Autor Data 8 de Agosto de 1992 Secção Policiário [39] Publicação Público |
O CRIME DA JANELA ENVENENADA De La Tierra Ferreira Dos Santos era um
homem do mundo. Empresário de sucesso, muito viajado pelos quatro cantos do
planeta, individualidade de hábitos religiosamente ingleses, deixara atrás de
si um rasto de ressentimento e ódio. Vivia actualmente
num grande casarão soturno, com a única companhia de um mordomo, rodeado por
um belo jardim onde Dos Santos se dedicava à sua muito conhecida paixão: a
criação e estudo de aves originais. O seu escritório, no 1.o
andar do casarão, era também muito conhecido do público através de
fotografias em revistas especializadas, revelando a peculiaridade da
decoração, de ter a única janela sempre fechada, e de um enorme quadro atrás
da sua cadeira representando o seu orgulho ornitológico, um pássaro chamado “aratinga-da-Patagónia”, embora nunca tenha conseguido
mantê-lo em cativeiro. E a vida corria-lhe
tranquilamente, até que um dia apareceu morto sobre a sua mesa de trabalho. O detective
Cecílio é um daqueles profissionais do crime com tantos casos experimentados
e resolvidos que até já possuía calos nas suas células cinzentas. Mas este
crime surpreendeu-o. Após uma breve inspecção, o detective
descobriu algo espantoso: pelos traços de pó verificou que a janela tinha
sido aberta e fechada de seguida, sem sinais de arrombamento. Mas, mais
incrível, achou uma lâmina dissimulada no bordo
inferior da pega da janela, logo, impossível de ser detectada
por quem distraidamente procurasse abrir essa janela. Exames posteriores
mostraram um pequeno golpe num dedo da mão direita de Dos Santos e a presença
de resíduos de um veneno letal, de acção retardada,
no fio da lâmina. O empresário terá morrido entre as 18h e as 18h30. Soube-se mais tarde que,
durante esse malfadado dia, Ferreira Dos Santos recebera apenas a visita de
três homens. Ouçamo-los. Sr. Marquez
(com forte sotaque): “Estive cá de tarde, à hora a que o Ferreira lanchava.
De facto, sou filho ilegítimo desse homem, resultado de um caso amoroso com
uma senhora portuguesa, na altura casada com um indivíduo bastante austero.
Resolvi, agora, tentar obter junto do pai biológico algumas compensações por
aquilo que sofri. O que faço? Estou neste país pela primeira vez, sou adido
militar da embaixada da Argentina. Sim, estive junto da janela…” Sr. Pereira. “Nesse dia fui
visitá-lo, por volta das 16h25. Sou engenheiro químico e odiava esse homem.
Porquê? Tentei nestes últimos anos, sempre em vão, que remediasse a morte de
meu pai, quando este não aguentou a perda da farmácia da família às mãos
pouco escrupulosas de uma empresa do Ferreira. O meu pai suicidou-se.
Realmente, aproximei-me da janela…” Sr. Nunes: “Sou biólogo,
recém-formado em Lisboa. Sabem, tenho um vício péssimo… Sou um jogador
compulsivo. De tal forma que num dos casinos do Ferreira acumulei uma dívida
enorme. Estava desesperado, percebem? Visitei o homem pela hora do almoço, a
ver se conseguia um prazo maior para o pagamento, e a conversa não correu
bem. Não me digam que é crime espreitar à janela?...” O detective
Cecílio apurou ainda que tinham sido descobertas algumas pegadas que
terminavam numa das esquinas da parede onde se situa a janela do escritório.
O detective já tem uma ideia concreta sobre quem é
o assassino, mas ainda é cedo para desvendar… Quanto a você, caro leitor,
que motivo esteve por trás da abertura da janela? Assim sendo, quem, dos três
homens, matou Ferreira dos Santos, e como se explica isso? |
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© DANIEL FALCÃO |
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