Autor

Peter Pan

 

Data

27 de Outubro de 1977

 

Secção

Mistério... Policiário [137]

 

Competição

Torneio “4 Estações 77 | Torneio C – Verão

Prova nº 1

 

Publicação

Mundo de Aventuras [213]

 

 

Solução de:

O ÚLTIMO CONCERTO

Peter Pan

 

Respondendo à primeira parte da primeira pergunta direi que o enigmático criminoso é o subdirector, o sr. Lomebym… do grupo dos três que o inspector encontra, e onde está o criminoso, ilibamos desde logo um deles: o elemento da orquestra, executante de fagote… Não porque a sua posição dentro da orquestra seja relativamente afastada do piano… mas sim, porque, no texto afirmo «…que nos bastidores alguém conspirava»… quando a orquestra já estava toda em palco. Portanto, ele não podia ser… mas podia ser o sr. Robic?... Podia… Técnico de pianos, e dada a sua qualidade de afinador, estaria nas melhores condições de poder introduzir no instrumento um engenho explosivo. Fê-lo?... Nada nos seus actos ou declarações o prova. Muito pelo contrário… Ele até foi fazer uma «afinação» ante-concerto, que são todos «por harmonia» (conjunto de sons) e não como possa parecer, ou possam estar a pensar, o bater numa nota e mais noutra nota… Logo, e por isso mesmo, é que ele declara que «inadvertidamente tocou numa nota»… onde não havia harmonia e por isso ela, isolada, apareceu com um som estranhamente cheio…

É aqui, imediatamente, que o sr. Lomelym descarrila… Querendo agarrar-se àquela declaração, vai falar no bemol… Coisa de que ninguém tinha falado… Mas ele sabia que o que tinha causado a morte estava no bemol… visto que, a nota do crime «a 8.a nota do segundo andamento da pauta de piano na mão direita era um bemol – o mi»… Mas já vamos!

Respondendo assim à primeira e segunda partes da 1.a pergunta: Ilibámos dois possíveis suspeitos e indicámos o possível criminoso.

…Como se disse essa nota é o mi bemol… Há duas maneiras de lá chegar: saber ou não saber música. Se souber música, nada mais tem a fazer do que procurar o livro do 1.o Concerto para piano e orquestra, de Peter Tchaikovsky, em si bemol menor – e lá está, no 2.o andamento e na 8.a nota da mão direita do piano a tal nota mortal que é um mi bemol… É nesta altura que, pela primeira vez no Concerto, esta nota é tocadal!...

Agora, o solucionista não sabe música, nem percebe nada disso… Não se aflija… Puxe pela cabeça… Porque quando eu «falo» de solenidade pesarosa na boca do sr. Lomelym quando ele diz que a natureza do homem (pacífica) tornou-se contrária a si mesma (criminosa)… assim como o nome de Homem também!... Alto! «O nome de homem, também»… Também, o quê?... Contrário… Até parece uma charada ou enigma… Vejamos qual deles… Claro, só o de Lomebym… que ao contrário dá Mybemol… O «y» apenas está a servir para camuflar… Apliquem-lhe o «i» e temos a «nota assassina» ou como lhe queiram chamar… Mi-bemol…

 

Solução apresentada por Durandal

Durandal chegou ao escritório com o «Mundo de Aventuras» debaixo do braço.

Ifta, a sua secretária, trouxe-lhe o correio.

Durandal entregou-lhe o «Mundo de Aventuras»:

– Vá vendo… E começou a trabalhar.

Cinco horas da tarde.

Ifta entrou, com um semi-sorriso

– Pois… o criminoso é o sr. Robic.

E enquanto Durandal acendia o cachimbo, continuou:

– Não faz sentido que ao aperceber-se do som diferente de uma nota, não afinasse o piano antes do concerto… Por outro lado, a tecla estava preparada para explodir quando premida. Se não explodisse, é porque o sr. Robic não lhe tocou… Assim, foi ele quem armadilhou o piano.

Durandal maneou a cabeça…

– Não, Ifta. Não tem razão…

E ante o olhar inquiridor da sua secretária, prosseguiu:

– A afinação do piano, pré-concerto, é feita harmoniosamente. Ou seja, por um conjunto de notas ao mesmo tempo. Quer isto dizer que carregando-se numa só tecla se vê logo se um conjunto de notas está ou não afinado. Podia, pois, não ter carregado na tecla fatal. Quanto ao facto de ter deixado passar o som cheio sem proceder à afinação, o mesmo só por si não era suficiente para prejudicar o concerto e a harmonia cio piano…

Fez uma pausa, olhando de soslaio a sua secretária, e expelindo uma baforada de fumo, insistiu:

– O criminoso é o sr. Lomebym. Na verdade o sr. Robic refere-se ao som estranho de uma nota, sem referir qual, e o subdirector refere-se expressamente «aquele bemol». Como sabia que a nota fatal era um bemol? Porque o é! Só o saberia por ter sido ele a armadilhar o piano…

Ifta esboçou um sorriso.

– De acordo… E quanto ao outro e à nota fatal?...

Durandal explicou:

– O autor do problema elimina o elemento da orquestra quando diz «nos bastidores alguém conspirava»… Se já estão todos em palco, nos seus respectivos lugares, aguardando, claro que ele não podia ser… E quanto à nota, também o autor do problema nos dá logo uma pista… Com efeito, leia o nome do criminoso (ao contrário) do fim para o princípio…

Ifta soletrou:

– Mi bemol… É isso, escrevendo assim, Mybemol.

– Claro. Mas se analisarmos bem o problema, vemos que a nota fatal é a oitava da mão direita do 2.o andamento. E não a oitava da mão direita segundo a escala… pois nesta hipótese, tratando-se de uma peça em si bemol, a oitava nota seria o si bemol. Mas o problema refere-se claramente à oitava nota da mão direita do 2.o andamento. Ora, o 1.o andamento é «Allegro non tropo e molto maestoso»… A oitava deste é o si bemol. Adiante encontramos «Allegro cum spirit», em que a oitava nota seria também o si bemol. Mas este «allegro» é apenas uma alteração no andamento e não um andamento novo. O 2.o andamento, é o «Andantino sumplice», e neste, a oitava nota da mão direita é o mi bemol… Sendo a primeira vez que neste concerto para piano e orquestra, de Tchaikovsky, tal nota é tocada pelo piano…

Ifta suspirou…

– Mas viu e leu a música?

Durandal sorriu…

– Claro. Conjecturas são conjecturas. Mas não faço afirmações gratuitas… Não podia estar a inventar tudo aquilo… Nem eu, nem o autor do problema. E posto isto, venha daí… Vamos tomar um martini, para abrir o apetite para o jantar…

– Não me diga que me vai convidar para jantar?...

Durandal levantou-se.

– Não... Quero somente que bem digira o problema… e a sua solução.

E encaminhou-se para a porta de saída, seguido por Ifta, que ensaiava um sorriso ligeiramente contrafeito…

© DANIEL FALCÃO