Autor

Quaresma, Decifrador

 

Data

23 de Agosto de 2015

 

Secção

Policiário [1255]

 

Competição

Campeonato Nacional e Taça de Portugal – 2015

Prova nº 6 (Parte I)

 

Publicação

Público

 

 

Solução de:

ACONTECEU NA NOITE DE S. JOÃO

Quaresma, Decifrador

 

A conversa entre os dois jovens fez-me perceber que tinha “viajado” até uma noite de S. João no ano de 1961, ano em que deflagrou o conflito militar em Angola. O calendário que estava na parede confirmou isso mesmo.

Na realidade, a cidade do Porto já teve (ou tem) três santos padroeiros. Mas nenhum deles é o S. João. Nas palavras do historiador Germano Silva, o S. João é padroeiro da borga, do folguedo, mas não da cidade do Porto. Os três santos padroeiros da cidade do Porto são (ou foram) S. Vicente, S. Pantaleão e Nossa Senhora da Vandoma.

S. Vicente, o mesmo santo que também é padroeiro da cidade de Lisboa, tal como Santo António, foi considerado o padroeiro principal da cidade do Porto, entre 1025 e 1453. Conta uma história, não confirmada, em que o barco com as relíquias de S. Vicente partira de Lisboa em direção à Galiza e ao passar ao largo do Porto, por razões que se desconhecem, entrou na barra. Corria o ano de 1025. Desde aí, S. Vicente ficou a ser padroeiro da cidade.

S. Pantaleão era médico, arménio e foi, de facto, martirizado. Mas não pelos turcos aquando da invasão da Arménia, em 1453, século XV. S. Pantaleão foi martirizado por decapitação, por se recusar abjurar a sua fé, em Nicomédia, no ano de 303, por ordem do imperador romano Maximiano.

De facto, um grupo de cristãos meteu-se num barco e fugiu da Arménia, na altura da invasão turca, com relíquias do corpo de S. Pantaleão. Vieram pelo mar, entraram no Douro e aproaram em Miragaia e por lá ficaram (data desta altura a conhecida rua Arménia). As relíquias foram recolhidas na Igreja Paroquial de Miragaia, onde ficaram desde a chegada em 1453 até 1499, data em que foram trasladadas para a Sé Catedral.

Miragaia, era constituída na época por uma comunidade de pescadores, marinheiros, calafates e carpinteiros, construtores de navios. Nesse ano de 1453, os habitantes de Miragaia imploraram a proteção de S. Pantaleão para não serem atingidos pela peste que invadia a cidade do Porto. O que é certo, é que a peste não chegou a Miragaia, tendo isso sido atribuído a um milagre de S. Pantaleão, que passou a ser padroeiro da cidade do Porto.

Nossa Senhora da Vandoma foi, efetivamente, entronizada padroeira pelo Bispo do Porto D. António Ferreira Gomes, no ano de 1954. Mas a devoção por esta santa terá surgido por volta do ano 990, há mais de um milénio [ou há quase um milénio, nas palavras proferidas em 1961]. É por isso mesmo que Nossa Senhora da Vandoma ocupa um lugar privilegiado no coração do brasão da cidade do Porto.

Lembram-se de vos ter dito que estava sentado no café, naquele dia do ano de 1961, e que ao olhar para o exterior tive a certeza que continuava a ser uma noite de S. João, pois as pessoas continuavam a desferir as bem conhecidas marteladas de S. João? Pois é, isso é impossível, já que os martelinhos de S. João apenas foram inventados em 1963.

Tudo começou quando os estudantes pediram a Manuel António Boaventura, industrial de plásticos do Porto, um brinquedo ruidoso para ser usado na Queima das Fitas. O sucesso dos martelinhos foi tal que os comerciantes do Porto também quiseram martelinhos para a Festa de S. João.

© DANIEL FALCÃO