Autor Data 7 de Dezembro de 1978 Secção Mistério... Policiário [195] Competição Torneio
“4 Estações 78" | Mini C – Verão Problema nº 6 Publicação Mundo de Aventuras [271] |
Solução de: DUAS MORTES EM ALGÉS L. P. Caro
colega: Respondo,
hoje, à sua carta, conforme me pediu. 1
– Sinceramente, o seu chefe não tem razão. Há mais um implicado no caso: o
Armando. 2
– O José, não deve ter entrado com intenções de matar o pai. E isto, porque
sabendo o pai armado, o mais normal seria ter-se chegado junto dele,
matando-o quando estivesse sentado ou de costas. Devia levar a pistola no
bolso das calças. Portanto, devem ter discutido, e em exaltação, o José deve
ter disparado. O inverso, é totalmente impossível,
visto que o roupão do pai estava totalmente abotoado e não tinha bolsos
externos, onde pudesse esconder a arma. Não tinha pois possibilidade de a
tirar do coldre. Aqui, entra o Armando em acção.
Porquê o Armando e não outro qualquer? Pois bem: a)
O sangue em forma de foice, ou meia lua (quando em
face de quarto minguante), significa, antes do mais, que o corpo foi rodado
de 180 graus para a esquerda. Exclui-se a hipótese de José se ter arrastado,
pois, se efectivamente fosse atingido pelos tiros
do pai, apenas teria interesse em se arrastar em direcção
da porta. O risco de sangue, seria rectilíneo. Mas, porquê o Armando? Vejamos: b)
Por experiências feitas, cheguei à conclusão que a tendência natural e
infalível de uma pessoa deslocar qualquer peso que exceda a sua capacidade de
elevação, é de o fazer na direcção do seu melhor
braço, isto é da sua esquerda se for esquerdino, ou da sua direita se for
direito. Por outras palavras, a tendência é sempre, mas sempre, a de se virar
para o lado em que está a cabeça da pessoa a transportar, e é sempre com o
braço oposto ao situado mais próximo do corpo a arrastar. Logo, como o corpo
estava de cabeça dirigida em direcção à secretária,
teve de ser o Armando, que colocando-se do lado esquerdo do corpo, o rodou
com a sua mão esquerda. Para provar a veracidade deste facto, experimente,
por exemplo, com uma estante de livros: 1
– Experimente, virado para um dos lados, pegar com a mão direita uma das
prateleiras, como se a fosse arrastar; 2
– Experimente o mesmo, mas virado agora, para o outro lado. Terá,
assim, a comprovação do atrás dito. Irrefutável! O autor do crime, da morte
do José, tem de ser o Armando. Mas,
há ainda uma outra pista que prova a existência de dois crimes separados,
além da já citada do roupão. Trata-se da circunstância de o Manuel ter a mão
pousada como uma aranha sobre a pistola, isto é com os dedos abertas! Mesmo
que o Manuel pudesse tirar a pistola do coldre (o que vimos ser impossível) e
disparasse (o que o médico diz ser quase impossível), então, seria provável
que após esse esforço, desmaiasse (no mínimo) e por isso cerrasse os dedos em
volta da coronha. Eis,
agora, caro colega, um resumo do que terá sido o «inferno» do escritório: 1
– José, dispara sobre o pai, matando-o; 2
– Armando aproveita a hesitação do irmão (há sempre uma hesitação quando o
assassino não premeditado acaba de desferir o golpe fatal) e desfere o seu golpe,
dois tiros nas costas do irmão; 3
– Armando tem de tentar ilibar-se de tudo. Assim, verifica (certamente com
agrado), que os dois projécteis não saem do corpo,
não podendo, portanto, denunciar a trajectória. 4
– Pensa, então, em rodar o seu irmão de 180 graus. Mas, não repara no rasto
de sangue. 5
– Conhecedor dos problemas do pai em relação à pistola, resolve pôr a sua
debaixo da mão do pai. Certamente levanta o pai, segura-o com o corpo,
desabotoa o roupão com a sua única mão sã, retira a pistola do pai, volta a
abotoar o roupão, no intuito de deixar tudo como tinha encontrado. E cometeu
mais um erro… 6
– Vai para o seu quarto, encostando a porta do escritório e, pelo meio,
ter-se-á desfeito da pistola. E
é isto, caro colega. Um crime quase perfeito. Só que a perfeição é sempre
atraiçoada. Não há crimes perfeitos! Um
grande abraço. Sempre à sua disposição, este seu amigo L.P. (Algés) |
© DANIEL FALCÃO |
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