Autor Data 10 de Novembro de 2022 Secção O Desafio dos Enigmas
[152] Competição Torneio
"Solução à Vista!" – 2022 Prova nº 3 Publicação Audiência GP Grande Porto |
Solução de: A NOITE DA MORTE DE TÚLIO LAVANDAS Rigor Mortis O
inspetor João Velhote tinha muito poucas dúvidas sobre o caso. Provar as suas
conclusões, todavia, iria ser complicado. Suicídio
não tinha sido, manifestamente. Não só Túlio Lavandas não tinha qualquer
razão para se matar, como aquele recente e violento hematoma no queixo e face
direita não podia ficar sem explicação. Era razoável supor que tivesse sido
provocado por alguma pancada forte dada pelo assassino, com o propósito de o
dominar para depois o colocar na posição adequada para o matar simulando um
suicídio. Sendo Túlio um homem bastante forte, não conseguiria fazer isso se
ele estivesse plenamente consciente, evidentemente. As
imagens do circuito de vídeo vigilância eram perfeitamente claras e mostravam
apenas três pessoas e o segurança de serviço nessa noite, até à chegada do
subchefe da segurança, à 01h32, e da Polícia, minutos depois: Márcia e
Silvino tinham entrado no edifício às horas indicadas, 00h15 e 00h35,
atravessando o hall da receção em direção a um dos
elevadores. Menos de dez minutos depois, tinham voltado a sair do mesmo
elevador e abandonado o edifício, em passo rápido. Luís Miguel Sanches tinha
entrado à 1h05 e só saíra às 3h45, quando João Velhote o mandara para casa. Silvino
Lavandas não seria o assassino… Se a Márcia, que entrara primeiro, já tinha
visto o Túlio morto, Silvino estaria evidentemente a dizer a verdade ao
afirmar que o encontrara já morto… A
Márcia, pelo contrário, tinha tido a oportunidade para matar o Túlio… Mas a
sua compleição manifestamente frágil muito dificilmente lhe teria permitido
dominar o Túlio antes de o matar. Dar-lhe um soco nos queixos com força
suficiente para o fazer desmaiar não era sequer imaginável. Dar-lhe uma
pancada com algum objeto com o mesmo propósito era também muito pouco
provável. Teria que estar à sua vista, e o Túlio era fisicamente forte e
suficientemente ágil para evitar, ou impedir, algum golpe desse género.
Portanto, a conclusão era de que também não tinha sido a Márcia a matar o
Túlio. Forçoso
era concluir que outro alguém tinha sido o assassino, tendo cometido o crime
antes da entrada da Márcia no gabinete do marido. Mas não muito antes, a
fazer fé no diagnóstico do médico-legista de que a morte teria ocorrido entre
a meia-noite e a uma hora da madrugada. Quem?
Dos suspeitos conhecidos só restava o Luís Miguel Sanches, conhecidamente
despeitado com o Túlio e com ambições justificadas de ascender à presidência
executiva… Recriando
mentalmente a sequência dos eventos, João Velhote mordiscou o lábio superior,
expondo os incisivos inferiores por baixo do bigode grisalho, como era seu
hábito. Segundo a Márcia, ela e o Luís Miguel tinham-se encontrado ao
princípio dessa noite no jantar de aniversário de um amigo comum, quando a
informara de que o Túlio estava a trabalhar na empresa nessa noite. O Luís
Miguel conhecia os problemas do casal, e terá sugerido que a Márcia fosse à VarEstra para nova conversa com o marido sobre o
divórcio… Talvez incentivando-a a ter uma conversa definitiva sobre o
assunto… Convencida a Márcia a
fazê-lo, Luís Miguel saiu antes dela do jantar de aniversário e dirigiu-se
rapidamente até às vizinhanças do edifício sede da VarEstra.
Utilizando os seus conhecimentos das insuficiências do circuito de vídeo
vigilância da empresa – algo que nem o Silvino nem a Márcia tinham razões
para conhecer – entrou a pé pela zona de armazéns, nas traseiras do edifício,
que conhecia bem e de que tinha as chaves, fruto das suas funções na empresa,
e subiu as escadas interiores até ao último piso, usando os ângulos-mortos
das câmaras. Entrando no gabinete do Túlio, cumprimentou-o e aproximou-se
dele o suficiente para, de surpresa, lhe desferir um forte soco. Era apenas
preciso que o Túlio ficasse entontecido e incapaz de reagir por um par de
minutos. Tempo suficiente para o sentar na cadeira e lhe deitar o torso sobre
o tampo da secretária, colocar a mão dele a segurar a pistola de pequeno
calibre que trazia, encostá-la à fronte direita e disparar o tiro fatal.
Depois de olhar em redor, certificando-se de que tudo estava na ordem devida,
Luís Miguel terá ido para o seu gabinete, onde aguardou a chegada da Márcia…
Assim que ela saiu, fez o caminho inverso pelas escadas e saiu pelo mesmo
sítio por onde tinha entrado, usando sempre os ângulos-mortos do sistema de
vídeo vigilância. E pela uma da madrugada entrou calmamente pela receção da
empresa, para proceder à descoberta do corpo de Túlio Lavandas, morto… |
© DANIEL FALCÃO |
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