Autor Data 6 de Dezembro de 1991 Secção O Detective - Zona A-Team [141] Competição Problema nº 2 Publicação Jornal de Almada |
Solução de: PROBLEMA DE CONSCIÊNCIA Hannibal Em qualquer caso
semelhante ao em apreciação, três situações se põem: acidente, suicídio ou
crime. Não tendo alguém
se acusado da morte da vítima, ou de ter disparado a arma exclui, em princípio,
a probabilidade de acidente, o facto da pistola ter sido encontrada no
exterior do escritório, exclui, também em princípio a possibilidade de
suicídio; restando-nos, logicamente, a hipótese de crime, mas esta conjuntura
é negada pelo facto de todos os presumíveis suspeitos, que diziam nada saber
do caso, serem alibi uns dos outros, iá que espalhados em pequenos grupos,
pela casa se «cobriam» mutuamente. No momento do
tiro, ouvido por todos os presentes, qualquer deles não se encontrava nas
proximidades do escritório. As mulheres do
advogado, do médico e do bancário encontravam-se na estufa, a mulher da
vítima e a do engenheiro, conjuntamente à criada e à cozinheira estavam na
cozinha; o advogado, o médico, o bancário, o engenheiro, os dois rapazes
(filhos da vítima) e o criado-jardineiro-motorista permaneciam na sala de
estar enquanto no campo de ténis «estacionavam» a filha da vítima, o filho do
advogado e a filha do bancário, não tendo, por isso, algum deles a
possibilidade de disparar o tiro fatal. Não sendo qualquer
deles o seu autor e não tendo sido visto alguém estranho nas imediações (nem
disso sido encontrada qualquer pista), acha-se o investigador num «beco sem
saída», sinal evidente que algum dos pormenores ou das conclusões estão
falseados. Pelas
circunstâncias o factor crime é mais do que remoto, pois não existe qualquer
dado que o indicie, o mesmo acontece com a hipótese acidente resta-nos
portanto concluir pelo suicídio, muito embora haja que resolver primeiro a
circunstância do desaparecimento da arma, único óbice existente. Existe alguém com
motivo e possibilidade de tal. Sabemos que as
primeiras pessoas a chegarem junto do José Henrique foram os filhos, Miguel e
Teimo, enquanto os restantes homens presentes procuravam junto à porta do
escritório, evitar a entrada das mulheres na sala, sabemos, também que a
janela, enorme, do escritório, estava aberta, tendo sido fechada pelos homens
do Chefe Aguiar; sabemos ainda que o jovem Teimo referiu-se a algo que o
irmão Miguel, não devia ter feito, assim, é fácil deduzir ter o Miguel
atirado a arma para fora da sala, pela janela, aproveitando a confusão gerada
(possibilidade) e tê-lo feito porque tendo o pai se suicidado o seguro não
cobria essa situação e dado a periclitante situação das Industriais, a única
hipótese era simular a morte acidental para a família receber o avultado
seguro de vida (motivo) e não ficar na miséria. Isto leva-nos ao
motivo porque o investigador pediu ao Instituto de Medicina Legai os testes,
os chamados, vulgarmente, testes de parafina que os peritos só podiam fazer
ao morto e, na posse dos resultados (confirmação de terem sido encontrados
resíduos de pólvora na mão do falecido, sinal de ter este disparado a arma)
se ter fechado com o Miguel na estufa (confirmando a situação havida) e
possuidor da solução do caso, como amigo que fora da vítima (e em relação à
família do mesma, se sentir com um problema de consciência). Ele sabia que a
verdade iria prejudicar aquela família. «Dura lex sed lex»
Se retirarmos o
caso da arma (o ter desaparecido ou, melhor «voado» do seu local próprio),
havia no exposto diversas pistas que indicavam a possibilidade de suicídio. A crise que as
Industrias atravessavam, a negativa de empréstimo bancário a previsível
execução das hipotecas (passiveis de provocar a falência) e a doença fatal
que era portador (as três últimas «novidades» recebidas naquele dia) eram
factores mais do que suficientes para um homem, física e psicologicamente
debelitado cometer tal acto. E se aliarmos a
tudo isso as «traições» possíveis mas não comprovadas da mulher e do sócio e
que a arma usada foi a da própria vítima. Quanto ao resto,
os pormenores são subjectivos, destinados «a enroupar» o problema e a
permitir o solucionista de desenvolver o seu texto se quiser. Assim, a cápsula
.32 (ou 7,65 mm como os solucionistas, certamente indicarão fazendo a devida
ligação), encontrada no chão, significa haver uma pistola envolvida no caso
(os revólveres não ejectam as cápsulas disparadas) e a única arma
referenciada é a tal Beretta, modelo 81 com onze cartuchos intactos no
carregador (que nesta arma tem a lotação de 12 cartuchos), indício que só um
o que causou a morte, foi disparado, como foi o caso. O facto de a bala
não ser encontrada é porque ela entrou e saiu do crânio da vítima e, pela
posição do corpo perpendicular à janela aberta, se perdeu por esta. Os ferimentos na
cabeça da vítima indicam que o tiro foi dado no lado direito com o cano
praticamente na horizontal, com a arma apoiada à cabeça e que a força do disparo
fez a bala percorrer todo o hemisfério cerebral e sair pelo outro lado
provocando o tal «rombo». Segundo o Guia de
Perícias Médico-Legais, quinta edição (1972) do Professor Doutor Carlos
Ribeiro da Silva Lopes, a páginas 395 pode-se ler: «Quando a boca do cano
está em contacto com a região atingida ou pouco afastada dela – até à
distância de um centímetro, segundo BALTHAZARD – em consequência da acção
simultânea do projéctil, e dos gases de explosão, forma-se um ferimento largo
estrelado ou de contornos irregulares e lacerados – orifício em boca de mina
(HOF MANN) – à roda do qual não há tatuagem feita pela pólvora incombusta nem
depósito de fumo, a orla de contusão e a queimadura produzida pela chama
podem não existir em redor do orifício, dizendo-se mnemonicamente que se encontra
tudo dentro e nada fora.» Fica, assim, explicada
qualquer dúvida que possa ter surgido na mente de algum solucionista, pelo
facto de não haver indícios de tatuagem num disparo que obviamente, teve que
ser efectuado à queima-roupa. As «escaramuças»
entre o Miguel e o sócio do pai e alguns «desabafos» da Cristina Santos, do
Joel Oliveira e da mulher deste, que aparecem no texto pouco ou nenhum valor
têm para a solução final do caso. |
© DANIEL FALCÃO |
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