Autor Data 16 de Julho de 1992 Secção Policiário [16] Publicação Público |
O INSPECTOR FIDALGO E A MORTE DO VELHO PADEIRO Luís Pessoa O velhote fazia parte do
folclore daquela terreola e daí que quase toda a gente tenha estado presente
no seu funeral. No fundo do cortejo caminhava um indivíduo que ninguém
conhecia e que ali estava para investigar a morte triste do padeiro. Suspeitava-se e era
afirmado em surdina que havia sido o sobrinho ou o filho, ou os dois que
tinham feito o trabalhinho ao velho, mas tudo não passava de conjecturas. O velho era um homem de hábitos
e tinha a mania pouco saudável de fechar janelas e portas enquanto fazia o
pão num forno que funcionava a gás. Foi o gás que o matou. O forno ter-se-á
apagado e o gás espalhou-se pelo compartimento, terminando com a vida do
velho. Mas dizia-se que tinha
havido ajudinha… Que o forno não se apagava assim… Que o sobrinho era um
malandro de tal ordem que até ao velho batia… Que o filho era um jogador de
batota e que todo o dinheiro que apanhava ficava no jogo… Que o velho tinha
um desgosto terrível e estava farto da vida… Dizia-se! O inspector Fidalgo foi
ouvindo aqui e ali, foi alinhavando as suas ideias… Certo, certo, apenas que
o velho morrera intoxicado pelo gás. O sobrinho: Quero lá saber
do velho… Era um grande chato mas não tenho nada a ver com a morte dele… Já o
tinham avisado para ter cuidado com o gás, mas era teimoso como um burro e
estava-se mesmo a ver que tinha de acontecer uma coisa destas… Que coisa? Um
acidente, pois então?... Não, nunca bati ao meu tio e muitas vezes fui eu
quem o acordou às tantas da matina, quando se deixava adormecer no banco onde
morreu agora… O filho: Não quero saber de
nada disso… O que interessa é que está morto e enterrado e não chateia mais
ninguém, principalmente a mim… Estive fora quase toda a noite, no princípio
num baile na aldeia de cima e depois andei a passear pelos campos, sozinho, a
apreciar a noite calma… Sim, fui eu que descobri o velho morto, mas isso não
quer dizer que o tenha morto, não acha?... Só sei que eram quase cinco da
manhã quando entrei em casa. Não dei conta de nada de especial porque estava
tudo às escuras… Puxei de um último cigarro e foi quando acendi o isqueiro que reparei que o
meu pai estava deitado no chão e que cheirava a gás que mal se respirava…
Corri até à janela e abri-a para arejar e fiz o mesmo com a porta… mas para o
pai era tarde… Não sei se ele se matou ou se foi acidente, o que sei é que
morreu e sou o herdeiro dos seus bens… O inspector fechou a sua
revolta num cerrar de pálpebras e recapitulou lentamente em pensamento… A – Apenas pode ter sido
acidente. B – Foi o velho que se
suicidou por causa do ambiente que tinha em casa. C – Foi o sobrinho que
estava farto de aturar o velho e de o acordar a meio da noite. D – Foi o filho para herdar
os bens. |
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© DANIEL FALCÃO |
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