Autor

Detective Alcopas & O Quintinhas

 

Data

21 de Fevereiro de 1992

 

Secção

O Detective - Zona A-Team [147]

 

Competição

Torneio dos Mestres

Problema nº 4

 

Publicação

Jornal de Almada

 

 

AVE DE MAU AGOURO

Detective Alcopas & O Quintinhas

 

Apesar de ter sido eu quem descobriu este caso, não posso deixar de referir que os Inspectores Tutti e Frutti tiveram uma acção mais preponderante que a minha. Os louros deste caso são de todos pois foi um trabalho de equipa.

Antes de relatar os factos ocorridos na cidade de Aves, no bairro dos Despassarados, gostaria de apresentar os meus colegas:

TUTTI – Atarracado umas vezes, baixinho outras e marreco de vez em quando. Natural de Palermo, siciliano portanto, radicado no nosso país há inúmeros anos. Fugira da Sicília para escapar a uma «vendetta» porque seduzira a filha de um tipo qualquer e não quisera casar-se. Para matar saudades do seu país, vai lendo e relendo «O Siciliano» de Mário Puzo, comendo umas «pizze» e torcendo pela A. S. Roma apesar de ser um clube da capital.

FRUTTI – Mais alto e mais gordo que o seu patrício. Natural de Veneza. Saiu da cidade devido ao reumático que sofria em virtude das constantes infiltrações de água em sua casa.

Para matar saudades da sua pátria, vai bebendo uns Martinis, secos de preferência, e não perde um filme da Cicciolina porque é um videomaníaco tarado. Prefere o polo aquático ao futebol, o que se compreende…

Tudo começou na hora de almoço na Rua do Papagaio Louro n.º 4, do referido bairro, no primeiro dia de Agosto.

A vítima, uma solteirona de 50 anos, tinha sido barbaramente esfaqueada na zona do ventre e apresentava a garganta cortada.

Em menos de 20 minutos comparecemos no local do crime, alertados por uma vizinha, Simone Scaldini, brasileira, moradora no n.º 2 da mesma rua.

Vira sair apressadamente do n.º 4 um sujeito barbudo e bem bronzeado. Resolvera investigar visto a menina Ester Williams ser uma donzela militante. (Não sei porquê mas de repente fiquei com vontade de ir ao cinema…)

Blégh!l Diria mesmo que o ventre do cadáver mais parece a minha cara quando me barbeio com lâmina.

– Já reparaste naquela substância esbranquiçada saindo do estômago?

Ficamos todos intrigados. Quando o resultado da análise nos chegou às mãos, rimo-nos perdidamente! «Restos de peixe-espada». Irónico, não?

Ainda andávamos às voltas com as investigações do 1.º caso quando se nos deparou o 2.º, exactamente do mesmo modo, no dia 4 de Agosto.

O sr. Jeremias Céguinho aparecera assassinado no hall de entrada da sua habitação situada na Rua do Picapau Amarelo n.º 6. (seria o tal da telenovela?)

O crime ocorrera de madrugada mas só fora descoberto de manhã. Intrigados ouvimos as declarações da viúva, Margarida Céguinho.

(De céguinho é que o defunto não tinha nada!) Esta, chorosa e inconsolável, afirmou-nos que seriam altas horas da noite quando ouvira tocar à campainha De imediato empurrara o sonolento marido para fora da cama, acordando-o instantaneamente devido a fortes dores nos queixos. De seguida adormecera e só acordara de manhã, dando por falta do seu querido.

O Frutti fez uma investigação pormenorizada na casa, acabando por levar uma determinada cassete da videoteca do casal, com o consentimento da viúva, alegando ser material útil à investigação.

Cinco dias depois estávamos todos no nosso gabinete e poucos segundos após ter aberto o jornal desportivo italiano, o insp. Tutti desferiu um violento soco na secretária, salvo seja.

«Porca miséria!! Perdemos com os desgraçados da Juv!!» – gritou irritadíssimo, não se apercebendo do estrago que causara à sua saúde. Batera com o punho em cima de um cacto. Esta planta tinha sido colocada pelo mesmo alegando amor à Natureza. Quando ao Frutti, tinha mais amor a si próprio do que à Natureza. Só de olhar para a planta sentia sede e quando assim acontecia…

Daí a 1 hora deslocámo-nos à Rua do Papagaio Louro n.º 8. Outra vítima, o mesmo método de homicídio. O «feliz» contemplado era o sr. Isaac Asimov (Onde é que eu lá ouvira falar?…). Fora encontrado pela governanta. Esta não compreendia como em apenas 15 minutos de ausência alguém pudesse assassinar o seu querido patrãozinho. Por infelicidade, mais nenhum membro da família se encontrava em casa. E nós, tal como nos anteriores casos, não encontrámos a arma do crime nem impressões digitais.

Extenuados chegamos ao nosso gabinete sem saber o que fazer.

– A minha intuição diz-me que estes casos estão interligados! – disse o Frutti.

– E que o senhor de Le Palisse esperava de três crimes ocorridos de modo semelhante no mesmo bairro? Irra!…

No dia seguinte os jornalistas da capital, piores que melgas com desejos vampirescos, não nos largavam por um só minuto, ávidos de notícias.

Começámos a perder noites, por infelicidade no posso gabinete. Após horas e horas de trabalho árduo apurámos três suspeitos:

Primeiro – Abdul Malukho, 45 anos, professor de Matemática, nascido no Cairo, sem cadastro. Apesar do seu tom moreno e bronzeado reparámos que a sua face era invulgarmente quase branca.

Segundo – Manelinho Careca, 44 anos, sem profissão, nascido no Funchal. Extorsão e chantagem são as suas especialidades. Nos tempos livres, por sinal bastante dilatados, passa cheques carecas.

Terceiro – Quim Alfarroba, 43 anos, desempregado, nascido em Sines. Gaba-se de ser carteirista profissional sem nunca ter molestado as suas vítimas excepto no aspecto financeiro.

Portanto, o melro era um destes. Mas qual? E que provas? Tivemos que os libertar. E o passarinho fugiu da gaiola…

O dia 15 de Agosto foi feriado aproveitámos bem o dia. Na praia. No dia seguinte o pior não foram as queimaduras do sol mas o recomeço do frenesim. Nova chamada e fomos até à Rua do Papagaio Louro n.º 3. Um ta! Abraão Lincoln da Silva tinha sido assassinado. (Seria algum descendente do famoso presidente norte-americano?)

A vítima apresentava a face congestionada e com uma cor violácea, a língua projectada para fora da boca, marcas sanguíneas nos olhos, lábios, faces e pescoço além de ter sulcos igualmente no pescoço, em cima da laringe.

 

 

Fora o sr. José Magricelas que descobrira o corpo do sogro, um octogenário semi-inválido. Ninguém vira nem ouvira nada. Nem uma impressão digital para nos entreter. Registámos o seu depoimento:

– «Como já deve saber, o velhote, que Deus tenha em paz, vivia comigo e com a minha patroa. Era um bacano! Sei que é da praxe dizer-se bem dos mortos mesmo que eles tenham sido uns sacanas toda a vida e tentado sempre lixar o parceiro. Felizmente este não e o caso!

Fisicamente já não dava uma prà caixa mas conservava o espírito lúcido.

Apreciava imenso jogos de computador e filmes vídeo. Logo após o almoço eu e a minha Ana deixámo-lo agarrado ao televisor e enquanto fomos fazer compras. Quando chegámos foi o que foi… e o vídeo ainda estava ligado!»

– Qual o título do filme? – perguntou, adivinhem quem.

– «Um cadáver de sobremesa».

No dia seguinte convocámos de novo os suspeitos. Eis o principal:

Abdul – «Ontem, 6.ª feira fui orar à mesquita, em Lisboa. Regressei e fiquei o resto do dia em casa tratando dos meus gatinhos persas».

Manelinho – «Como tive uma sorte tremenda ao jogo, passei o dia de ontem ali na tasca do Zé dos Caracóis jogando à sueca. Almocei lá comendo fios de telefone com estilhaços de galinha».

Quim – «Meu, já disse que não gosto de apanhar talhadas. Não gosto de sarilhos com pasmas. Faz-me mal à saúde… Como passei o dia? De manhã bati a sorna até altas horas. Como eram horas de trabalho fiz de guia turístico a um par de França. Recebi um bom parné que é sempre bem vindo não é?

Ao fim da tarde regressei a casa nos transportes públicos. Anda-se à montada mas quem tem falta de filhoses…»

Fui eu mesmo confirmar a verdade das declarações. O Zé dos Caracóis assim chamado devido ao cabelo encaracolado, ilibou o Manelinho, O Abdul fora visto na mesquita e ao passar por casa dele o empregado doméstico mostrou-me os gatos persas do patrão. Quando ao alibi do Quim, apareceu-nos um casal dizendo ter sido ludibriado por um sujeito que se oferecera como guia. Identificou o nosso Quim por uma foto que costumamos ter de todos os que nos são queridos.

Finalmente o último caso. Ocorreu na rua do Papagaio Louro n.º 7, a 25 de Agosto. Nem testemunhas nem impressões digitais nem nada. Solteiro, 52 anos, de nome David Copperfield, ta) e qual o livro de C. Dickens. Causa da morte, estrangulamento.

Sem saber o que pensarmos, concluímos que o melhor seria cada um voltar para a sua santa terrinha, Palermo, Veneza e Lisboa, sujeitando-nos aos riscos daí inerentes, pior era a pressão popular e jornalística.

Foi então que exclamei: Ena pá!! Que zanagas, zaranzas, zarolhos, zecos e zucas que nós somos!! Vamos armar uma cilada ao melro que já sei quem é!

No dia 5 de Setembro vamos à casa situada…

 

PERGUNTAS:

1 – Quem irá ser engaiolado? Justifique.

2 – Onde actuará o criminoso? Justifique.

3 – Porquê 5 de Setembro?

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO