sabe, munida de silenciador para não se ouvir o disparo), como também escolhera aquela noite com a esperança de aparecer algum cliente antes da mudança de hora que lhe pudesse servir de alibi. E, se não fosse a gravação (e também o sangue-frio do agiota), até se poderia ter safado!

© DANIEL FALCÃO