Autor Data 11 de Outubro de 2015 Secção Policiário [1262] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2015 Prova nº 9 (Parte II) Publicação Público |
UM MILHÃO SE MATA, UM MILHÃO SE MORRE Karl Marques As
primeiras indicações seriam que não falecera logo de imediato, a avaliar pelo
sangue derramado pelo chão. Mesmo assim não teria sido muito tempo, a
primeira chamada de um vizinho, a assinalar movimentações estranhas na casa
(um carro parado nas discretas traseiras, alguém que entrara pelas mesmas
traseiras e ocultando o ruído, sem acender qualquer luz, e um som que parecia
ser de coisas a tombar) fora pelas 21h20. O mesmo vizinho insistiria menos de
10 minutos mais tarde, assinalando a saída do estranho visitante, a GNR
chegaria pelas 21h45 àquela aldeia com cerca de uma vintena de casas
(conhecida localmente como Casal Perdido (nome não oficial), metade
desocupadas, e a 4 kms de uma estrada mais
movimentada (e única saída da aldeia “via alcatrão”). Entraram
na casa, mas apenas depois de encontrarem a porta aberta nas traseiras,
quando chegaram ao corpo este era já cadáver. Encontrava-se a um canto da
sala, com parte do corpo ainda encaixado numa cadeira de secretária “com
rodinhas”, corpo e cadeira tombados. Eram visíveis no peito e nas costas as
lesões causadas pela perfuração da bala. A sala em si parecia despida de
mobiliário com excepção dos equipamentos instalados
numa secretária muito grande onde um monitor (ligado), um teclado, rato,
colunas e até uma impressora, partilhavam o espaço com alguns papéis soltos,
meio rabiscados. Teclas do teclado soltas e desfeitas chamaram a atenção para
a existência de uma bala onde deveria estar um G e um H. Causou
um susto valente nos presentes quando de súbito começou a ouvir-se “como uma
força, como uma força”, vindo do cadáver. Atrás do corpo da vítima, junto à
sua mão esquerda, foi encontrado um telemóvel. Alguém atendeu, por impulso
irrefletido, e a chamada terminou de imediato. Finda a chamada foi visível no
ecrã manchado de sangue 22454603. Em análises posteriores não se encontraram
no telemóvel da vítima quaisquer contactos com aquele início, assim como não
se verificou qualquer chamada feita para qualquer número com aquele início. O
vizinho que chamara a GNR informou que conhecia mal a vítima, secundado pelos
outros habitantes da aldeia que entretanto se juntaram, chegara ao lugar à
coisa de 5 meses e pouco ou nada sabiam, pois pouco comunicava com eles. Saía
frequentemente de casa, no seu carro, e era isso o, pouco, que sabiam. A
maior comunicação que tivera havia sido com o neto de um dos residentes,
estudante universitário “de computadores” e com havia ainda partilhado o seu
entusiasmo por tudo o que fosse tecnologia, considerando-se um indivíduo do
século XXII disposto a usar tudo aquilo que o homem atribuísse à máquina para
facilitar a vida do humano. O vizinho não conseguira perceber nem a cor nem a
marca do veículo, apenas que era um veículo “dos mais pequenos”. Viria
a apurar-se que a vítima se chamava Albano Milhão, e que era um detetive
profissional. Oriundo de Braga refugiara-se naquela aldeia por precisar de se
isolar por estar a tratar de um caso muito delicado, que lhe ocupara
sensivelmente os últimos 7 meses. Contratado por um industrial (que assumiu
depois ser o autor da chamada para o telemóvel da vítima, que desligou por
receio sobre de quem seria aquela voz) para investigar um concorrente, o
tópico viria a tornar-se muito mais perigoso do que esperava. Por
coincidência, nessa noite, a 14 kms da aldeia,
ocorrera um acidente que envolvera, apenas com danos materiais ligeiros,
quatro “carros pequenos”. Os quatro condutores, que viajavam sozinhos, foram
interrogados pelos agentes que se dirigiram ao local para tomar conta da
ocorrência, mas que eram já conhecedores do assassinato entretanto ocorrido. Albino
Um: era do Porto e estava em trânsito vindo de Espanha. Fora em trabalho
levar uma encomenda a Madrid. Disse não saber do que seria a encomenda, pois
ele limitava-se a transportá-las. Forneceu, muito a contragosto o contacto de
quem o contratara, tendo essa entidade, de forma muito receosa, fornecido
qual o destino da encomenda. Quando questionado sobre Casal Perdido disse não
ter por hábito fazer paragens em terras desconhecidas. Embora os outros
envolvidos o considerassem o responsável ele estava renitente em dar-se como
culpado. Disse não conhecer sequer ninguém de apelido Milhão. Veio a
apurar-se ter cadastro de pequeno tráfico. Abílio
Dez: Afirmou ter até estado uma vez em Casal Perdido, num acampamento feito
com escuteiros na adolescência. Mas que não lá voltara entretanto. Mas Milhão
não conhecia. Era de Aveiro e fora visitar um amigo a Viseu. Aceitou fornecer
a identidade e contacto do amigo. Não tinha cadastro. Acácio
Cem: Era da Feira e tinha-se ido despedir da amante, e pedia encarecidamente
para não o revelarem à mulher. Não podia fornecer o número da amante pois ela
ia precisamente embora para sempre, e não quisera deixar-lhe contacto. Estava
ainda muito transtornado, pois ele pensava até deixar a mulher. Concluía
agora que nem sequer sabia se o nome da amante era verdadeiro. E sim,
estivera duas vezes em Casal Perdido, por razões profissionais (era geólogo),
mas qualquer uma dela há já algum tempo. Também não conhecia Milhão. Cadastro
não tinha. André
Mil: Era de Viana do Castelo. Afirmou não conhecer Casal Perdido, mas que até
julgava conhecer Albano Milhão. Um amigo seu pedira-lhe uma vez para o
acompanhar a uma entrevista com o detetive (desconfiava de um sócio), mas
nessa altura Milhão tinha escritório em Braga. Estava na zona a preparar um
jogo de pista a propor como atividade aos colegas do seu local de trabalho
daí a algumas semanas. Tinha uma condenação, já antiga, por condução sem
carta de condução. Estes
dados e posteriores confirmações permitiram concluir que o assassino foi: 1
– Albino Um 2
– Abílio Dez 3–
Acácio Cem 4
– André Mil |
|
© DANIEL FALCÃO |
||
|
|