Autor

Magno

 

Data

2 de Julho de 1993

 

Secção

O Detective - Zona A-Team [185]

 

Publicação

Jornal de Almada

 

 

A FAMÍLIA JEREMIAS E O PASSEIO AO CC BELÉM

Magno

 

No Centro Cultural de Belém foi inaugurada no último fim-de-semana uma grande exposição de pintura, que reune obras dos mais famosos mestres. Para a sua montagem, foram convidados os mais célebres especialistas neste campo.

O sr. António Jeremias, caixeiro na «baixa», de 32 anos e estatura normal, convenceu a mulher, D. Maria, que rondava a mesma idade, baixota e doméstica, a irem nessa altura ao CC Belém, pois já tinha ouvido dizer que nas redondezas fora instalada uma feira popular. E, já agora, levavam a filha, Carla, de 12 anos, anã, que frequentava a escola secundária do bairro.

Depois do almoço, a família Jeremias abalou para os lados dos Jerónimos entusiasmada com a ideia de passarem uma tarde agradável, junto de um dos mais famosos pilares da arquitectura europeia contemporânea. Quando ali chegou foi a decepção total. Afinal, não havia feira, só um carro ou outro para venda de pipocas e gelados.

O caixeiro, desanimado, queria regressar, mas a mulher – que só podia passear no fim de semana – virou-lhe o juízo e arrastou-o e à filha para o Centro, pois tivera conhecimento que tinham gasto milhões e milhões a construir aquilo, pelo que era natural que lá houvesse alguma coisa digna do se ver.

E assim, foi, mas o único sector aberto ao público era onde estava patente a exposição. Mesmo assim lá entraram, muito embora não se interessassem muito por este género artístico. Havia pouca gente… e a medo lá foram espreitar.

À entrada do salão da esquerda e ao observar as obras expostas na parede à direita, todas à mesma altura do tecto, a D. Maria, que se encontrava a poucos metros de distância, ao apreciar as lindas molduras ao alto virou-se para o marido e observou: – Olha António. Se reparares bem, a parte de cima destes quadros está a inclinar-se para o lado esquerdo, até ao fundo! Vê bem querido, mas que coisa!?

O sr Jeremias, não ligou ao desabafo da mulher, enquanto a filha ruminava para consigo a razão do comentário da mãe. Saíram logo do salão e passaram ao da direita, pouco passando além da porta. Aí Carla, ao olhar para os quadros suspensos na parede da esquerda, com a mesma disposição, segredou, temerosa de alguma repreensão: – Olhem! Nestes, a parte inferior da moldura está a subir para a direita. Como é possível?! A mamã enganou-se – argumentou a rapariga, esperando uma resposta dos pais, mas ambos fizeram ouvidos de mercador.

O pai Jeremias já estava a ficar incomodado com os comentários das mulheres. – Que raio de coisas vieram elas descobrir aqui!» pensava ele, desejoso de se pôr a andar dali para fora. E assim fez. Aprontavam-se para deixar o Centro quando, ao passar a meio de um dos corredores, o sr. António reparou que uma porta dava acesso a outra sala de exposição. Por curiosidade, abeirou-se. Aí à entrada e olhando para a parede em frente, ao fundo, não conseguiu aguentar por mais tempo a sua indisposição pelas observações das suas companheiras e exclamou! – Olhem bem! Pelo menos aqueles estão todos direitos, na horizontal! Não se inclinam, nem sobem!

E, abruptamente, deu meia volta e com a família deixou o CCB a caminho de casa, numa discussão acalorada, não só devido à inexistência da feira, onde poderiam ter passado um bom bocado da tarde, como pela fastidiosa visita à exposição e às críticas tecidas por cada um.

Quem tinha ou não razão e porquê?

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO