Autor Data 3 de Abril de 2016 Secção Policiário [1287] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2016 Prova nº 3 (Parte I) Publicação Público |
O REGRESSO DO ZÉ PINCEL À LIBERDADE SSAS Assim que entrou na sala, percebeu-se
o que fazem a uma pessoa mais de dez anos de prisão em estabelecimento de
alta segurança, como aconteceu ao Zé Pincel quando andou com uma quadrilha de
assaltantes violentos, que paravam carros em estradas, abalroando-os. Assim
que os proprietários paravam para verificarem os estragos, os responsáveis
saiam do carro, armados, e a violência seguinte acontecia até conseguirem os
seus intentos, dinheiro, valores, cartões de crédito e o próprio carro que
era levado para locais onde era desmantelado ou então traficado para fora do
país. Quando a polícia
desmantelou o grupo, alguns conseguiram fugir e ainda estavam a monte, mas o
Zé Pincel foi agarrado e depois de um julgamento em que ninguém o identificou
de forma decisiva, embora um tal Eduardo Serrote o tenha comprometido, mas
sem consistência e ele não confessou, acabou a cumprir uma pena de 12 anos em
prisão de alta segurança. Não beneficiou de qualquer redução ou saída
precária, porque recusou sempre a autoria dos roubos ou a sua participação nos
mesmos, mas os juízes não acreditaram na sua versão e como ele conhecia
alguns dos membros identificados, acabou preso e condenado. A verdade, essa,
nunca se saberá, a menos que algum dos responsáveis identificados e
conhecidos acabe por confessar ou clarificar todo o processo. Mas pronto, o Zé Pincel
estava cá fora de novo e a reaprender a viver sem os altos muros da prisão,
sem a penumbra constante do edifício vetusto e sombrio, sem os corredores
húmidos e tristes, que levavam às celas quando vinham tomar um pouco de ar ao
recreio fechado e claustrofóbico que só permitia ver uma réstia de céu, as
nuvens a passar, quando as havia e o sol a bater nas torres de vigia que
rodeavam o recinto. Mais de uma década nesse
ambiente, não alterou muito a impressão agradável que o Zé Pincel despertava
nas pessoas em geral e quem não conhecesse a sua vida, jamais o imaginaria
nessa situação. O Inspector
olhou-o demoradamente e comentou com algum sarcasmo: – Ora cá temos o nosso Zé
Pincel! Não demorou muito a regressar aos problemas! Parece que doze anos não
chegaram… – Inspector, é muita bondade sua, mas esses doze anos foram uma
aldrabice e você sabe bem disso porque forjou toda a história, não é verdade? – Ora, ora, Zé, isso de
dizer mal da Justiça e dos juízes nunca dá bom resultado, mas agora vai ter
oportunidade de completar a sua “formação” depois do que fez ontem à noite… – O que é que eu fiz?
Explique lá isso… – Ora, já não se recorda? O
nome de Eduardo Serrote diz-lhe alguma coisa? Puxe lá da sua memória desde…
ontem! – Sei quem é o tipo,
tramou-me com o seu depoimento falso e foi ele, de certeza, que me atirou
para a prisão, mas nunca mais o vi… – Onde esteve e o que fez
ontem, durante todo o dia? – A gozar a liberdade, pois
então! Ontem fui matar saudades do mar e da praia e do sol, daquilo que eu
mais gostava de fazer em jovem e que me foi negado nestes anos todos. Ontem
foi sol, mar e areia, sem ligar a mais nada, de
manhã à tardinha! – E esteve sozinho? – Claro. As pessoas que
conheço trabalham, têm a sua vida e eu queria estar só, habituei-me a estar
só, como sabe… Mas ouça lá, o que é que o Serrote tem a ver para aqui? – Ora, não sabe? Pense lá
um bocadinho… Não se recorda de o procurar, de o encontrar, de lhe pregar uma
valente sova? Não se recorda mesmo? – Mais uma mentira sua,
claro. Vocês nunca largam um osso quando o apanham, não é? Já lhe disse o que
andei a fazer e à noite, quando cheguei a casa só queria era descansar,
dormir, que não estou habituado a tanta “acção”,
como deve perceber, ou precisa de um desenho? – Continua a falar bem,
folgo em verificá-lo, mas confesso que não me alegra… Vai ficar detido para
pensar bem no depoimento que quero recolher daqui a… duas horas, vá lá, para
não dizer que não teve tempo… O Inspector
parece ter muita certeza de que o Zé Pincel teve alguma coisa que ver com a
sova que o Eduardo Serrote apanhou, mas será que o leitor partilha dessa
certeza? Justifique todas as suas conclusões. |
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© DANIEL FALCÃO |
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