Autor Data 17 de Setembro de 2017 Secção Policiário [1363] Competição Campeonato Nacional e Taça de
Portugal – 2017 Prova nº 7 (Parte I) Publicação Público |
Solução de: MORTE NAS TRASEIRAS Verbatim Para
resolução deste problema convirá, primeiro do que tudo, fazer um esquema dos
quintais e aí localizar os corpos de Eusébio Figueira e do seu cão bem como
os projécteis disparados e o silenciador. Num
rectângulo de 3x2, temos da esquerda para a direita, numa primeira fila, os
quintais dos Lopes, dos Figueira e dos Silva e, numa segunda fila, os
quintais dos Simões, dos Ferreira e dos Costa. No terreno dos Figueira o
corpo está estendido, paralelo à base do rectângulo, com a cabeça para o lado
direito, encontrando-se o cão junto dos pés do dono. Os projécteis estão à
esquerda, um junto do murete de separação com o quintal dos Lopes e o outro
entre este muro e o cão. O silenciador está no terreno dos Lopes. Constata-se,
de imediato, que a posição do corpo de Eusébio Figueira não conjuga com o
local onde foi cair a bala que lhe entrou pela face. Ou o projéctil ou o
corpo foi retirado da sua posição inicial. Como a bala que atingiu a vítima
ainda bateu no muro à esquerda, tendo aí caído, então o corpo terá sido
rodado de 180 graus. Havendo
sangue do cão, que jazia aos pés de Eusébio Figueira, misturado com sangue do
dono, que só tinha ferimentos na cabeça, sem qualquer indício de que o corpo
do cão haja sido movido, então a cabeça de Eusébio Figueira esteve a sangrar
no sítio onde o animal caiu ferido e terá sido daí retirada. Sai assim
reforçada a tese da rotação de 180 graus aplicada ao cadáver humano. Verificamos,
pela localização dos projécteis, que eles terão sido disparados do lado
direito e, considerando o percurso na cabeça da vítima, bem como a provável
altura do cão e a pouca distância a que a bala que o atingiu se alojou, que
os dois tiros fatais terão sido desferidos de um nível superior ao das
vítimas. A
localização de um silenciador, com sinais de uso recente, num quintal à
esquerda, não concorda com os disparos vindos da direita. Podemos, portanto,
começar a presumir que a rotação do corpo e o aparecimento do silenciador no
quintal dos Lopes terão constituído uma tentativa de inculpar alguém do lado
dos Lopes. É
possível conjecturar, também, o modo como foi rodado o corpo de Eusébio
Figueira atendendo às escassas pingas de sangue entre o corpo e a porta da
casa para o quintal e ao pouco sangue existente sob a sua cabeça. Assim, a
vítima, agarrada talvez pelas axilas, terá sido rodada com a cabeça a passar
entre o sítio onde caíra e a vivenda, para depois ficar virada em sentido
contrário. Como já sangrara bastante, as pingas foram escassas e o sangue que
a seguir derramou para o chão já foi pouco. Os
intervenientes neste caso, nas suas declarações, não entraram em contradição
quanto aos tempos em que ocorreram ou podiam ter ocorrido os acontecimentos a
que se referiram. Mesmo António da Silva, ao dizer que perto do meio-dia e
meia vira o vizinho Eusébio estendido no quintal, ter-se-á reportado ao
período que mediou entre a saída dos jovens do quintal, para pedir ajuda, e a
chegada dos agentes da autoridade. Note-se que os rapazes deverão ter
demorado menos de meia hora a vir da praia e que naquela altura não havia
telemóveis. Chegados
aqui, verificamos que António da Silva será o principal suspeito. Os álibis
dos dois jovens e de outros vizinhos e as declarações que ele próprio
produziu levam-nos a presumir que não só poderá ter morto Eusébio Figueira
como terá procurado mostrar que o criminoso seria alguém do lado dos Lopes. Com
efeito, o que foi observado permite estabelecer, como muito provável, a
conjectura que se descreve a seguir. António da Silva, cerca das 10:00,
munido de uma arma com silenciador, em cima de um escadote onde fingiria
encontrar-se a examinar os cachos da parreira, disparou sobre Eusébio
Figueira e também sobre o cão, não fosse este produzir qualquer alarme. Isto
era possível e, sobretudo, concorda com o trajecto das balas. De seguida, não
havendo o empecilho do animal, António da Silva decidiu alterar a cena do
crime para lançar as culpas sobre os Lopes. Então, com grande risco, saltou
para o lado dos Figueira, rodou o corpo e atirou o silenciador para o quintal
dos Lopes, depois de o soltar e limpar com a ajuda de um trapo. Isto também
concorda com a cena observada e ganha um sentido especial pelo facto de
António da Silva ter afirmado que, perto do meio-dia e meia, vira Eusébio
estendido no quintal, como quem tivesse levado um balázio pela frente,
denunciando, desse modo, o desejo de se entender que Eusébio Figueira fora
atingido por um atirador colocado no lado contrário ao seu. A arma não terá
sido arremessada para o quintal dos Lopes por, talvez, ser conhecida de
alguns vizinhos como pertencente ao nosso suspeito. António
da Silva também entrou em contradição quando disse ter procurado avisar
alguém da casa dos Figueira para socorrer o Eusébio, supostamente por não
saber bem o que lhe teria acontecido e, logo a seguir, mostrar encontrar-se
em condições de perceber, mal chegaram os dois militares da GNR, que,
entretanto, alguém já concluíra que o vizinho tinha sido morto a tiro. Finalmente,
pode presumir-se que António da Silva terá saído de casa para se desembaraçar
da arma que utilizou, pois teve muito tempo para isso, e que ao voltar,
encontrando tudo ainda muito calmo, haja ficado atento a qualquer movimento
no quintal dos Figueira para, a partir daí, representar a rábula de uma
pessoa surpreendida e preocupada com o que pudesse ter acontecido ao seu
vizinho Eusébio Figueira. O
móbil do crime não é claro. Contudo, verificando que Eusébio Figueira assim
como os seus vizinhos Silva e Lopes se dedicavam a negócios pouco
transparentes e gostavam de estar armados, não será de excluir a hipótese de
um ajuste de contas gerado entre traições e malsãs cumplicidades. Também não
será de descartar a possibilidade de estarmos perante um crime passional devido
a alguma atenção desmesurada, em relação a Eusébio Figueira, evidenciada pela
exuberante chefe do clã Silva. |
© DANIEL FALCÃO |
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