Autor Data 13 de Setembro de 2015 Secção Policiário [1258] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2015 Prova nº 8 (Parte II) Publicação Público |
O CASO TORTA Detective Jeremias Durante
três semanas fui uma das responsáveis por um encontro ibérico de 40 jovens
adolescentes vindos de várias zonas do país - incluindo Madeira e Açores - e
de três regiões autónomas espanholas: Catalunha, Galiza e Euskadi.
Estamos distribuídos por meia dúzia de tendas de campanha cedidas pelo
exército, que também montou algum equipamento para actividades
e as instalações sanitárias. Temos um pavilhão central de apoio e convívio,
onde funcionam a cozinha e o refeitório. Participámos na pintura de algumas
casas da aldeia onde estávamos acampados e também na apanha de fruta, fizemos
provas desportivas e campeonatos de tudo e mais alguma coisa. Os debates e a
troca de experiências e informação sobre o local de proveniência de cada um
de nós – lendas, jogos tradicionais, gastronomia ou outras curiosidades,
foram eleitos como as actividades preferidas. Cá
para mim a gastronomia é que marcou mais pontos, porque nunca na vida me
cruzei com pessoas que comessem tanto, nem que estivessem sempre tão
disponíveis para comer. É um grupo barulhento, cheio de alegria e boa onda. Hoje
é o último dia e felizmente tudo correu sem problemas, ou melhor, quase sem
problemas. Tivemos um “desaparecimento”. Calma, calma, não perdemos nenhum
miúdo, “desapareceu” uma torta de chocolate. Fui eu a receber o pão que a
padeira costuma vir entregar de carrinha, perto das 7 da manhã. Desta vez
vinha com uma oferta: um tabuleiro repleto de tortas de chocolate para o
almoço de despedida. É verdade que não as contei, mas tenho a certeza de que
o tabuleiro tinha as tortas perfeitamente alinhadas, sem espaço para mais
nada, e passada uma meia hora dei pela falta de uma: parecia um lugar vazio
num parque de estacionamento lotado. Quem levou a torta entrou por uma janela
aberta nas traseiras, porque eu, dois monitores e alguns miúdos estivemos a
preparar o pequeno-almoço perto do outro acesso possível, a porta de entrada.
Eu suspeito que se tratou do trabalhinho de uma só pessoa, se estivessem
vários envolvidos possivelmente teriam voado mais tortas, mas é claro que não
tenho a certeza. Só
estão duas tendas instaladas nas traseiras do pavilhão. Alguns dos que ocupam
essas tendas estavam ocupados com o pequeno-almoço. Sobram estes quatro
“suspeitos” que estão agora alinhados à minha frente
com o ar mais cândido do mundo, depois de confrontados com o desaparecimento
matinal da torta de chocolate, adorada por todos. Cristiano
é madeirense, ou melhor porto-santense, como ele gosta de frisar. É alto e
magro com o cabelo encaracolado. Sonha ser biólogo. Foi ele quem nos contou a
ligação de Colombo à ilha de Porto Santo e a história do bolo do caco. Disse:
“Quando acordei já passava das 7 e meia. Custou-me a adormecer ontem à noite,
bem tentava mas o sono não vinha. Até ‘tou meio monengo. E já tenho saudades disto tudo e de todos.” Sergi é catalão. Apesar
de franzino, ou se calhar por causa disso, é dos rapazes mais ágeis do grupo.
Jura a pés juntos que vai ser pintor. Sabe muito sobre Gaudi,
Dali e Miró e até estava a par da polémica em Portugal. Disse numa mistura
linguística: “Estive a içar as banderas. Hoy era eu o responsable. Prendre més tempo porque a da minha região ‘tava ao
contrário e tive da per correctamente”. Raul
é um tripeiro ferrenho, é o humorista de serviço do grupo. Quer ser actor quando for mais velho e já até frequentou alguns
“cursos sérios”. Contou ao grupo tudo o que conhece sobre o Porto e ensinou a
fazer a “melhor francesinha do mundo”. Disse: “Taba a enfiar a roupa na
mochila fora da tenda e bi um cão, acho que era um
cão, saltar e entrar pela janela lá de trás. Bai na
bolta foi ele que tirou a torta”. Agustín é basco e é o
nosso principal animador musical. Sempre que pode está a tocar ou a dedilhar
a sua viola. Nem é preciso dizer o que ele quer ser no futuro. Foi com ele
que ficámos a conhecer e construímos uma txalaparta.
Disse: “No vi nadie. No sé nadie sobre que tirou la torta. Las manchas que tengo na tshirt son la barra de chocolate comí esta mañana, no son
da torta.” Os
rapazes podem estar a falar verdade, ou não… Mas tenho a certeza de que um
deles me está a aldrabar. Se esse for o “ladrão” da torta, já sei quem é o
culpado. De
quem desconfia a narradora? A
– Cristiano B
– Sergi C
– Raul D
– Agustín |
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© DANIEL FALCÃO |
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