Autor

Mabuse

 

Data

10 de Agosto de 1978

 

Secção

Mistério... Policiário [178]

 

Competição

Torneio “Sete de Espadas"

Problema nº 12

 

Publicação

Mundo de Aventuras [254]

 

 

Solução de:

TIRO NA NOITE

Mabuse

Solução apresentada por Aabam

1 – O inspector chegou à conclusão que aquela arma não disparara recentemente, porque verificou que não havia qualquer bala na câmara… o que aconteceria se a arma tivesse sido disparada, visto que após se realizar a ejecção da cápsula do cartucho deflagrado, a culatra ao voltar à sua posição normal faria a introdução de nova bala na câmara. E segundo, porque tendo aspirado profundamente a alma da arma verificou que esta não exalava o cheiro característico da cordite queimada da carga do cartucho nem o cheiro acre do fulminário de mercúrio do fulminante, que se notam sempre que um cartucho é deflagrado sendo, tanto num caso, como noutro, o cheiro muito activo logo após o tiro, mas que passa a um cheiro residual que permanece algum tempo. Ora, o suspeito foi apanhado alguns segundos depois do tiro, por conseguinte, se o tiro tivesse sido disparado por ele, com aquela arma, o cheiro ainda seria bastante activo.

A primeira verificação sem a segunda não teria um valor absoluto, porquanto o suspeito, sendo um conhecedor de armas como o inspector frisou, poderia ter disparado a arma, puxando o carregador da arma para fora de forma a deixar de haver apresentação de um cartucho em frente da culatra e assim ficariam seis cartuchos no carregador… Puxaria então a culatra atrás o que faria a ejecção da bala que teria entrado no câmara após o tiro e deixando ir a culatra à frente, esta não introduziria nenhuma bala na câmara… Depois, empurrando o carregador para a sua posição, a arma ficaria tal como o inspector a encontrou…

Eu próprio experimentei as possibilidades de realizar as operações mencionadas correndo e virando uma esquina de um edifício, claro que não foi em louca correria porquanto os meus 100 quilitos não me permitem essas divagações, mas digamos que ia bastante depressa, e demorei a realizar as operações descritas uns quatro segundos.

Das duas verificações tira-se portanto a conclusão que realmente aquela arma não disparara recentemente.

2 – A frase «parabéns, você percebe de armas» tem de estar relacionada com a arma tal como é descrita e o inspector verificou, dado que «tanto da descrição como da verificação não se depreender que a arma fosse especial ou tivesse algo de especial» e não podermos admitir que o inspector dava os parabéns ao suspeito por este ter a arma muito bem limpa e oleada…

A arma era uma Parabellum, 9 mm m/43. Ora, identificada assim, não é mais que uma arma vulgar das usadas nas Forças Armadas e Militarizadas.

O inspector pegou-lhe na coronha com dois dedos da mão esquerda e introduziu o indicador direito no guarda-mato, posto o que empunhou a arma com a mão direita, tirou o carregador, verificou que o mesmo tinha seis cartuchos e em seguida puxou a culatra atrás para ver se havia bala na câmara, nada disto mostra que a arma tivesse o que fosse de especial… Então, qual o porquê desta frase?

A única coisa que ressalta desta descrição é o carregador ter só seis cartuchos, quando a sua carga normal é de oito cartuchos e então, sim, daqui pode tirar-se a conclusão que o suspeito, tendo só seis cartuchos num carregador percebia de armas… Porquê? Porque mantendo oito cartuchos num carregador a mola elevadora acaba por ficar pasmado e assim a apresentação dos cartuchos para introdução na câmara pode ser deficiente o que pode motivar o encravamento da arma. Mas usando somente seis cartuchos, a mola elevadora não fica tão oprimida e portanto tem menos possibilidades de ficar pasmada. Ora só alguém com bastante conhecimento de armas, sabe isso e procede assim, porque, normalmente, os possuidores de armas de carregador, usam-nas com os carregadores completos na ideia de quanto mais balas melhor… Claro que este expediente deve ser usado para quem tem armas de defesa e faz pouco uso delas, mas mesmo a nível militar usa-se não carregar totalmente os carregadores.

O «outro delito» pelo qual o suspeito teria de responder, era por ter em seu poder uma arma de calibre 9 mm, o qual é considerado «calibre de guerra» e não pode ser usado como arma de defesa. O calibre de armas de defesa, tipo pistolas ou revólveres, vai só até 7,65 mm.

Transcreve-se o Decreto-Lei n.o 207/A-75 de Abril de 1975, na parte que interessa:

«Artigo 1.o – 1. Consideram-se armas de defesa:

a) As pistolas até calibre 7,65 mm, inclusive, cujo cano não exceda 10 cm;

b) As pistolas até calibre 6,35 mm, inclusive, cujo cano não exceda 8 cm;

c) Os revólveres de calibre não superior a 7,65 mm (0,32”), cujo cano não exceda 10 cm;

d) Os revólveres de calibre não superior a 9 mm (0,38”), cujo cano não exceda 5 cm.

2. Apenas para as armas referidas nas alíneas b) e c) poderão, para fins de defesa, ser concedidas licenças de uso e porte aos maiores de 21 anos que se encontrem em pleno uso de todos os direitos de cidadania, e que mostrem carecer da mesma por razões profissionais ou por circunstâncias imperiosas de defesa pessoal.

3. Para as restantes armas de defesa poderá o Comando-Geral da Polícia de Segurança Pública autorizar o seu uso e porte às entidades designadas na lei, quer a arma seja fornecida pelo Estado, quer seja propriedade do próprio.

4. O uso e porte de arma por elementos das forças armadas e militarizadas será objecto de diploma especial.

Artigo 2.o – 1. É proibido o uso, porte ou simples detenção, por parte de elementos estranhos às forças armadas ou militarizadas, de armamento que por suas características, equipe ou possa ser usado como material de guerra, próprio dessas forças.

2. As armas classificadas como material de guerra, e em especial as automáticas que façam parte de colecções autorizados devem, depois de manifestadas e registadas, manter-se guardadas em condições de segurança que garantam a sua inviolabilidade, e em caso algum poderão ser mantidas munições para seu uso.»

© DANIEL FALCÃO