Autor

Rapariga Espinho

 

Data

13 de Novembro de 1975

 

Secção

Mistério... Policiário [35]

 

Competição

I Grande Torneio

Policiário nº 1

 

Publicação

Mundo de Aventuras [111]

 

 

Solução de:

DESCULPE, MAS NÃO LHE SIRVO DE ÁLIBI!…

Rapariga Espinho

 

– Claro que foi crime.

– Por várias razões o empregado está a mentir. E se mente…

– Ao chegar junto do assente e ao passar a mão por ele a sensação de gelado fez estremecer Rosa… Se o banco estava gelado, quem ali estivera sentado já há muito que dali tinha saído… Por outro lado, não se admite que a rapariga tentasse suicidar-se de porta aberta… e muito menos que se enforcasse em silêncio… E como se pendurava?...

 

Solução de Joe Sousa

1 – Temos de nos inclinar para a existência de crime, dado que o comportamento do único suspeito é bastante comprometedor. Além disso, temos também um conjunto de factores de ordem psicológica que não encaixam na hipótese suicídio…

Vejamos:

2 – O empregado falou de mais e arrisca-se a atrair fortes suspeitas. Ao dizer que a vítima tinha acabado de entrar no W. C. no momento da chegada da Rosa mentiu pois sabemos que esta num gesto maquinal passou a mão pelo assento do banco e o achou frio como gelo… Ora, se a morta tivesse efectivamente ocupado aquele lugar momentos antes, o pergamóide conservaria ainda algum calor e tê-lo-ia ainda conservado por cerca de um minuto mais (acabo de fazer a experiência na cadeira em que estou sentado, cujo assento é também de pergamóide). Além disso, Rosa ao aproximar-se do Café teria visto através da porta de vidro a outra a desocupar o banco… A reforçar, podemos ainda afirmar, seguramente, que ninguém se enforca em silêncio num aposento pequeno, como são todos os W. C. dos Cafés. Há sempre convulsões, pontapés na porta e outros ruídos adequados num enforcamento por sufocação que é um acto fatalmente demorado.

Rosa teria ouvido o estrebuchar.

E parece-me que nenhum suporte de candeeiro suportaria essa dança macabra, por muito magrizela que fosse a executante.

Somos pois levados a crer que o suicídio foi (mal) encenado.

Examinemos agora os aspectos de ordem subjectiva:

Correndo o risco de opiniões opostas, permito-me afirmar que às 9 e 30 da manhã não são horas de ninguém se suicidar. Tenham paciência. Esses actos têm lugar ou em momentos de grande exaltação ou após uma amarga introspecção, uma solitária descida aos infernos interiores. São actos para fins de tarde ou madrugadas atormentadas, quando toda a resistência cede perante o desespero.

Podemos também analisar o local: é absurdo que um suicida tipo cabeça-fria como seria aquela jovem a querer enforcar-se num Café, não tivesse fechado a porta por dentro antes de se dependurar. Não, não. Os que se matam costumam preocupar-se muito com a execução ritual: escrevem cartas, arrumam os seus pertences – e necessariamente tomam precauções pare não serem interrompidos…

Agora o tipo técnico da execução: parece-me que o auto-enforcamento é mais masculino que próprio de mulheres. Estas têm mais tendência para os barbitúricos, o salto do 3.° andar, o afogamento. O enforcamento desfigura, deixa um «facies» horrível e as mulheres são como são: mesmo nesses momentos decisivos pensam em miudezas desse quilate.

Assim, para terminar, podemos imaginar que o empregado, por razões ignoradas, teve uma disputa com a vítima, decidiu jogar tudo por tudo e estrangulou-a manualmente. Depois, para arranjar uma saída airosa foi pendurá-la no W. C. Só depois deve ter colocado o copo com restos de «martini» sobre o balcão.

Eu, no lugar dele, teria colocado o copo cheio de «martini». Não sei bem porquê, mas parecer-me-ia melhor. Há sempre a hipótese de na autópsia verificarem esses pormenores e se de facto a vítima não tem o «martini» no estômago, o homem está arrumado.

E pronto.

Permita-me que apresente os parabéns à autora. Engendrou um problema curto, mas com várias subtilezas e susceptível de imensas considerações… Só aquele adjectivo, ao princípio – pachorrentamente… me parece mal colocado

© DANIEL FALCÃO