Autor Data 13 de Outubro de 2013 Secção Policiário [1158] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2013 Prova nº 9 (Parte II) Publicação Público |
A VINGANÇA DO MARIDO TRAÍDO Felizardo Lopes Felizardo
Lopes, lembram-se? Descrevi-vos aqui, há tempos, um
dos capítulos mais marcantes da minha vida: a minha experiência de
presidiário. Terão,
possivelmente, curiosidade em saber mais notícias deste ex-recluso – o então
1423. Pois bem, saí da prisão, cumprida pena, mas continuei a penar, depois,
durante algum tempo, tentando “navegar” neste difícil mar revolto que a vida
hoje constitui. Enfim, subsisti os primeiros tempos graças a um “pecúlio” que
tinha “guardado num velho televisor”, no sótão de minha casa – vocês conhecem
a história… Ainda lá estava, felizmente. Se assim não tivesse acontecido
teria, talvez, tido necessidade de voltar à prática de algum ato delituoso… e
ser hoje, de novo, identificado por um número… Uns
meses mais tarde arranjei finalmente emprego. Muito mal pago, claro, mas vai
dando para sobreviver… Livre!
A viver mal, mas livre; e agora sei bem que a liberdade é a condição mais
importante de que podemos desfrutar! De facto, a vida de prisioneiro, sendo
uma experiência que proporciona um manancial de histórias que enriquecerão o
“curriculum” de vida, não é desejada por ninguém – delinquentes natos, ou
primários como eu… Falei
em histórias. Narrei já aqui a minha; outros, lá, contaram-me a deles. Isto
porque, “lá dentro”, naqueles longos, tristes e desesperantes dias, muitos
sentem a necessidade de confidenciar as razões que ali os levavam. Desabafar,
uma forma de nos sentirmos menos sós – e, muitas vezes, tónico para aliviar o
peso das consciências… Porque
sei que estas histórias despertam sempre a curiosidade das pessoas, vou
partilhar convosco a que me foi narrada por um dos meus ex-companheiros – a
dramática experiência de F., o preso nº 1365. Já
lá estava, quando eu entrei. E porque também primário, porque também vítima
das condições adversas que a vida, em certas ocasiões, nos proporciona (e
ainda porque, ali, ele era um dos que mais sofria com situação e dos mais
carentes de apoio), rapidamente nos tornámos amigos e confidentes.
Inspirava-me pena pelas razões que sabia que ali o tinham levado… Era o
exemplo de como, de um momento para o outro, a vida de um homem feliz e
pacato conhece um tal volte face, um virar de página que transforma a sua
existência num inferno e a pessoa num farrapo… Mas
vamos à história. Reproduzo parte da sua narrativa, anos já volvidos após me
ter sido contada: “Matei!
Pratiquei o crime de homicídio na pessoa de um amigo, ou melhor, de alguém que
tinha como tal. Pois, as tais circunstâncias da vida: num dia, amigo de
alguém, no outro, seu assassino. Porque o fiz? Descobri que o miserável era
amante da minha mulher! Desde quando e quando tudo começara, desconhecia.
Mas, a partir das denúncias que passei a receber, fiz investigações e vim a
comprovar a sua veracidade. Fiquei desvairado, esmagado pela revelação! Era a
minha vida que se desmoronava, que se virava do avesso… Senti vergonha,
desespero, raiva… E decidi vingar-me! Dele, especialmente… Ela, pura e
simplesmente, repudiá-la-ia, não merecia mais que desprezo, distância como de
um cão tinhoso… Precisava de uma arma para cumprir a missão que se impunha:
disparar sobre o traidor, vingar-me; fazendo-o, descarregava também uma parte
da raiva que sentia. Era um imperativo íntimo. Arranjei pistola e dirigi-me
ao escritório do pulha. Estava sentado à secretária, e exibiu uma expressão
de surpresa e temor. Terá compreendido logo, (ou, pelo seu subconsciente
culpado, suspeitado), que eu não estava ali para um qualquer ato que pudesse
cimentar a nossa amizade. Tentou iniciar uma conversação, esperando ganhar
tempo para avaliar as minhas intenções, ao mesmo tempo que manipulava
nervosamente uma esferográfica – com a qual o vi, entretanto, rabiscar muito
rapidamente algo numa folha de papel, que logo virou – mas apenas conseguiu
inquirir, com uma expressão em que se desenhava medo, o que me levara ali.
Não lhe dei muito tempo; chamei-lhe miserável, canalha, e puxei da arma.
Disparei um, dois, três tiros que o atingiram no peito. Saí de imediato, Não
sei se o deixei ainda com vida ou não… Depois do que acabara de fazer, estava
cumprida a minha missão, era-me já indiferente qual o seu estado ou o seu
futuro. Era, simplesmente, um virar de página na minha vida, uma coisa que eu
tinha que fazer. E estava feito. Mas morreu! Não
tardei a ser preso. A minha detenção ocorreu muito rapidamente, mas não
constituiu para mim surpresa, consciente que estava que teria que pagar pelo
ato que cometera. A situação o que conduzira aquele crime já era conhecida
por algumas pessoas, e assim só houve que somar dois mais dois. Além disso,
ele acusou-me! Sobre a secretária e sob o seu tronco, nela caído, a polícia
encontrou uma folha de papel, manchada de sangue, com apenas uma letra
escrita – um L - na face voltada para baixo. Uma pista que a polícia, após
curta investigação, bem soube interpretar.” E
ali estava ele, agora, atrás das grades – outro homem, o preso 1365 –
expiando o crime que as circunstâncias lhe haviam imposto! Partilhando a sua
história comigo, que também nunca previra poder vir a estar naquele local… Foi
há uns anos – mas ele ainda lá está! Talvez
um dia volte com um novo episódio da minha passagem por um período de vida
que não me foi grato, mas que me marcou pelas muitas recordações e histórias
proporcionadas… Entretanto, porque sei que os meus amigos do “Público
Policiário” são “barras” na decifração deste tipo de desafios, coloco-vos a
seguinte questão: qual, dos nomes seguidamente referidos, acham que é o preso
1365? A
– Lourenço Pires; B
– Luciano Marques; C
– Luís Elviro; D
– Licínio Casanova. |
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© DANIEL FALCÃO |
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