Autor

Inspector Boavida

 

Data

21 de Maio de 2017

 

Secção

Policiário [1346]

 

Competição

Campeonato Nacional e Taça de Portugal – 2017

Prova nº 3 (Parte I)

 

Publicação

Público

 

 

Solução de:

SMALUCO E A MORTE DO CHEF JOCA GANITAS

Inspector Boavida

 

O camarada de Smaluco, após chamar os seus colegas das perícias científicas e médico-legais, começou a esboçar mentalmente o seu relatório da primeira ação relativa ao caso da morte do Chef Joca Ganitas. É claro que omitiria a atitude do então jovem Smaluco e o seu estranho raciocínio que o levou a admitir estar perante um acidente, quando era evidente que o caso configurava um crime de homicídio. E o indício que desde logo apontava para essa conclusão residia nos dois copos com resquícios de vinho da casta alvarinho que acompanhavam a garrafa daquele delicioso néctar minhoto, ali mesmo tombada no chão da cozinha, reveladores de que a vítima estivera acompanhada.

Os passos seguintes levá-lo-iam ao conhecimento das relações que Ganitas mantinha com quatro predadores de jogadores viciados, protagonistas na noite clandestina de jogos de fortuna e azar, que tinham como processo de cobrança um método que combinava vinho verde do agrado de todos com um petisco de preferência pessoal. E foi isso que o levou ao criminoso, já que os quatro suspeitos tinham gostos gastronómicos distintos: Alberto gostava de caldeirada de chocos com batata-doce, Bernardo adorava migas à alentejana, Carlos tinha predileção por lombinhos de porco gratinados e Daniel tinha um gosto particular por estufado de novilho com ervilhas.

Apenas um dos suspeitos foi o autor material do homicídio do Chef, embora todos eles tenham chegado a exigir em conjunto o pagamento das suas dívidas, uma vez que Ganitas estava a preparar apenas um prato, sendo que este é cozinhado no forno, onde ele foi enfiado de cabeça. E dos quatro pitéus apreciados pelos suspeitos, apenas um vai ao forno: lombinhos de porco gratinados (gratinar é uma técnica culinária, de origem francesa, que significa levar ao forno alimentos cobertos com bastante molho, queijo ralado e polvilhado com pão ralado, para dar uma textura crocante por fora e que permaneça macio por dentro). As três restantes iguarias dispensam em absoluto o forno!

Recorde-se que Carlos Luís, o suspeito que tinha preferência por lombinhos de porco gratinados, é um tipo divertido e sempre de bom humor, traço psicológico que deixou bem patente na forma como expôs a assinatura do crime, colocando quatro cartas de jogar, quatro ases, um póquer de ases, junto ao fogão por onde enfiou o Chef Joca Ganitas. Tratou-se, pois, de um ajuste de contas solidário, em nome de quatro “ases” do póquer, consumado pelo mais inteligente dos quatro, que deixou o executado quase irreconhecível por via das queimaduras sofridas. Tudo isto não sem antes o executante brindar, com o vinho verde preferido de todos… talvez à saúde da sua própria vítima!

© DANIEL FALCÃO