Autor Data 11 de Dezembro de 2016 Secção Policiário [1323] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2016 Prova nº 10 (Parte I) Publicação Público |
Solução de: COMO NA LENDA DE PILARZITO Mário Campino Esgotei todos os apontamentos do
caderninho de capa negra, que durante anos registei sobre o Avô Palaló. Assim, este será o último enigma consagrado ao
personagem, por mim, seu neto, relembrado. Aproveito para dedicar o presente
trabalho a todos os policiaristas, em especial,
perdoem ao ZÉ, um admirador do Avô e que instigou, tenazmente, à
continuidade. É
óbvio que o cabo André não podia agir sem uma declaração formal resultante da
autópsia, cujo relatório chegou cindo dias após os factos. Crime, em
resultado de asfixia. De facto, a face congestionada de cor azulada, lábios e
nariz macerados, eram sintomáticos da sufocação, uma vez que o médico, no
local, recusara a morte por submersão, e as equimoses para a hipótese de
queda contra a pedra de lavar roupa não eram bastantes para ocasionar a
morte; aliás teriam que ser duas quedas, de frente (para o rosto) e de costas
(para a nuca). Ora a sufocação, caracterizada pela suspensão dos órgãos
respiratórios, resulta de estrangulamento, esganação, enforcamento, deixam
marcas identificativas próprias, a olho nú, tal
como a submersão, que o médico registou ao tirar-se o corpo da água. Numa
remota hipótese de as equimoses do rosto terem sido produzidas pela areia do
fundo do riacho, lembremos que a cabeça da vítima não chegava ao fundo. Resta
a sufocação por asfixia, em vista dos indícios externos já referenciados e
dos internos que terão sido detectados na autópsia,
estando fora de causa a sufocação por acidente ou doença, não referidas. A
pergunta que se impunha seguidamente era: quem praticou o crime e como? O
cabo André, bem alicerçado pelo Avô Palaló, não
tinha dúvidas. O primeiro elemento de prova, para esconder "o
como?", é o pequeno pedaço de unha partida encontrado na almofada da
cadeira. Depois de uma pancada com o toco de madeira, na nuca, que atordoou a
vítima, a tentativa consumada de sufocação, que a vítima ainda tentou evitar
puxando a almofada onde partiu a unha, fraca tentativa contra a força bruta
da assassina. Sim, assassina, trata-se de uma mulher grande, uma “bisarma”,
no dizer do povo. Sem apelo nem agravo, existem três provas contra “Zabel”,
mais concretamente Isabel. 1ª
– O rasto de pés grandes, mais profundo nos calcanhares, identificou a autora
e transporte do corpo para o riacho (para simular suicídio, por afogamento,
talvez) de nada valendo a tentativa de escondê-lo com os sapatos da morta e o
carrinho de mão para indiciar que o transporte do corpo tinha sido efectuado por uma pessoa sem poder físico para tal,
possivelmente o “meia-tigela” do “Barato-Fino”. 2ª
– A sua confissão inadvertida: quando perguntada se matara Alda, a boca
fugiu-lhe para a verdade ao responder “na abafi”,
isto é, “abafei” (sufocar), uma vez que “afagui”
(afogar) que era o que parecia aos olhos de todos, ainda que os termos afogar
e abafar sejam sinónimos não era nem é habitual ou corrente usá-lo, entre o
povo, para designar afogamento. Só se usa o termo abafar no caso de
sufocação. Ora, ao negar ter abafado a morta, está a evidenciar ter
conhecimento de um acto que só o abafador conhecia,
por tê-lo praticado, uma vez que só o médico, o Avô Palaló
e o cabo André tinham essa suspeita, posteriormente confirmada pela autópsia. 3ª
– Requer um pouco de imaginação da parte do decifrador, tanta como o Avô Palaló admirou em Alda, a “imaginação e sangue-frio”
perante a morte. Alda sabia, ao abrir a porta e deparar com Isabel, a
“bisarma” e com as suas ameaças de morte, que não tinha hipóteses de escapar.
Ainda tentou entretê-la dispondo-se a “ler as cartas da sorte”, mas via morte
nos olhos da outra. Rasgou ao meio a carta da Tarot,
que representa a “papisa” e amassou a última parte na mão, que continha o
nome da sua assassina, ISA = ISABEL, a “Zabel” do povo… única esperança
suficiente e inteligente para que se entendesse a ligação
carta-nome-assassina. Última nota: Alda foi
enterrada no cemitério de Almeirim, com o dinheiro encontrado no colchão da
cama, sendo o restante entregue à “Sopa dos Pobres”. Ao enterro, não tendo
sido encontrados familiares, compareceram somente as autoridades, e o Avô Palaló. Alda conquistara, depois de morta, um admirador. |
© DANIEL FALCÃO |
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