Autor Data 1 de Dezembro de 2007 Secção Competição Problema nº 4 Publicação O Almeirinense |
A MORTE DE ANÍBAL CALDEIRA – O
BANQUEIRO Sete de Espadas Uma
vez, já lá vão muitos e muitos anos, lembro-me que, no célebre Café Martinho
(hoje, um banco), onde, ao tempo, se reunia uma das mais numerosas e
aguerridas Tertúlias da época, em conversa com o Joe Match – não sei se vocês
se recordam dele e do seu perfil esguio, cabelos levemente aloirados, de
casaco axadrezado e sempre sobraçando milhentos “problemas de Rádio”, até
chegar a essa formidável “invasão da Terra pelos marcianos”!... – dizia-me ele: –
“Sete”, fiz um problema que é uma espécie de sinopse de um grande relatório –
assim como o extrair, de um texto grande, só o que “nos convém”! –
Já não é a primeira vez… respondi! Tens em “Um Crime a Bordo”, de Dennis Wheatley,
o “clássico” do género: Cópias de telegramas… Relatórios… Apontamentos do
agente investigador… Fotografias dos quartos… Inventários dos objectos… Fotografias de todos os suspeitos… Impressões
digitais… Cabelos… Pontas de cigarros… Fósforos queimados… até chegares à
própria confissão, escrita, do assassino… –
Não é bem isso, “Sete”!... Isso é demais para mim… O que pretendo é mais ou
menos isto… E,
sem me dar tempo para mais, já estavam folhas de
papel estendidas pelo amplo tampo de mármore da pesada mesa, onde as mãos
esguias do Joe Match seguravam e garatujavam os seguintes elementos: 1)
Aníbal Caldeira é um conhecido banqueiro que aparece morto, no seu gabinete,
à 1 hora da madrugada de 9 de Abril… 2)
Lualda, sobrinha, é quem dá com o corpo, quando vai
desejar “boa-noite” ao tio… 3)
O corpo está caído de costas, ao comprido, sobre a alcatifa, segurando na mão
direita uma Star… com silenciador… 4)
De cabelos em desalinho, face magra contraída, lábios fortemente cerrados,
tem um orifício quase a meio da testa, sobre o sobrolho direito, de onde
partia um fiozinho de sangue já coagulado… 5)
Apesar da sua fortuna pessoal ser considerada significativa, os negócios do
banqueiro – segundo investigações feitas – corriam mal… 6)
Pelo testamento encontrado, era beneficiária a sobrinha, que retiraria 1/3 do
“bolo” para o secretário e pequenos legados para os serviçais… Achei,
quanto a mim, que a ideia estava a ser bem esquematizada e logo ele me atirou
com novas “fichas” – a que pomposamente dava o título de “extractos
dos interrogatórios”… Cozinheira: Esperava
Lualda na cozinha, quando esta entrou a correr,
gritando que o tio estava morto… Acordara depois o criado, participando-lhe o
facto… Criado: Afirmara
que o banqueiro estava vivo à meia-noite e meia hora, quando lhe fora levar o
habitual cálice de “gin”, que o banqueiro sempre
bebia antes de se deitar… Depois, ele próprio se fora deitar, só acordando
quando a cozinheira o chamara… Secretário: Fora ao cinema… Regressara perto da
meia-noite e encontrara Lualda no corredor, quando
ela se dirigia para a casa de banho. Ele subira para o seu quarto, no
primeiro andar… Mas, antes de subir, e ao passar pela porta do gabinete de
Aníbal Caldeira, tivera a impressão de que qualquer coisa pesada caía… Ainda
estivera para bater, mas, depois, pensara nas cenas do filme policial que
vira e rira-se, por se julgar influenciado… Afinal… Só quando sentira grande
reboliço por toda a casa descera, tendo, então, a cozinheira, Lualda e o criado contado que o banqueiro estava morto…
Telefonara imediatamente à polícia, visto que ainda ninguém o fizera… E fora,
depois, ao gabinete da vítima, ver o corpo… Aí, encontrara aquele pedaço de
vidro oblongo, que lhe parecera do relógio do patrão… (Não se confirmou.) Aqui,
olhámos um para o outro… Sorrimo-nos… Vários pormenores – aqueles pequenos
nadas que jamais passam despercebidos a qualquer “detective”…
– faziam-nos pensar no “problema” que era a morte do banqueiro… e que esta
fora um… Deixei
que o Joe arrumasse todas as suas folhas e “fichas” dispersas… E…
muitos anos depois – esta história passou-se, algures, no fim de uma tarde
ventosa e húmida de Dezembro de 1948 e foi escrita em 1975 – cabe-me
perguntar: 1
– Crime ou suicídio? Porquê? 2
– Faça um relatório do caso, focando todas as contradições… |
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© DANIEL FALCÃO |
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