Autor

L. S.

 

Data

24 de Outubro de 1993

 

Secção

Policiário [121]

 

Competição

Supertorneio Policiário 1993

Prova nº 8

 

Publicação

Público

 

 

MAS QUE GRANDES MARIOLAS!

L. S.

 

... A cabeça de Vieira estava numa confusão enorme! Bem pretendia ele explicar ao colega, o guarda Bernardes, tudo o que ouvira, mas nada… Fora tanta coisa ao mesmo tempo que, decididamente, detalhar com precisão quem era, o que fazia, de onde era, a sua nacionalidade e o veículo habitualmente conduzido, antes de ser preso, apresentava-se-lhe um complexo problema policiário.

– Oh, Bernardes! Tu nem imaginas do que aquelas “pintas” foram capazes para o nosso diretor os mandar encerrar na mesma cela… A sua decisão baseou-se no facto de virem acusados de crimes com pena maior. Como sabes, são os que mais “brado” dão lá fora… “Víboras” deste quilate não se deviam misturar com os presos em delitos chamados de “lana caprina”!

– Vieira! Ele tem razão, evidentemente. Se se juntassem a esses, “o contágio” torná-los-ia bem piores! E a experiência bem nos diz… De qualquer forma, ele é que tem os livros. Mas, já que o mencionaste, diz lá o que ouviste para eu fazer um juízo…

– Bom… Os “gajos” são cinco facínoras de alto calibre! Todos têm nacionalidades diferentes, embora residam em Portugal há longos anos. À excepção de um que é nacional, todos os outros falam bem o português e, impressionante!, sem quase nenhum sotaque!... Os seus nomes de “guerra” não me foi difícil de fixar. Tratam-se por “Siraz”, “Tony”, “Aguilar”, “Loio” e “Ferry”. Quanto ao amigo, é-me impossível particularizar. Só sei que se conheciam antes de “irem dentro”!...

(A) O inverno apertava a sério a cidade de Coimbra. Na penitenciária tiritava-se… Aqueles reclusos, excepcionalmente, tinham sido contemplados com uma braseira onde aqueciam as mãos e os pés. Vieira, escondido num canto escuro para cá das grades, notou o Tony a chamar a atenção do arrombador de cofres e do chileno. De seguida, apontando para o de Vila Nova, disse: “Reparem vocês! Antes de me ‘filarem’, no Volvo do Ferry (aquilo é que é uma máquina!), fiz uma viagem ao Algarve em sete horas e regressei a Coimbra com meio quilo de ‘heróica’. Vá lá saber que a ‘Judite’ já andava sobre mim. O espanhol aconselhara-me a ter cuidado, mas o quê! Nunca acreditei!...

(B) O Siraz, sentado em frente ao marroquino e à esquerda do português de Vale de Neira, virou-se para o dono do Opel e acrescentou à conversa: “… Mais chato do que o sucedido comigo é bem difícil… Vinha eu na ‘ganga da maviosa’ já com a ‘ourina’ nas ‘unhas’, quando me surge o dono da loja aos tiros. Se não me agacho, rapaz, já não via mais o Sobral!”

(C) O gatuno de automóveis, que ouvia atentamente, deu um assobio bem modulado. Esse assobio retiniu justamente na cara do Loio, seu parceiro à esquerda, e era significativo. “Oh, rapaziada! Isso faz-me lembrar daquela vez, íamos no Fiat Uno aqui do nosso homem da ‘heróica’ e tentávamos ‘fanar’ aquele Polo G40, ali à saída de Santa Comba… O que nos valeu, o Aguilar que o diga, foi a sua presença de espírito para pôr o carro em marcha. Não é que nos aparece a ‘bófia’ sem a pressentirmos!?... E eram quatro da manhã!”

(D) O assaltante à mão armada escutou tudo aquilo com um sorriso meio patético. O seu polegar da mão direita via-se apontado para cima, bem firme.

(E) Nessa altura, os dois sobralenses que rodeavam o Tony, de frente para o marroquino e o Ferry, trocaram um olhar rápido e cúmplice ao reparar que o de Santa Comba ficara de boca aberta com a estória… “Não me digam que foram vocês!”, lançou ele, admirado. “Vejam só que, nesse dia, de manhãzinha, a ‘bófia’ bateu-me à porta e, imagino, com os meus antecedentes, pretendia atirar-me culpas da tentativa do G40… Eu? Para quê, se o meu Tempra me servia muito bem, e, aqui para nós, essa também não é a minha ‘área’, como sabem. Longe estava eu em imaginar…”

(F) Ferry, que parecia o chefe, geralmente concentrava em si as atenções, tocou no cotovelo do chileno, a seu lado, e, meio a brincar, foi dizendo: “Olha lá! Não era o teu Ford que estava ‘artilhado’ com aquele motor de 1.9cc? Para que raio querias tu a máquina com uma ‘gana’ daquelas?"

(G) O chileno, homem decidido, hábil e com muita sorte na vida, explicou-se: “Antes de me deitarem a ‘luva’, fiquem a saber que tinha um ‘trabalho’ encomendado da mais alta importância! Fugia da minha ‘área’, bem sei, mas o pagamento numa conta ‘calada’ na Suíça compensaria, de longe, o risco… O Ford que tu viste ‘artilhado’ iria ser utilizado nesse esquema!...” Nessa altura, o seu tom de voz soou sibilino, frio e cauteloso…

(H) – O silêncio que se seguiu, Bernardes, fez-me sentir um arrepio pela espinha acima – comentava o guarda Vieira. O assunto, continuou, deveria ser tão grave que os tipos passaram a “bichanar” e nada se distinguia do que diziam. Até que o francês, sentado entre o Loio e o Siraz, rematou, dando um salto no banco, num berro surdo: “E…, ainda não rasgaste o papel?...” Que papel seria aquele, perguntas-me tu Bernardes. Nem eu sei, asseguro-te! Consegui deitar-lhe as mãos nesta manhã, ao pequeno-almoço; aproveitei a sua ausência da cela, fiz-lhes uma revista sumária às coisas que lá têm e localizei-o… Todo amarrotado, mas ainda intacto… Parece-me ser esse… Só que, para mal dos meus pecados, está em código. Fiquei na mesma. Que será que ele diz?... (…)

Cortamos aqui a descrição das inquietações num dia da vida de um guarda prisional, deixando os nossos amigos com a mensagem codificada. Ei-la:

FRZNGNECERFVQRAGRERCHOXVPNGRENFHNBEQRZHZN – 41 letras

PBAGNFHVPNZVXUNBQBXNERFNFEVAQBPBAQRORGN – 39 letras

Descrevendo os passos que deu, esclareça os seguintes pontos:

– Nome, nacionalidade, automóvel, “especialidade” e local de residência de cada uma daquelas “pintas” e diga como estavam sentadas, entre elas.

– Descubra a mensagem, revele-a e mencione a identidade do seu possuidor.

– Bom apetite!

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO