Autor Data 29 de Março de 1979 Secção Mistério... Policiário [210] Competição Torneio
“Detective Misterioso" Problema nº 4 Publicação Mundo de Aventuras [286] |
ACONTECEU EM FORNOS DE ALGODRES Dr. Felis Pardus Tinham
gelado nos últimos dias muitas correntes e fontes de água, mas,
independentemente da Natureza, também tinham gelado de terror supersticioso
os pacatos habitantes da pequena vila de Fornos de Algodres, com a notícia
alarmante que já corria de boca em boca… Na
mata municipal, lugar deveras aprazível, quando procedia à ronda habitual o
guarda florestal encontrara o cadáver de um jovem (que se drogava, dizia-se à
boca pequena) junto aos reservatórios da água. O corpo, a entrar em
decomposição, apresentava no peito e pescoço profundos golpes produzidos por
arma branca. As autoridades tomaram conta da ocorrência e verificaram
tratar-se do crime. Após
a remoção do corpo, seguiu-se a autópsia efectuada pelo dr. Carlos Lima,
médico de reconhecida idoneidade, amigo íntimo do inspector Santos que tomara
conta do caso. Após
a autópsia e as investigações preliminares, o inspector apurou o seguinte: 1.º
–
O indivíduo chamava-se Manuel e não se lhe conhecia profissão alguma, pelo
que, desconfiava-se de que vivia… Não lhe eram conhecidos familiares, e vivia
só, naquela velha moradia. 2.º
–
O corpo fora encontrado às 15 horas de sexta-feira e, segundo a autópsia, a
morte dera-se entre as 19 e as 20.30 horas da quarta-feira anterior. Quanto à
arma utilizada, poderia ter sido faca ou punhal, tendo o indivíduo morte
imediata. 3.º
–
Após aturada busca à sua moradia, foram encontrados em vários esconderijos
alguns pacotes de cocaína. Em face de tal achado, a Polícia supôs que ele
comercializava droga e por isso resolveu interrogar alguns dos conhecidos e
possíveis drogados que costumavam acompanhar e conviver com o Manuel. Desses
suspeitos, e do guarda florestal, são os depoimentos que seguem: Guarda
Florestal – Há vários dias que eu não passava por aquele
local, mas hoje, com o tempo a melhorar, quando fazia a ronda e passava junto
dos reservatórios, um dos meus cães começou a latir ruidosamente. Pensando em
algum coelho ou outro animal de caça, abeirei-me do local de arma aperrada. E
qual não foi o meu espanto quando, ao afastar os ramos de um arbusto deparei
com aquele indivíduo estirado… Verifiquei de imediato que estava morto, não
só pela aparência, como pelos golpes que tinha no peito e no pescoço e pelo
cheiro. Não lhe toquei e informei imediatamente as autoridades. Nada mais
sei. Nando
–
Inspector, eu confesso ser um drogado, mas gostaria que as minhas informações
fossem tomadas em consideração, como as de um indivíduo normal. Digo isto,
porque nós somos marginalizados e a maioria das pessoas toma-nos por
inconscientes e inconsequentes… No que se refere ao caso do Manuel, lamento-o
sinceramente, porque éramos grandes amigos, mas, na quarta-feira, fui
trabalhar para Juncais, que dista daqui uns oito quilómetros, e só voltámos
de lá pelas 22 horas pois tivemos um anoitecer de farra… Estava lá um amigo
que fazia anos, e vai daí, pagou umas bebidas no «Cabeça de Veado», que se
foram repetindo e por isso viemos mais tarde do que o habitual. Desculpe, mas
nada tenho a ver com o caso… Nem eu, nem nenhum daqueles que lá esteve. Joca
––
Como sabe, inspector, eu sou o filho único, ovelha desgarrada, do seu amigo
dr. Carlos Lima, e gostaria que algumas informações que vou prestar não
fossem tornadas públicas… Não é pelo meu pai, mas sou considerado, por quase
toda a gente, como um rapaz modelo… Creio que não mereço tal elogio, porque,
de vez em quando enfrasco-me em cocaína… Que o Manuel me fornecia. «Facto
aborrecido foi um dia o meu pai ter-me encontrado com o Manuel e outros
colegas, precisamente no momento em que nos drogávamos, o que o enfureceu…
Furioso como nunca o tinha visto, tentou afastar-me do Manuel… Oh, mas o
Manuel era um indivíduo formidável que nos ajudava em tudo que precisávamos.
Um dia, tentei apanhar-lhe alguma droga… Ao procurar num buraco da sua casa,
encontrei o que buscava… Mas, passado algum tempo ele descobriu quem lá tinha
ido, e por uma temporada deixou de me fornecer cocaína… Foi violento! «Quanto
à última quarta-feira, como ando a estudar em Mangualde, saí de manhã e só
voltei à noite no comboio das 22 horas, como o bilheteiro pode comprovar,
pois perdi a carrinha que nos vem cá pôr. Mas não compreendo como se pode
abater quem vive tão miseravelmente… Quem nada tinha. Carlos
–
Então, inspector, como vai este caso?... Olhe! Há dias, os senhores
multaram-me… Hoje, digo-lhe que o meu maior desejo é vê-los às aranhas e
espero que não descubram o assassino. Eu não o sou, porque o meu álibi é
intocável, indestrutível! Na quarta-feira, entre as 18 e as 23 horas, estive
no «Café Disco» com quatro amigos. O empregado pode e deve corroborar as
minhas afirmações. Como vê, estou acima de toda a suspeita e deve, portanto,
retirar o meu nome da sua lista… Passe bem! Boas tardes e… más investigações.
Lidas
e relidas aquelas declarações, o inspector encolhe-se, pensativo… Acende
mecanicamente o seu cachimbo e, minutos mais tarde dirige-se ao seu ajudante:
–
Sabes, Luís… Não vejo nada neste caso!... Apesar da brancura da neve lá fora,
ando totalmente às escuras, às cegas… Dá-me vontade de virar Fornos de
Algodres do avesso… –
Nada iria encontrar, por certo… Desde quarta-feira até hoje… A propósito: que
tal foi a festa que deu na quarta-feira? Ainda me lembro de, à meia-noite,
ver o seu amigo médico sair de sua casa… aos esses… Aquilo não era um
grãozinho… era uma chumbada!... –
Pobre amigo… Tão dedicado, tão humano, tão amigo do seu semelhante. Foi o
primeiro a chegar, pelas 18 horas, e o último a sair… Se não fosse esse
desgosto que o consome, pelo filho e pelas suas companhias… O filho!... Um
mariola que ninguém sabe «quem é aquilo»… –
Brrr!.. Que frio!... Olhe, o telefone… Quem será, com um tempo destes?...
Estou!... Sim, sim!... Um acidente?... Automóvel que se despista em grande
velocidade?... O gelo na ponte, claro!... Está bem! Obrigado. – E
depois para o inspector: – Inspector, eu… – Achei!...
Percebi! Lamento muito mas vou incriminá-lo… 1
–
Quem acha que o inspector ia incriminar? 2
–
Como chegou a essa conclusão? E qual o «móbil» do crime? |
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© DANIEL FALCÃO |
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