Autor Data 16 de Dezembro de 2011 Secção Correio Policial [11] Publicação Correio do Ribatejo |
ACONTECEU EM 1977 Jomape Joãozinho
“Azarento” andava mesmo cheio de azar. Enquanto
se tratava de roubar carteiras… arrombar carros…e assaltar casas, a “coisa”
não lhe desagradara. A colheita geralmente compensava… E o risco de passar
uma temporada “à sombra” não o atemorizava. De resto, toda a Polícia o
conhecia bem… e aos colegas… e ao Chefe. Mas também não ganhava nada com isso
porque todos eram especialistas na “matéria”. No
entanto, agora o “negócio” era mais sério! Aquela ideia do Chefe transformar
a malta (e sem lhes dizer “água vai”…) num grupo de bombistas, até lhe pusera
os cabelos em pé… Primeiro porque não conhecia a “profissão”… Depois, com o
seu azar habitual, qualquer dia iria mesmo pelos ares com a bomba e tudo. Ou
então seria “engavetado” para toda a vida… Não!
Não lhe agradava mesmo nada… Nunca matara ninguém… Nem queria matar. Roubar,
isso era outra coisa… O melhor seria “reformar-se” enquanto era tempo! E até
podia ser que ganhasse “algum” do lado contrário… Conhecia tanta coisa e
tanta gente… Contudo,
a sorte não queria nada com ele. Desde
que os seus dois primeiros trabalhos haviam fracassado, pois as bombas tinham
sido descobertas antes da explosão, o Chefe já não era o mesmo para ele…
Parecia-lhe que ficara desconfiado… Como se pudesse ler o seu pensamento! Se
assim fosse, estava “tramado”… Mas, que diabo, tantas bombas são descobertas
antes de rebentarem… E os jornais naqueles dois casos, até haviam noticiado
que tinha sido por acaso… A
verdade é que andava mesmo obcecado com aquela história. Era
mesmo de propósito. Com o tempo “bestial” que estava… logo havia de lhe
marcar trabalho para o dia seguinte… Já não poderia aproveitar aquele
primeiro domingo de Primavera para tomar uma “banhoca” na praia… Teria de
adiar a inauguração da “época balnear”. Ainda por cima,
obrigara-o a estar todo aquele dia fechado em casa do Chefe para planearem
uma série de “trabalhos”. Nem sequer conseguira uma aberta para comprar o
jornal… E,
só depois do jantar, após a saída dos colegas, é que chegou o novo “recruta”,
um magnífico “relojoeiro”, arranjado pelo Chefe, para prepararem o engenho
para o dia seguinte. Seria para o meio-dia. E, desta vez, o Chefe determinou
que a “encomenda” fosse entregue mais sobre a hora, para reduzir as
possibilidades de novo fracasso. Como
já era tarde, ele dormiria lá em casa do Chefe e de lá sairia com o
“embrulho” directamente para o local. Levaria mais
de uma hora a pé, pois não iria correr riscos inúteis… Há sempre quem tenha
boa memória… No
outro dia, Joãozinho “Azarento” acordou mesmo a tempo de cumprir o horário
que havia estabelecido na véspera, enquanto não adormecia. Agarrou
no “objecto” e saiu… Comprou o jornal para ler mais
tarde, descansadamente… Desta vez teria de ser ao contrário… E, se… Queria lá saber… Se calhar ainda era a melhor solução!
Entrou numa cabine telefónica, onde se demorou pouco tempo… Ao sair viu as
horas no seu relógio… E lá foi andando vagarosamente. Mais uma hora de
caminho e outra para se safar… Terminara
o azar de Joãozinho “Azarento”. A cem metros do Ministério, o estrondo
alarmou todas as pessoas que se encontravam nas redondezas. Felizmente,
ninguém mais fora atingido. Mas,
Joãozinho “Azarento” voara mesmo pelos ares. Cerca
de dois minutos depois, o Insp. Nunes dos Santos,
ao chegar ao local, com os seus agentes, encontrou um monte destroços… embora
tivesse identificado imediatamente aquelas orelhas inconfundíveis. Então,
duvidou que se tratasse de mero acidente, e as suas suspeitas avolumaram-se
ao descobrir, no meio dos despojos, um pequeno pedaço de papel com as
seguintes anotações: 10/I/22/23/24
8/II/14/15/16 27/III/11/10/12 Extraordinário!
O homem ia anotando os “prémios” de sua “apólice de seguro”… Era evidente.
Mas, nem todos os números da última linha, escritos hoje, sem dúvida,
correspondiam aos factos! Como explicar esta anomalia? O
Insp. afastou-se um pouco,
para pensar com mais calma e, passados alguns instantes, encontrou a solução. Voltou
ao local, procurou com cuidado, encontrou… e ainda conseguiu confirmar a sua
hipótese. A
verdade é que podia ter evitado aquela morte! Estava desolado, pois nem
sequer poderia incriminar o culpado, que premeditara um mais que provável
acidente para originar um verdadeiro suicídio involuntário. Joãozinho
“Azarento” morrera precisamente ao meio-dia. Paz à sua alma. Convida-se,
agora, o leitor a explicar este caso, justificando convenientemente a sua
teoria.
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© DANIEL FALCÃO |
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