Autor

Luís Pessoa

 

Data

29 de Julho de 1992

 

Secção

Policiário [29]

 

Publicação

Público

 

 

O INSPECTOR FIDALGO E O EX-PRESIDIÁRIO

Luís Pessoa

 

Uma das maiores alegrias que o inspector Fidalgo pode ter é saber que um dos presos que ajudou a capturar se encontra já em liberdade, preparado para regressar à vida, porque também ele tem a consciência de que a prisão não é a melhor forma de recuperar um indivíduo.

Assim ficou, mais uma vez, quando soube que o “Caroços” tinha sido posto em liberdade. E, logo que se tornou possível, foi visitá-lo no local que indicou como sendo a sua futura residência. Não deixava de ser curioso, dois homens que estavam em campos diferentes encontrar-se…

A casa era velha, virada a nascente, banhada pelo sol na sua frontaria toda a manhã e nas traseiras durante toda a tarde. E que sol, que havia vários dias que o calor derretia autenticamente toda a gente.

Foi ao chegar que o inspector soube que, na véspera, ocorrera um roubo e, claro está, todos apontavam o dedo acusador para o “Caroços”, que já se sabia que era muito bom ter por perto um ex-presidiário para o acusar em momentos destes.

Interrogado pelo inspector, o “Caroços”, transpirando abundantemente pela sua pele branquinha de quem desde há muito está “engaiolado”, apenas esboçou uma ténue defesa, alegando que todos estavam contra ele por ser um ex-presidiário, mas a realidade era que, na véspera, estivera a gozar as delícias da liberdade e, por isso, apanhara uma valente bebedeira ainda da parte da manhã e caíra a dormir profundamente, com o peito nu nas traseiras da casa, ali junto à parede, acordando apenas quando a noite já ia alta. Não sabia se alguém reparara nele, mas a verdade é que, com o sol a bater ali na parte detrás do prédio, ninguém se atrevia a pôr sequer a cabeça de fora da janela. Enfim, comemorara à sua maneira o feliz acontecimento.

O inspector Fidalgo sentou-se na cadeira, bem em frente do “Caroços”, transpirando abundantemente, roído de inveja pelo seu interlocutor estar de tronco nu, apesar de transpirar como ele, vendo-se gotas de suor a escorrerem pela pele leitosa:

– Estás a precisar de ir à praia…

 

A – O “Caroços” é totalmente alheio ao roubo, nada havendo que o relacione com ele.

B – O “Caroços” mentiu quando disse que se embriagou durante a tarde do dia anterior.

C – O ex-presidiário esteve realmente ao sol toda a tarde anterior, mas é falso que se tenha embebedado.

D – O “Caroços” não esteve deitado no dia anterior nas traseiras do prédio, pelo que será suspeito do roubo cometido.

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO