Autor

Kid Canalha

 

Data

9 de Janeiro de 1994

 

Secção

Policiário [132]

 

Competição

Torneio Rápidas Policiárias 1994

Prova nº 1

 

Publicação

Público

 

 

KID MORENO EM “EXTREMOS”

Kid Canalha

 

No percurso que me levaria até ao nº 7 da Rua do Areal, sob o sol forte de Verão, fui assaltado de forma algo torturada pelas imagens ainda bem presentes da incrível noite de domingo último.

Por entre a multidão habitual do Rave Bar e das habituais beldades que o povoam surgira a exótica Sara. Fora um serão de conhecimento aprofundado que terminara em sua casa, moradia reveladora de alguma riqueza e completa independência. A aventura prosseguira noite dentro, revelando a extrema sensualidade que acompanhava cada um dos seus gestos.

“Kid”, sussurrara, os olhos verdes-água fixando-me densamente, “bem-vindo à última fronteira para o sonho.” A última, mesmo. Cabelos negros, selvagens, tombavam desalinhados pelos ombros largos, entrecortando ainda uns seios claros irresistivelmente aveludados, contrastando com o tom bronzeado do corpo quente. Tanta beleza tornar-me-ia irracional para o resto da noite. Ultrapassava a fronteira e entrava no sonho. Levado a extremos…

A voz conhecida do Inspector Ramoa na já habitual saudação calorosa que me dispensava despertava-me para o tempo real, chegado que estava ao meu destino.

“Kid! Kid Moreno! Já lá vai algum tempo, rapaz! Essas férias?”

“Estavam óptimas, até há uma hora atrás.”

“Pois é verdade! Um caso aborrecido. Mas só te importunei porque sei que gostarias de dar uma ajuda. Ainda por cima no local das tuas férias.”

Entrámos, serpenteando por um e outro compartimento, que via pela segunda vez, reforçando o meu envolvimento com este caso.

No corredor de acesso ao quarto de Sara, a criada de meia-idade jazia sentada, face contra a parede, completamente irreconhecível. As marcas de uma massa ensanguentada revelavam uma morte violenta por esmagamentos sucessivos do crânio contra a parede. Mais adiante, no quarto, a violência parecia atenuar-se.

Alguns objectos pelo chão e a colcha desordenada sobre a cama denotavam uma certa movimentação brusca naquele compartimento. O corpo de Sara, completamente nu, estendia-se no chão ao fundo da cama, aos pés da qual se encontravam amarrados os seus pulsos estreitos e delicados. As feições contraídas revelavam alguma contrariedade à cena que, com certeza, tivera lugar.

“Sara de Vasconcelos”, revelou o Inspector. “Vivia permanentemente nesta residência de praia. De famílias ricas, sem necessidade de trabalhar. Sofreu uma pancada violenta na cabeça. Morta entre a madrugada de domingo e a manhã de segunda.”

“Suspeitos?”, indaguei.

“Dois. O jardineiro, que vem cá todas as manhãs, aquele sujeito ali, bem parecido e bem constituído, e um outro, o ‘Pregador’, como lhe chamam, que prega pela moral e bons costumes à entrada da praia e tenta vender uns livrinhos. Um tipo com ar de lunático e franzino.”

Voltámos à sala da frente para ouvir a gravação das declarações de ambos. Acertado o volume, o Inspector Ramoa carregou no “start”. O jardineiro declarou:

“Não me apercebi de nada até hoje de manha, quando fui pedir dinheiro para comprar adubo e descobri. Muitas vezes chego, faço o serviço e vou-me embora sem chegar a falar com ninguém. Mas o importante é que durante os últimos dias, e inclusive ontem, reparei no indivíduo, o pregador, a espreitar da rua, por entre os arbustos que cercam a casa. É claro que só podia estar de olho na patroa, já que ela costumava fazer nudismo no seu banho de sol diário, lá pelas dez e meia, onze horas. De resto não sei de mais nada.”

Mais tarde, o pregador acabara por revelar:

“Bem, realmente costumava espreitar. Mas isso era combinado com a Alice, a criada. Eu aguardava que a patroa viesse cá para fora, esperava um pouco e depois entrava, indo pela cozinha. Sabe, a Alice era muito carenciada. Não tinha rumo e eu tentava fazê-la encontrar a Luz. Ontem de manhã não vim cá. Hoje, terça, é que era dia de vir. Pelos vistos, tarde de mais. Que descanse em paz.”

A gravação calou-se e o Inspector Ramoa encolheu os ombros, desalentado pela falta de pistas. Recordei Sara, ainda no Rave Bar, quando a conheci.

Inspector, talvez o possa ajudar…”

 

As quatro hipóteses de solução serão:

A – O criminoso é o próprio Kid Moreno.

B – O jardineiro mente, procurando incriminar o pregador.

C – O pregador não mente, mas é o criminoso.

D – Tanto o pregador como o jardineiro participaram nos crimes.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO