Autor

Subchefe Ferrolho

 

Data

20 de Fevereiro de 2023

 

Secção

O Desafio dos Enigmas [157]

 

Competição

Torneio "Solução à Vista!" – 2022

Prova nº 7

 

Publicação

Audiência GP Grande Porto

 

 

ENCONTRE AS INVERDADES

Subchefe Ferrolho

 

No ano da graça em que o porta-contentores Tollan se virou e flutuou até ao Cais das Colunas, sem haver perda de vidas, estava ele, o assassino profissional, de mal com tudo, deitado no terraço com a carabina apontada, e a cruzinha da mira telescópica procurando a cabeça do Terror Ista, que por vezes se enquadrava, na vidraça da janela do edifício em frente. Por motivos insondáveis, sentia-se pior que o chão repisado, enquanto se preparava para fazer mais um “serviço”. 

Caramba! Mas que maldição avulsa, havia caído como peste remelosa, no seu doutoramento, no seu decente ganha pão, na sua enxada já “encabada”, que o fizera dedicar-se em último recurso, ao tão pernicioso ofício atual? 

‒ Alto! É pá! ‒ O Terror Ista aparece de frente na janela fechada, como se olhasse o estado do tempo através do vidro. O dedo expectante no gatilho, a uma fração de segundo de atirar, quando parou, porque o alvo se agachara. 

Paralelamente ao aprimorar da pontaria e espera do momento certo para o tiro, passava-lhe pelo pensamento a revolta sentida, a raiva latente… a recordação da viagem a Nova York, em 1970, ver o filme “Laranja Mecânica”. 

As cenas de violência e “desviolência” consequentes do polémico argumento, a estreia, filme proibido por ditaduras, retirado das salas de exibição em alguns países, porque aí gerava violência em vez: ‒ de a acabar. Perturbador como o livro “The Big Bow Mystery” de Edgar Wallace. 

E ele neste momento, protagonista de mais um caso lamentável, feito por encomenda.

‒ Atenção! ‒ que o Terror Ista recuou, e atenção outra vez, aparece uma cabeça feminina na janela. Não fora isto que lhe haviam dito. O alvo estar só, era uma condição inegável, para fazer o “trabalho”. 

Perante este contratempo, decidiu “abortar o serviço”. Desmontou a arma e arrumou-a no estojo. Continuava, apesar do esforço em o não fazer, a recordar-se mais uma vez, que então naquela etapa da vida, estudava e procurava alternativas, segundas e terceiras vias, de encontrar o caminho certo, a vereda de acesso ao salário ao fim do mês.

E aí, de escoras repuxadas, de currículos enviados pela net, e outras demandas para a angariação do sustento, eis que aparece ‒ a expurgar o desastre do “não há nada para ninguém” ‒ uma vaga, para trabalhar nas obras. 

Dizia-lhe a namorada, larga esse serviço de pistoleiro, põe a carabina no prego antes que te dês mal com a polícia, aproveita esta oportunidade de começares uma vida honesta e: 

‒ Não é obras, que se diz! É construção civil. 

Uns dias depois na hora de almoço, sentado no andaime com o camarada pedreiro, confessava-lhe uma ralação que tomara conta de si, a respeito do buraco do ozono e a destruição do planeta pela própria humanidade. 

Questão muito grave. 

‒ Temos de ter cuidado com isso ‒ disse-lhe. Creio que eles acabarão por agir, quando tiverem de garantir os lucros fundamentais, para o seu próprio bem-estar. 

‒ E soubeste do que aconteceu em Lisboa? 

‒ O quê? 

‒ O navio americano que se virou numa colisão com outro barco. 

‒ É pá! Agora que falas nisso, foi no sábado passado. Caraças! 

‒ Bem, desastres não pagam dívidas! Torçamos para que o Sporting ganhe outra vez o campeonato, e ao sucesso do Columbo, na Vermelhinha, que está a dar na televisão. 

‒ Sou do Porto, e a minha mulher do Benfica. Não faço caso disso. ‒ Respondera-lhe o camarada. 

‒ Devias fazer. Não só do futebol, mas principalmente de tudo. Sair da caverna. Acordar para a vida, pá! 

A hora de almoço acabara. Precisava de beber uma bebida forte, que lhe renovasse as energias. Parou no café da esquina, que na verdade tinha outro nome, mas ninguém sabia qual, e fez uma pausa. Uma bucha vinha a calhar. Um jornal esquecido numa das mesas noticiava o vigésimo aniversário, a completar-se em julho, da missão da Apolo 11, em que o homem pisou a lua pela primeira vez, sem pedir licença, nem limpar os pés. 

‒ Para quê? ‒ perguntou um cliente ‒ nem sequer há lá petróleo e gás natural! 

‒ Nem ouro nem diamantes ‒ disse outro, com uma entoação assaz desanimada. 

‒ Nem só de petróleo, gás natural, ouro e diamantes vive o homem, meus caros ‒ interveio ele. 

Pouco convencidos os dois interlocutores remeteram-se ao silêncio. 

Não prestou mais atenção à notícia, concentrou-se no ditado popular, que nunca entendera bem, e que lhe martelava nas têmporas com truculência: a barriga não tem culpa que o negócio não dê. Mas quem os autorizou a uma coisa dessas? Que desconchavo, que forças estranhas, estarão escondidas nessa calamidade? E se manteve então sempre se interrogando, continuamente depois de cada resposta a seguir a cada pergunta. 

 

Caros amigos, quais são as sete inverdades contidas no texto? 

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO