Autor Data 22 de Maio de 1987 Secção O Detective [24] Competição 1ª Supertaça Policiária -
Cidade de Almada Problema nº 8 Publicação Jornal de Almada |
Solução de: DOBRAM OS SINOS NA MINHA DOR Ribeiro de Carvalho (…)
Primeiro chegou o namorado, depois o ex. Como queria falar com todos em
conjunto, ficámos à espera do terceiro elemento. Foi então que o telefone
tocou. E mais uma vez dei um salto da cadeira e mandando esperar os dois, dirigi-me
para o carro. Dez minutos depois estava em casa do jovem cego. A mãe já lá
não estava. Tinha ido para casa de uma vizinha. Num dos quartos, deitado na
cama, morto, estava o meu terceiro suspeito. Aparentemente, tinha tomado
comprimidos em demasia. A autópsia se encarregaria de o dizer. Apanhei o
frasco do chão e guardei-o. Depois olhei para o morto. Não tinha aquele aspecto calmo, pacífico, de tantos mortos que já vi. A
cara era uma máscara de sofrimento que nem a morte conseguira fazer voltar ao
normal. Dor, muita dor. Uma dor tão profunda que se manteve sempre. Até
depois da morte. Metida na máquina de escrever, urna carta, assinada depois à
mão. Com o nome do morto. «Amei-a,
sempre. Muito. Ela foi para mim mais do que uma amiga. Foi minha mãe. Minha
irmã. Minha amante. É difícil aceitar o meu mundo sem ela. Quando acabou a
festa e já todos tinham saído, decidi voltar. Queria dizer-lhe quanto a amava.
Fazê-la desistir de com quem andava. Mas ela chamou-me cego, disse-me que
nunca casaria com um cego. Dizer-mo a mim. A mim? E empurrou-me. Foi sem
querer que a minha mão agarrou a faca. E ela riu-se e fugiu. Fui atrás dela
com a faca na mão. E quanto mais ela se ria, mais eu ficava furioso. Os
móveis e as cadeiras iam-se derrubando; a loiça partia-se. Meu deus, meus deus! O sino que eu lhe tinha dado indicava-me para
onde ela fugia e quando a agarrei e lhe dei a primeira facada ela deixou de
rir e começou a gritar. A gritar comigo! Eu não lhe tinha dado o sino para
isto. Mas serviu. Quando ela deixou de gritar e eu a larguei, a minha vida
foi com ela. Porque me chamaste cego? Tu, a mim? Eu amava-te! Eu amo-te! Meu
amor! Até logo!...» Raios partam isto! Passada
uma semana, foi encontrado no rio um embrulho. Tinha dentro um fato manchado
de sangue e uma faca. |
© DANIEL FALCÃO |
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