Autor Data Fevereiro de 1984 Secção Clube Xis [19] Competição Iº Campeonatos de Zona de
Decifradores de Problemas Policiários e IIº Campeonatos Regionais de
Decifradores de Problemas Policiários e IIIº Campeonatos Distritais de
Decifradores de Problemas Policiários 1ª Jornada Publicação Clube Xis |
Solução de: GOLPE DE VISTA Ferman Solução
apresentada por Inspector Aranha Apesar de não
ter estudado muito profundamente o problema, creio que poderemos chegar à
solução através de duas formas distintas – que se complementarão. Uma, mais
simplista, que nos conduz, por exclusão de partes, à identidade do criminoso,
e outra, mais elaborada e completa, que nos determina a mesma conclusão mas
fundamentada em provas mais sólidas e concretas. Vejamos à
primeira. Possuímos, no
problema, quatro potenciais suspeitos. A sra.
Matilde, Francelino Péricles, Pedro Marialva e Remoaldo
de Sá, irmão da vítima. Quanto à Sra.
Matilde, possui alibi para o período das 3 às 5 horas – a cobrir portanto
largamente o período de perpretação do crime – e não é crível, por demasiado
grosseira e infantil, que a sua afirmação de ter estado com familiares não
fosse verdadeira. Ilibada, pois. Pedro Marialva
afirma ter estado com a vítima por volta ias 15,30 horas, tendo conversado
com ela durante 15 minutos, após o que saíu. Às 16 horas
Francelino Péricles já não conseguiu ser recebido pelo Comendador, visto que,
conforme afirmou, bateu, bateu, mas ninguém atendeu. E como, às
16.30, Remoaldo de Sá também não conseguiu que lhe
franqueassem a porta, penetrando então por uma janela entreaberta após o que
se lhe deparou o “horrível espectáculo” do
Comendador assassinado, a conclusão surge: a vítima havia sido assassinada
por Pedro Marialva, o último dos suspeitos que com ela estivera com vida. Solução
demasiado simplista e falível? Decerto que
sim, até porque parte do pressuposto de que todos falaram verdadeiramente, o
que pode não corresponder à realidade. Mas enfim,
tratou-se, apenas, de expor uma tese possível. Passemos agora
à segunda solução, que nos conduz à mesma conclusão, mas esta já devidamente
fundamentada com provas. Comecemos por
analisar a descrição que nos narra a forma como o crime foi perpretado, pois ela é bastante elucidativa quanto à
identidade do culpado. “O vulto
aproximou-se. O surpreso velho pressentiu o perigo ao divisar a ponta da
adaga levantando-se na sua direcção… Ainda tentou
oferecer alguma resistência… Esperneou enquanto a sua debilidade física o
permitiu… O outro desferiu-lhe um golpe letal… A vítima tentou “agarrar” o
seu agressor, num reflexo instintivo… Ao mesmo tempo que se estatelava sem
vida por sobre as lajes do salão, ouviu-se o estalar de vidros… Blasfemando,
o vulto tacteou ao acaso a área onde caíra o morto.
Agaixou-se e, desajeitadamente, apalpou por todas
as direcções… Por fim encontrou o corpo inerte e
pouco depois o que desejava… Retirou-se apressadamente, não sem ter
entretanto tropeçado em diversos adereços que ornamentavam a sala… A custo
encontrou a porta entreaberta… Ficou só a morte”. Analisando
cuidadosamente esta descrição, que se pode concluir? Fundamentalmente
que: a) O
assassínio era míope e usava óculos para corrigir essa deficiência, já que se
movimentou sempre naturalmente e sem dificuldade até à perpretação do crime e
que, depois do estalar de vidros no chão – quando a vítima lhos conseguiu
tirar – passou a tactear a área (…) apalpou por
todas as direcções (…) e por fim encontrou (…)
pouco depois o que desejava (óbviamente os óculos),
após o que se retirou; b) Porém, os
óculos encontrados não eram os seus, já que tendo anteriormente desenvolvido
uma actuação normal, a partir do momento em que
recuperou esses óculos retirou-se, não sem ter entretanto tropeçado em
diversos adereços que ornamentavam a casa. A conclusão é, pois, por demais
óbvia. c) Logo, havia
dois óculos no chão, tendo ele apanhado os da vítima e não os dele. Poder-se-à perguntar: o que prova que havia dois óculos no
chão? Pelo menos
três pormenores: Primeiro, o já
referido facto de ele, antes da perpretação do crime, ver perfeitamente, pois
nunca tropeçou em nada, e depois isso não tal ter acontecido. Segundo, o facto do assassino “ter achado o que procurava” (os seus
óculos) e de no local do crime terem posteriormente sido encontrados “uma
armação de óculos e os respectivos casos de lentes
divergentes”. Terceiro, o
facto dessas lentes encontradas serem divergentes e Pedro Marialva ser míope,
o que prova que esses óculos eram efectivamente
dele. Na verdade, a
“miopia provem de uma grande curvatura do cristalino, que forma as imagens
antes da retina, e o uso de lentes divergentes corrige esse exagero de
curvatura”. Por outro
lado, o velho Sá padecia, sim, de uma enorme falta de visão, mas a sua
deficiência visual era bem diferente da de Pedro Marialva. Isto porque,
apesar de usar uns sofisticados óculos, estes não ajudavam muito – pois
sabemos que, mesmo com eles, ele confundira o irmão com o leiteiro e, aquando
da chegada do assassino, ele solicitou: “Quem está aí? Não vejo bem daqui.
Aproxime-se mais…” E, porque se
tratava duma deficiência diferente, eis a razão porque
Pedro Marialva, quando os utilizou, ter tropeçado em diversos adereços que
ornamentavam a casa. A prova de que
deixou os seus óculos no local do crime – e, portanto, de que foi o criminoso
– está no facto (para além das lentes daqueles serem divergentes e ele míope)
de, no dia do depoimento na P.J., dia e meio após o crime, ter chegado atrasado
porque entretanto tivera que ir ao “Belavista” levantar uma receita –
obviamente substituir os seus óculos partidos e deixados no local do crime
por uns novos, absolutamente necessários para suprir a sua miopia, já que os
da vítima, que ele levara por engano, não só o denunciariam como não lhe
resolviam o problema da sua deficiência visual, como logo no momento da sua
retirada do local do crime isso ficou evidente. Portanto,
temos o caso resolvido. Foi Pedro
Marialva o criminoso que sabemos ter saído furtivamente peia janela
entreaberta, com uns óculos que lhe não proporcionavam boa visão, a mesma
janela entreaberta que o irmão da vítima deparou e por onde aliás penetrou na
casa, quando ali se dirigiu. E é tudo.. |
© DANIEL FALCÃO |
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