Autor Data 5 de Junho de 2011 Secção Policiário [1037] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2011 Prova nº 6 (Parte I) Publicação Público |
O MASSACRE DA QUINTA DA ALEGRIA Rip Kirby A
Quinta da Alegria constituída por um terreno de 30000 metros quadrados no
centro do qual há um palacete construído no séc. XIX. A propriedade é cercada
por um muro de dois metros de altura, caiado, encimado por três filas de
arame farpado. Na face confinante com a estrada nacional há um portão junto
do qual existe uma guarita onde três guardas fazem serviço revezando-se de
quatro em quatro horas. Da casa ao muro há um jardim e, serpenteando entre os
canteiros, o caminho que vai até ao portão. O
palacete pertence a Andréia Niemeyer, italiano de
origem judaica estabelecido em Portugal, de parceria com Norberto Castro, com
uma empresa de construção naval. Cinquenta e cinco por cento do capital
pertence a Castro e a Niemeyer 40 por cento. Os restantes 5 por cento,
cedidos por Norberto, foram divididos igualmente por cinco engenheiros da
empresa. Agora esses engenheiros querem que a percentagem suba para dois por
cento. Niemeyer aceita essa reivindicação, mas entende que essa percentagem
deve ser retirada da quota de Norberto Castro, ao que este não acede. Diz que
já fez a parte dele, agora é a vez do italiano. Naquele
domingo, realizava-se na quinta um almoço para o qual foram convidados todos
os sócios da empresa. Como o almoço decorreu, não sabemos. Por volta das 17
horas um telefonema na PJ levou o inspector
Trindade e a sua equipa para o local. Chegado
à quinta, o inspector foi levado para a sala de
jantar no centro da qual há uma mesa onde apenas estavam presentes os cálices
onde foram servidos os antidigestivos. Nas laterais da mesa cinco corpos,
três de um lado e dois no outro, tombados sobre esta. Todos tinham recebido
um tiro na nuca e, em todos, a trajectória da bala
fora semelhante. Entrara na nuca e subira ligeiramente para o alto da cabeça.
Os bordos das feridas, que haviam sangrado pouco, apresentavam-se queimados e
com resíduos de pólvora. Sobre
a mesa, à direita dos corpos, estavam as cápsulas das balas que os atingiram.
Um pouco afastado da mesa, estendido no solo com o peito para cima, estava o
corpo do mordomo, identificado pelo empregado que acompanhava o inspector. Atingido no estômago sofreu grande hemorragia
como indicava o sangue ao seu redor. A cápsula da bala que o matou
encontrava-se bastante distante, e desviada para a sua esquerda. Não havia
sinais de queimado nem de pólvora no ferimento. Junto
da porta de comunicação com a sala ao lado, outro corpo, que o empregado
afirmou ser o dono da casa, deitado de bruços com a cabeça perto da porta,
parecia ter sido atingido quando tentava fugir do local. Perto, um pouco à
frente do corpo, desviada para a sua esquerda, estava a cápsula da bala que o
atingira. O inspector viu que ainda respirava pelo
que o virou podendo assim verificar que recebera o tiro um pouco abaixo da
clavícula esquerda tendo a bala seguido uma trajectória
ligeiramente ascendente e em diagonal da direita para a esquerda saindo um
pouco acima da espádua. Na sua camisa branca ensopada notava-se o tecido
queimado e os resíduos de pólvora concentrados em volta do buraco. O
empregado que acompanhava o inspector disse que,
após o almoço, o patrão havia dispensado todos os empregados, recomendando
que fossem divertir-se na piscina e que voltassem às 17 horas. Encarregou o
mordomo de ir servir umas bebidas quando fossem 15 horas, o que este fez não
tendo voltado. Um pouco antes das 17 horas, como a casa ficava um pouco
distante, abandonaram a piscina e quando chegaram depararam-se com aquele espectáculo. Todos confirmaram e afirmaram ter estado
sempre juntos. Depois
de tratado, Niemeyer disse qual o motivo daquele almoço para o qual tinham
sido convidados todos os sócios da empresa: discutir a pretensão dos
engenheiros, mas Norberto Castro não comparecera como havia prometido. Cerca
das 15 horas, um pouco depois das bebidas servidas, entrou na sala um
estranho, de estatura elevada e mascarado, que começou a atirar sobre os
presentes. Interrogados
os guardas, o que esteve de serviço entre as 12 e as 16 horas, um jovem baixo
atarracado, afirmou que todos os convidados tinham entrado na propriedade. À
pergunta que lhe foi feita respondeu que o senhor Castro tinha entrado cerca
das 14 horas, mas acrescentou que não o vira. O carro tinha os vidros escuros
e ele só viu o motorista que voltou a sair pouco depois. Acrescentou que
todos os convidados chegaram conduzindo os seus próprios carros e que ninguém
mais entrara nem saíra enquanto esteve de serviço. O colega que o rendeu
afirmou que durante o seu turno ninguém se ausentara da propriedade. No
dia seguinte em Aveiro, onde morava, Norberto, quando interrogado, olhou o inspector do alto dos seus dois metros de altura e disse:
que se deslocara a Lisboa devido a compromisso de última hora pelo que não
pudera assistir à reunião. Apresentou os talões das portagens que pagou na
viagem e um bilhete para a sessão de domingo num teatro da capital. Esse bilhete,
para além da data impressa, tinha o autógrafo de Rui Mendes, que era um dos actores que participara na peça a que ele assistira, com
a data manuscrita. Afirmou que havia mandado um dos seus motoristas à quinta
para justificar a sua ausência. Não se lembrava de qual o motorista que
encarregara desse serviço e, quando interrogados, todos os motoristas se
esquivaram a admitir que tivessem ido à quinta. No
relatório do médico era dito que, excluindo o mordomo, todas as vítimas
tomaram, depois do almoço, uma poderosa dose de um sonífero, certamente
adicionado às bebidas que beberam, tendo todos eles morrido durante o sono. A
morte dos convidados fora instantânea e deveria ter ocorrido entre as 15h45 e
as 16h30 com ligeiros intervalos entre si. A morte do mordomo teria ocorrido
depois de uma agonia de certo modo prolongada, no intervalo de tempo indicado
para os outros, cerca de trinta minutos depois de atingido. Pela quantidade
de sangue derramado o médico calculou que o dono da casa foi atingido minutos
antes dos criados terem dado pelo massacre. No
chão, a meia distância entre Andréia e o corpo do
mordomo, encontrava-se a arma que servira para a matança, sem impressões
digitais e uma luva branca da mão direita, um tanto suja. Pensou-se que a
luva fosse do mordomo mas este tinha as suas duas calçadas. Nenhum
dos cálices que se encontrava sobre a mesa tinha qualquer vestígio da bebida
que fora servida nem impressões digitais. Apenas se via um pouco de água no
fundo de todos eles. No muro não foi detectado
qualquer estrago. É
tudo. Cabe agora aos nossos detectives descobrir o
que se passou e apresentar um relatório circunstanciado sobre as conclusões a
que chegaram. |
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© DANIEL FALCÃO |
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