Autor Data 28 de Fevereiro de 1993 Secção Policiário [87] Competição Prova nº 2 – Problema nº 3 Publicação Público |
HOJE, O INSPECTOR FIDALGO EM ALGÉS Luís Pessoa Vindo da cidade do Porto na
carruagem de primeira classe do mais luxuoso comboio que liga aquela cidade a
Lisboa, muito feliz da vida por viajar a convite da administração da
companhia, pela colaboração na resolução de um caso menor, daqueles que nem
merecem ser relatados, o Inspector Fidalgo abriu o PÚBLICO
que, calmamente, foi desfolhando, num misto de sonolência e nervoso miudinho,
porque queria confirmar a saída da secção Policiário… Foi então que, como que
impulsionado por uma mola, se ergueu da poltrona ao ler o título que o dava
como presente em Algés nesse mesmo dia, ou seja, hoje mesmo!... Consultou o relógio e foi
um homem “em pulgas” que saiu a correr da estação de Santa Apolónia, quase
gritando ao taxista que o conduzisse imediatamente a Algés. Aí chegado, depois de uma
correria louca pela cidade preguiçando debaixo de um sol quase escaldante,
logo procurou a Esplanada Caravela, no Jardim de Algés, onde, a partir das
10h30 a notícia dava garantias de haver gente à espera… Mas se não estivesse
ninguém, porque a hora ia adiantada, podia ir directamente
ao Restaurante Trinitá, na Rua António Granjo, por
volta das 13. Não foi preciso… Estão a
ver aquela senhora “ligada à electricidade”, dois
palmos de gente com milhões de volts de energia, ali mesmo ao canto da sala?
É a Pal, a organizadora, que se desdobra para que
tudo corra, como é habitual nas suas organizações, ou seja, optimamente! E aquele ali, de barbas brancas é o Sete de
Espadas e ali está o Constantino, o Gráfico, o F. Perlico,
o M. Lima, o Jartur, o… Já o almoço ia adiantado,
com muita conversa e animação, quando toda a gente parou bruscamente de
falar, dirigindo os olhares incrédulos para a porta do restaurante, por onde
acabara de entrar um vulto embrulhado no que parecia ser um lençol, apontando
uma pistola e gritando: “Nem um movimento… Isto é um assalto!”. Toda a gente ficou imóvel,
notando-se, apenas, aqui e ali, sorrisos comprometidos, indiciando que se
tratava de uma brincadeira da organização, que a palidez da Pal desmentia completamente… “Boa! Excelente ideia”,
gritou alguém manifestamente agradado com o espectáculo,
momentos antes de ser atingido no rosto com a arma do assaltante, prova
manifesta que não brincava… O Inspector
Fidalgo estava tenso, com uma atenção redobrada, para ver no que paravam as
modas… Um a um, todos os convivas foram largando os seus valores, a que nem
escaparam alianças de ouro, com alguns a confiarem, ainda, que se tratasse de
uma brincadeira. O assaltante era homem,
mediria um metro e oitenta e cinco, pesaria oitenta e tal quilos, calçava
sapatos de lona, brancos, e nada se via, porque usava um lençol metido na
cabeça e quase até aos pés. Recolheu tudo o que quis e,
sempre ameaçando, recuou para a porta, não sem antes avisar que dispararia
sobre o primeiro que ousasse pôr a cabeça fora da porta. Assim que ele desapareceu
no canto esquerdo da porta da rua, o Inspector
Fidalgo saltou do seu lugar e correu para a rua, não sem antes ouvir o aviso
do dono do restaurante alertando para não correr porque estava o cão na rua,
à solta, que atacava qualquer vulto que visse… a correr. Abriu a porta, devagar e
com muitas precauções espreitou para o seu lado esquerdo. Lá estava o cão,
monstruoso, muito pacífico e incapaz de fazer mal a uma mosca, a menos que…
Visse alguém a correr! Manias, pensou. Junto dele,
um rapazola com aspecto coincidente com o do
assaltante, fazia-lhe festas. De dentro do restaurante
foram saindo policiaristas que, num ápice,
apanharam nas imediações e até ao fundo da rua três outros suspeitos, cuja
descrição coincidia: o António, o Manuel e o José. O António, apanhado no
fundo da rua, portanto a cerca de duzentos metros, afirmou que nada tinha a
ver com o roubo; estava a passear e não viu nada de anormal. O inspector vira-o ao fundo da rua quando espreitou, para
aí vinte segundos depois de o ladrão ter desaparecido na esquina da porta. O Manuel foi apanhado no
cruzamento, ao sair de sua casa, como o Inspector
Fidalgo vira ao sair do restaurante a mais de duzentos e cinquenta metros de
distância. Nunca tinha ouvido falar de policiarismo
nem sabia que tinha havido um assalto. Quando lhe falaram do lençol, riu-se
muito e perguntou se era como aquele que estava debaixo daquele carro ali…
Ali era mesmo em frente do restaurante, num local que se não via de dentro. O
assaltante desfizera-se logo do lençol… O José fartou-se de gozar e
disse-nos que descobríssemos quem era o culpado, uma vez que passávamos a
vida a escrever casos desses. Fora apanhado do lado direito da rua, portanto
do lado contrário àquele por onde o ladrão fugiu, mas começou a gozar,
parecendo saber mais do que dizia, ou seja, nada! Acabou por confessar que
vira um tipo a largar o lençol, mas não sabia quem era, porque via muito mal
ao longe e estava quase a cento e cinquenta metros da porta do restaurante… O que estava a fazer festas
ao cão, era um outro, o Artur, que logo disse não ter visto nada porque
estava muito entretido a brincar com o animal e só começou a tomar atenção
quando ouviu a algazarra dos convivas. Sobre o lençol que estava ali ao pé
dele, disse que não deu conta e como o vento que soprava, podia ter sido
arrastado, o que até era verdade. Do produto do roubo, nem
rasto e, a menos que estivesse no interior de qualquer carro nas imediações,
não se adivinhava local capaz de servir de abrigo, tal como à pistola… E
todos tinham a certeza que havia sido um deles, mas… Quase à uma, o Constantino
olhou para o Sete de Espadas e o Gráfico sorriu ao ver a Pal
descomprimir… A – Foi o Artur B – Foi o José C – Foi o Manuel D – Foi o António |
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© DANIEL FALCÃO |
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