Autor

Inspetor Boavida

 

Data

1 de Junho de 2016

 

Secção

O Desafio dos Enigmas [1]

 

Publicação

Novo Audiência

 

 

A CONFRARIA DOS GÉMEOS

Inspetor Boavida

 

Os irmãos Costa Pereira são três dos mais influentes membros da Confraria dos Gémeos, agremiação a cujos destinos presidem vai já para três anos na qualidade de diretores únicos. Iguais como gotas de água, eles apenas se distinguem por pequenos traços particulares.

Jorge é neste momento facilmente reconhecido pelo seu forte coxear, resultado de um muito recente acidente de caça que causou grandes estragos na sua perna direita. José é desde quase sempre identificado pela sua acentuada gaguez, fruto de um tremendo susto sofrido quando criança. E Jacinto apresenta como traço distintivo uma indisfarçável cicatriz junto do sobrolho esquerdo provocada por uma infeliz brincadeira dos seus tempos de adolescente, no recreio da escola.

É dia de comemoração de mais um aniversário da Confraria dos Gémeos e o detetive Fagundes dirigiu- se de urgência para o local, por solicitação de um antigo colega da Polícia Judiciária que ocupa agora lugar destaque nesta organização.

Um dos irmãos Costa Pereira fora avistado numa cidade do sul do país, a cerca de 400 quilómetros de distância, a cometer um hediondo crime. O que, aliás, não surpreendeu ninguém na Polícia Judiciária, uma vez que há muito se suspeitava que os três irmãos estavam associados a uma perigosa rede de delinquentes que tem vindo a cometer diversas atrocidades criminosas de norte a sul de Portugal, espalhando o terror por onde passam e deixando marcas profundamente traumáticas entre as suas vítimas.

Fagundes deambulava pelo salão de festas da Confraria dos Gémeos quando um dos irmãos Costa Pereira chegou. Sempre agarrado a uma elegante bengala, o gémeo foi estendendo a sua mão direita a alguns dos presentes enquanto caminhava com aparente dificuldade rumo à sala de reuniões, onde os elementos da direção da Confraria decidiriam a atribuição do Prémio ‘O Gémeo do Ano’. Havia em cada rosto dos presentes sinais de alguma ansiedade e expectativa, se bem que se murmurasse entre dentes que aquela distinção já estava há muito destinada a um dos diretores. Mesmo assim, notava-se uma réstia de esperança nos olhares de muitos dos gémeos de que aquele galardão viesse a distinguir outro dos confrades e não os do costume…

Pouco tempo volvido surgia no palco um dos gémeos Costa Pereira, apresentado como presidente da direção da Confraria, para anunciar o veredito. A luz dos projetores fez sobressair uma pequena cicatriz que, segundo algumas das senhoras presentes, lhe dava um certo encanto. «E o vencedor é…». O resultado já era o esperado por quase todos. A direção da Confraria distinguiu, pelo terceiro ano consecutivo, um dos gémeos Costa Pereira. O seu discurso de vitória foi divertidíssimo, arrancando grandes gargalhadas. O laureado subiu rápido ao palco, mas levou bem mais do que um minuto para dizer simplesmente: «Oooo.briiiii.bri.bri. briii.ga.ga.gaaaa.do.do.doooo!».

Fagundes está intrigado. A testemunha que denunciara um dos gémeos como autor de um crime cometido há pouco mais de meia hora era absolutamente credível e ela garantia ter visto o gémeo coxo matar um abastado industrial a 400 quilómetros dali. «Mas como é isso possível?» – interroga-se o detetive.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO