Autor

L. P.

 

Data

11 de Dezembro de 1975

 

Secção

Mistério... Policiário [39]

 

Competição

I Grande Torneio

Policiário nº 3

 

Publicação

Mundo de Aventuras [115]

 

 

Solução de:

ROUBO NO COMBOIO

L. P.

 

1 – O ladrão foi o passageiro francês.

2 – Só um homem da Zona Continental Europeia, faria um 7 (sete) com o corte a meio. Um inglês nunca o faria. Como o alemão estava fora da questão…

 

Solução de Big-Ben

Não haja dúvida!, a mente humana é um imenso manancial de recordações!... Quando se entra na fase a que se convencionou chamar «maturidade», primeiro passo para uma outra denominada «velhice», o homem não só vive o momento presente, mas, outrossim – quiçá, principalmente – «vive» o passado… Tudo quanto lhe ocorre hoje, todas as facetas que se lhe deparam no presente, são convites para recuar no tempo e reviver o que décadas atrás lhe aconteceu, «obrigando-o» a estabelecer paralelos, a fazer comparações…

Pois bem, este «policiário» nº 3 do «I Grande Torneio» do «Mistério… Policiário», trouxe-me algo à lembrança. Procedendo a aturadas buscas nos meus arquivos, descobri o que desejava. Estava no «Camarada» nº 10, publicado em 15 de Abril de 1948, no «Mistério e Aventura», secção policial orientada por… «Sete de Espadas».

Após várias considerações, o «Sete» escrevia o seguinte:

«Para a resolução dos problemas policiais, não basta indicar se há crime ou se há suicídio; quem foi o ladrão ou quem foi o criminoso. É preciso muita atenção ao texto, muita atenção ao desenho ou fotografia – se os houver – pensar um pouco em ambos e depois, melhor ou pior, construir uma «hipótese». Dentro dessa «hipótese», fazer coincidir as «pedras», isto é: ajustar perfeitamente todos os dados, que estão a mais ou menos espalhados e escondidos pelo texto e pelo desenho. Para construir com segurança a «hipótese», há que recorrer aos dados que o produtor ocultou. Estes podem-nos ser apresentados em datas que não concordem com certo e determinado facto; em horas que não coincidam com o «momento do crime»; em declarações que falseiem a verdade, porque há uma contradição entre elas; na posição do corpo depois de assassinado; na posição da arma ou instrumento que serviu para cometer o crime e em relação ao local da ferida; na posição dos objectos no local do crime; nas descrições dos respectivos locais; nas declarações dos suspeitos e tantos, tantos outros dados que um produtor, mais ou menos cheio de imaginação nos pode apresentar.

«Na construção dos policiários, os dados variam de produtor para produtor, conforme a imaginação e a dose de conhecimentos. Não há regras imutáveis e os solucionistas, mais do que o produtor, são obrigados a possuir vastos conhecimentos. O solucionista é sempre obrigado a interpretar a ideia do produtor e confessamos que, muitas vezes, esse ideia é bastante nublosa… Para resolver um problema policiário temos, em primeiro lugar, que interpretar psicologicamente a maneira de sentir e de actuar do produtor. Não sei se vocês estão a ver… Temos de nos meter dentro da sua maneira de pensar, seguir atentamente o seu raciocínio e ver, sempre que possível, as suas anteriores produções. Depois, o caso é fácil – psicologicamente achamos a solução…

«Mas nem sempre as soluções feitas psicologicamente estão dentro da verdade… E nós limitamo-nos antes a analisar os factos, a escalpelizar os mínimos pormenores e deixamos a psicologia para as «altas esferas»

 

Indubitavelmente, a mensagem (Cá está, «muita atenção ao desenho ou fotografia…») deixada pelo rapinante da maleta foi um indício esclarecedor pera o inspector Fidalgo, porquanto este «deitou uma vista de olhos ao papel e ao seu humor e depois de uma leve hesitação revelou: – Já sei quem foi o ladrão!...»

Ora, perante esta afirmação, não nos restam dúvidas que aquele papel – ou melhor: a maneira como ele estava escrito – forneceu ao inspector os elementos necessários para tal conclusão e, sendo assim, só ela (mensagem) deverá ser considerada. Vejamos, pois, aquilo que o «bilhetinho» nos poderá revelar…

 

Ora bem, chegado a este ponto, parece-me oportuno rever os considerandos atrás descritos. É que, em meu entender, é aqui precisamente que «entra» a tal «coisa» ao solucionista ser «obrigado a interpretar a ideia do produtor…», de «nos meter dentro da sua maneira de pensar…»

Nesta conformidade, julgo poder afirmar que a ideia do produtor será a de fazer incidir as atenções dos solucionistas para o francês, já que vários pormenores o apontam como «escrevinhador» do tal «bilhetinho». Atentemos nisto:

1.º – Acaso um inglês utilizaria a palavra «camarada»? Sou pouco evoluído politicamente falando, mas julgo que o termo não será vulgarmente utilizado num país onde ainda existem reis, nem tão pouco pelos seus súbditos…

2.º – O algarismo 7 700 000 marcos») está traçado, pormenor que apenas se utiliza nos países latinos.

3.° – A palavra «levo-lhos» encontra-se desmembrada, isto é, em linhas diferentes, facto que não se verifica na escrita de um inglês, porquanto, ou a palavra caberia toda no espaço de que dispunha naquela linha e ele escrevia-a ou se antevesse que não cabia passava para a linha a seguir. (Como reforço deste ponto, indico o efectuado na linha anterior, onde a palavra «guardar» passa para a linha seguinte…)

4.º – Um inglês, mesmo muito bem-humorado, despedir-se-ia com «um abraço»? Não me parece; e até suponho que o seu tradicional humor negro seria mais definido através de um «afectuosamente»

Posto tudo isto, creio estar apto a responder aos quesitos postos. Assim:

– O ladrão foi o francês.

2 – O inspector concluiu que a mensagem não teria sido escrita pelo inglês. Logo…

 

No entanto… Céus, no entanto, a minha solução não termina aqui! Há algo mais que não quero deixar de expor… E que «talqualmente» como a mensagem «acusa» o francês também o poderá inocentar…

…Pois não poderia ser o inglês a escrever a mensagem e, propositadamente, «semear» aquelas «anomalias» impróprias de um inglês, precisamente para «tramar» o francês?!... Claro que podia; pelo menos não vislumbramos nada que nos prove que não poderia ser assim…

…Antes pelo contrário! Suponho até existirem indícios de que o bilhete teria sido escrito por um inglês. É o caso do «o» inicial da segunda linha, que tinha lugar no final da primeira, e do já referido «guardar» que, julgo, caberia na linha anterior, deixarem antever que o «escrevinhador» não se preocupou em fazer margem à direita, característica típica dos ingleses, em contraste flagrante com os latinos…

Se eu conhecesse bem o L. P. – «policiariamente» falando, claro está – isto é, se conhecesse «as suas anteriores produções» e a sua maneira de raciocinar (não esquecer que acompanho a secção apenas a partir do n° 100!...) iria mais longe… Diria até que a última hipótese que aventei é aquela que será perfilhada pelo L. P. Será?...

Porém, também aqui se poderá argumentar que o bilhete poderia ser escrito pelo francês, com o «estilo» inglês.

 

Como nota final, dois apontamentos:

1.° – «O alemão era banqueiro, e não confiando em nenhum dos seus empregados, nem em ninguém dos seus colaboradores…». Não confiava em ninguém, mas confiou naqueles companheiros ocasionais…. O que faz a bebida!...

2.º – «O outro passageiro havia abandonado a composição minutos antes, numa das estações». Portanto, o ladrão foi o último a sair de junto do alemão… Verdade insofismável, não acha?... Ah, ah, ah…

 

Solução de Dr. Aranha

1 – O francês.

2 – Os ingleses não cortam o número 7, escrevem-no assim: 7.

 

Em princípio, como solução, bastaria. Só que L. P. cometeu algumas falhas, e como gosta de chamar a atenção dos autores também eu quero chamar-lhe a atenção para o seguinte:

1) O texto está «escrito em português». Isto representa um conhecimento desta língua por parte de qualquer deles. Se um deles a não conhecesse, era desonestidade do autor. Então…

2) Também o inglês conhece essa língua. Saberia então que nós, os latinos, cortamos o 7. Tê-lo-ia feito, portanto.

3) Por que razão, na 4.° linha, há um espaço à direita, em branco? Cabia perfeitamente «guar-» passando o «dar» para a outra linha.

Ora aqui, quanto a mim, reside um dos maiores erros do autor. Deve desconhecer artes gráficas. Quando enviamos um texto à tipografia e ordenamos: «faça bloco com alinhamento à inglesa», isto significa que não se cortam palavras. Mesmo que a margem direita fique aos altos e baixos, não interessa. É notar as cartas comerciais inglesas e francesas. Enquanto que estes, tal como nós, procuram que as cartas fiquem com a margem direita alinhada, cortando mesmo as palavras, os ingleses não o fazem, para não partir as ditas. E esta, amigo L. P.? Como se vai desenvencilhar desta?

Acredito que o inspector Fidalgo, desconheça isso, embora conheça o caso do número 7. E se conhecesse? Como era? Se os elementos apontam para ambos os lados?

Diga de sua justiça, que será bem recebido.

© DANIEL FALCÃO