Autor Data 1 de Dezembro de 2009 Secção Competição Problema nº 3 Publicação O Almeirinense |
Solução de: A MORTE DO GÉMEO FARIA Inspector Boavida É
óbvio que a morte do gémeo Faria não se deveu a suicídio. Isto porque o copo
de água não continha arsénio e em lado algum da casa foram encontrados
vestígios do veneno. Por outro lado, nenhum dos gémeos parecia ter motivos
para atentar contra a sua própria vida. Um deles gozava a felicidade de um
novo amor e o outro afirmava-se na arte que abraçara. E se dúvidas existissem
sobre a causa do envenenamento, o inspector Gustavo
dissipa-as ao afirmar que não se está apenas perante um crime de homicídio. O
que, para além de nos afastar definitivamente da tese do suicídio, obriga-nos
a esmiuçar todos os acontecimentos associados à morte do gémeo Faria. Conjugando
os depoimentos do irmão da vítima, de Lili, do
carteiro, do homem da cave e da vizinha Gertrudes, podíamos concluir que o
gémeo morto é o Pedro. Mas… Embora as quatro versões
dos factos verificados nas escadas sejam coincidentes, convém sublinhar que a
forma como o gémeo vivo se refere aos vizinhos, apelidando-os de “corno” e de
“gorda”, é completamente desajustada a uma pessoa sensível como o Paulo.
Refira-se ainda que o gémeo vivo diz que acordou (“com os guinchos da Lili” – outra frase desenquadrada de alguém com perfil
humanista) às nove horas da manhã, quando é sabido que Paulo começava os seus
dias muito cedo, quase de madrugada! É
Paulo o gémeo morto! O caderno A3 e os lápis de cera, encontrados junto ao
cadáver, são “ferramentas” usadas por artistas plásticos na produção de
esquissos (e que de nada serviam ao “absentista” Pedro). Perguntar-se-á como
é que o gémeo vivo sabia o que se passou nas escadas, se não fosse ele o
Paulo. É simples: Paulo contou ao irmão que saiu de casa para ir ao Café do
Chico, por volta das 9 horas, devido aos ruídos registados no seu quarto,
facto que motivou também o vizinho da cave a concentrar-se no piso da
Gertrudes, a coscuvilhar o que se passava no andar de cima (isso explica a
razão de Paulo se ter cruzado com aquele vizinho, quando subia as escadas…). Perguntar-se-á
também por que está ao lado do cadáver uma carta que era dirigida a Pedro, se
é Paulo o gémeo morto. A explicação é simples: a missiva dirigida a Pedro tem
como remetente um homem do norte (Gaia), ocasionalmente no Algarve, que
solicita ao “amigo” o envio de uma carta para a sua mulher, a fim de a convencer
de que se encontra na Capital (e não nos Algarves, como ela, provavelmente,
desconfia). Diz o homem que a carta pode salvar o seu casamento! Para um
sujeito insensível e sem escrúpulos como o Pedro, aquele pedido acabaria
naturalmente por cair em saco roto. Só o bom coração de Paulo seria capaz de
“sensibilizar” Pedro a satisfazer o pedido! Paulo
terá fechado ele próprio o envelope, pedindo ao irmão que o depositasse na
estação dos correios mais próxima (na praça dos Restauradores!). Nunca se
saberá se Paulo teve consciência de que o autor da carta podia ser o marido
da mulher “do norte” com quem Pedro andava envolvido (recorde-se que não era
a primeira vez que este se envolvia com duas mulheres ao mesmo tempo!), que
queria efectivamente salvar o seu casamento, como
dizia na missiva… eliminando o homem que o estava a pôr em causa. Só que a
bondade de Paulo acabaria por colocá-lo no lugar errado e à hora menos
própria para ser bonzinho, acabando por pagar com a vida culpas alheias! Paulo
humedeceu, com a língua, a goma do envelope, acabando por ingerir o arsénio
aí contido. Ele terá ainda bebido alguma da água existente no copo encontrado
no “local do crime”, o que acabaria por acelerar o efeito do veneno. O inspector Gustavo acabaria por confirmar as suspeitas
quando encarregou o seu ajudante de efectuar uma
diligência nas proximidades: na estação dos CTT dos Restauradores, onde foi
recuperado e analisado o envelope que tinha o norte como destino. Após o
sucesso desta diligência, Gustavo fez dois telefonemas. Um para a PJ do Porto
(Gaia) e outro para uma das delegações da PJ no Algarve, para que vigiassem o
assassino e a esposa. O
inspector ainda fora levado a pensar na
possibilidade do envenenamento ter sido cometido por Lili
Jardim ou pelo irmão da vítima, uma vez que apenas eles tiveram acesso ao
local onde se registara a ocorrência. Mas depressa abandonou essa tese. Por
uma simples razão: não foram encontrados quaisquer vestígios de arsénio em
nenhum lugar da casa! Não podemos esquecer, porém, que Pedro podia retirar
“benefícios” da morte de Paulo. E foi isso que ele tentou, logo que se viu
confrontado com a morte do irmão, ao fazer crer subtilmente que era o Paulo,
para usurpar a identidade deste e, assim, escapar a um conjunto de processos
judiciais que ameaçavam levá-lo à cadeia. Mas Pedro esqueceu-se de algo importante:
os gémeos eram distinguidos aos olhos dos outros fundamentalmente pelo modo
de vestir. O carteiro referiu-se a Paulo como o «gémeo das t-shirts», o que significa que ele
vestia normalmente aquele tipo de roupa. Se os depoimentos recolhidos durante
os processos de investigação criminal não fossem realizados em separado, tudo
seria esclarecido quando o carteiro visse o gémeo vivo. Isto porque Pedro não
trocou de roupa com Paulo quando regressou dos correios. Recorde-se que o
corpo da vítima não fora mexido! Por outro lado, o telefonema feito para a
esquadra teve lugar breves instantes após Pinguinhas ter visto o gémeo. E
era exactamente este facto que causava no espírito
do sub-chefe Pinguinhas uma estranha sensação de
que algo lhe escapava, sobretudo quando olhava para os dois gémeos. Ou seja:
o gémeo vivo não envergava uma t-shirt.
Ele estava exactamente vestido da maneira como
Pinguinhas o havia visto momentos antes do telefonema para a esquadra… Por
outro lado, o gémeo morto envergava uma das suas habituais t-shirts. Resumindo, o sub-chefe Pinguinhas podia confirmar com os seus próprios
olhos que o gémeo vivo é o Pedro e o gémeo morto é o Paulo. Ambos Faria, como
o Pedro Paulo de… Nove, um dos grandes amigos do
homenageado Raposo! |
© DANIEL FALCÃO |
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