Autor Data 5 de Julho de 2009 Secção Policiário [937] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2008/2009 Prova nº 8 Publicação Público |
Solução de: O INSPECTOR FIDALGO E A MORTE PELA NET Inspector Fidalgo A
base para resolução deste problema é a interpretação correcta
das imagens gravadas pela câmara Web. O
ponto central é que, quem quer que seja o interveniente no filme, com cerca
de 1,90 metros de altura, de quem nada se vê acima dos ombros, está a agir
premeditadamente com o sentido de atirar com as culpas para cima do outro, ou
não dissimularia a sua presença, escondendo a identidade. Não
há dúvidas que sabia estar a ser filmado e quais os limites da filmagem. Caso
contrário, não precisava de ir fazer a parte da casa de banho, avançava logo
para a moça e batia-lhe forte, inclusivamente fora do alcance da câmara. A
existência do ferro, arma do crime, indica que houve premeditação no acto. Parece
óbvio que houve cumplicidade com o captor das imagens, só assim se
compreendendo todo o aparato para este gravar quando não está e não gravar
quando está, que sendo possível, não é normal; o incorrecto
reportar da informação, porque a imagem não desaparece simplesmente, a sua
correspondente apareceria offline; o atraso com que
entrega as imagens à polícia; ou até o enquadramento da imagem na câmara Web
que parece ter sido ‘orientado’ por ele, como sugestão à vítima, para que
assim aparecesse e o momento certo da entrada em cena do criminoso, que
queria, como já vimos, ser visto. Depois, o seu comportamento é estranho na
medida em que, como refere, ouviu na rádio que era a namorada de um multimilionário
e em vez de tentar novo contacto com a moça, como seria mais óbvio, prefere
ir ao computador procurar as imagens e levá-las à Polícia. Temos
dois candidatos a autores do crime, Jorge e Vasco. Quem actuou
para o filme, fê-lo no sentido de atirar as culpas para o outro, como já
vimos. Se
fosse o Vasco, este pensaria e premeditaria toda a cena. Comunicava com o
cúmplice para saber se o enquadramento estava certo e, uma vez lá dentro –
seria visita habitual – ia para a casa de banho, mas representando para a
câmara como Jorge. Ora, sendo este um modelo de educação e nível, nunca o
imitaria deixando a porta aberta, urinando sem antes lavar muito bem as mãos
(uma regra básica de higiene que todos os homens deviam cumprir para defesa
própria e respeito higiénico para com o seu próprio corpo) e limpando as mãos
ao próprio fato depois de lavar as mãos no fim! Assim, era mais a imitação de
um sem-abrigo de que de um modelo! Se
fosse o Jorge, este faria os mesmos preliminares com o cúmplice, entraria com
a cara tapada ou com o capacete, fazendo-se passar por Vasco e ao ir para a
casa de banho procurava mostrar para a câmara, que não era o Jorge super-educado e cometia voluntariamente todos os erros! Exagerava,
como é usual quando a ideia é dissipar suspeitas ou encontrar álibis, porque
queria deixar bem vincado que ele nunca seria tão pouco limpo! A
conclusão é óbvia, o nosso criminoso é o Jorge! Estas
suspeitas são reforçadas por atitudes incongruentes por si tomadas. Ele vai
fazer uma surpresa à namorada, combina tudo com o Vasco, daí não haver lugar
para uma tentativa de contacto com ela. Ela não sabe que ele lá vai, não
estava à sua espera. Então para quê telefonar-lhe? Para lhe dizer que queria
fazer uma surpresa mas não conseguia? Mas repare-se que ele afirma que fez a
chamada assim que chegou ao Pico. Se não tinha já nenhuma esperança de lá
chegar, para quê fazer a chamada? Qualquer pessoa de lá lhe diria para
aguardar umas horas que a situação podia aliviar, como aconteceu, de resto.
Por outro lado, uma pessoa tão rica como ele, não teria um acesso à net para
lhe comunicar, até com imagem, o seu gesto? Depois,
após tanta preparação e trabalho, ao ser aberto o espaço aéreo, vem-se embora
para o continente, quando está a escassos minutos do seu destino? Mesmo que
fosse verdade que só lhe autorizassem o regresso a Lisboa, como afirma, mais
uns tempos de espera não lhe fariam diferença. O tempo estava a melhorar. Uma
vez ali, com a surpresa ainda possível, desiste de imediato e regressa. Também
o regresso é curioso. Depois daquela trabalheira toda, nem se preocupou por
não conseguir contactá-la e relatar-lhe as suas andanças daquele dia! Diz que
tentou, mais nada. Mas não seria lógico, em último recurso, contactar com o
Vasco para lhe pedir que fosse relatar à Graça e saber dela? Não o fez!
Quando nem sequer vai ao encontro da sua amada, por qualquer meio, ao saber
da sua morte, tudo fica claro! O
Fidalgo estava na posse da gravação das imagens que o moço lhe levou e é
óbvio que aquela prova jamais seria exibida, mesmo que informalmente, a um
suspeito, por mais importante ou rico que fosse. Pelas 20 horas o Inspector vê o filme e pela meia-noite o suspeito é
ouvido e afirma já ter visto o filme! Ele terá visto mesmo o filme, mas antes
do moço o ir levar às autoridades, alterado pelo menos na hora (operação
simples) que assinala 10h15, o que representaria 9h15 nos Açores e o
absolveria de imediato porque o avião aterrou no Pico às 9h13! O
poder financeiro do Jorge mandava mais alto e assim comprou a cumplicidade. Mas
o planeamento do crime terá sido feito para a situação de não haver mau
tempo, o voo ir directamente para o Faial, sendo
depois alterado. Também assim o Vasco fica fora da suspeita porque o avião
aterraria no Faial pela mesma hora, 9h13. O aeroporto fica a mais de 9
quilómetros da cidade da Horta. Ora, conforme Jorge afirma, antes de alugar o
carro no Pico (antes das 9h35), telefonou ao Vasco a dar-lhe as novidades e
ele ficou muito nervoso. Demorando o contrato do aluguer no Pico cerca de 10
minutos, o telefonema teria sido pelas 9h25. Isso só poderia querer dizer que
ele já matara a Graça e agora não sabia o que fazer. Nestas condições, por
essa hora estaria o Jorge a iniciar o caminho para a Horta, partindo do
princípio que tinha planeado ter uma viatura a sua espera, mas podendo até ir
acompanhado, o que o Vasco não sabia. Igualmente, sendo a filmagem (alterada
a hora ou não) registada no computador às 10h15 do Continente, 9h15 dos
Açores, o Jorge ainda estaria no aeroporto da Ilha do Faial. Portanto, se
fosse o Vasco o criminoso tentando atirar as culpas para o Jorge, punha-o a matar enquanto ele não tinha a mínima hipótese
de estar no local do crime! O
Jorge preparou tudo para se vingar da namorada e do Vasco. Combinou com este
fazer uma surpresa à Graça. Para isso terá pedido ao Vasco para trazer o
aparelho, o capacete e o fato, logo após ficar ‘de baixa’ e certamente terá
incentivado a que este desse umas voltas de ‘asa-delta’ e fosse a casa da
namorada, de quando em vez, com o fato e
possivelmente com o capacete, para que ela se habituasse a vê-lo chegar assim
e não estranhasse quando fosse ele a entrar. No
dia combinado, o temporal podia complicar, mas o Jorge torneou a questão,
pedindo ao Vasco que o viesse buscar de barco a um local menos visível e daí
ter alugado o carro. Ele estava enfraquecido da imobilidade de um mês, não
conhecia o mar como o Vasco e além do mais despertaria suspeitas se alugasse
um barco. Essa foi a chamada que ele assentiu ter feito. A travessia do canal
é quase sempre possível e relativamente fácil para quem conhece, ao contrário
da aérea. Vasco veio buscá-lo e levou-o ao destino, onde tinha o fato e o
capacete que o Jorge vestiu. Como havia mau tempo, o aparelho de ‘asa-delta’
ficou fora da surpresa. Certamente
Jorge terá dito a Vasco para aguardar por ele no barco porque a surpresa era
muito breve, já que teria alguma coisa de urgente para ir fazer em qualquer
parte, enfim, coisas excêntricas de rico e, se calhar até a arma usada,
provavelmente um ferro parecido com um pé de cabra, lhe foi fornecida por
ele, como parte da alguma brincadeira… Depois
de fazer o ‘trabalho’, Jorge regressou ao barco, sem o fato nem o capacete,
que foram encontrados na Horta, mas com o ferro que ainda iria ter uso e
iniciaram a travessia, que só terminou para ele. Os
dias seguintes iriam, certamente, dar respostas e confirmações. O corpo do
Vasco, o barco, talvez o ferro… |
© DANIEL FALCÃO |
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