Autor Data 15 de Julho de 2006 Secção Competição Prova nº 4 Publicação O Almeirinense |
O CASO MAFALDA Zé da Vila O
permanente bom humor de Gustavo vacilou diante do amontoado de trabalho sobre
a secretária. Detestava, pura e simplesmente, o factor
burocrático inerente à profissão. Suspirou. Reconhecia que, mais cedo ou mais
tarde, teria de mergulhar no monte de papéis. Adiava, porém… Arrancou,
de entre os relatórios de rotina, memorandos e documentos internos, o
processo, iniciado na manhã anterior, da morte de Mafalda Rosa. Fixou-se na
leitura. A mente treinada absorvia os factos registados, resumindo-os ao
essencial. Cerca
das 12 horas do dia anterior, na margem do lado X, usualmente bastante
frequentado mas naquela manhã semi-deserto face aos
indícios de chuva forte, um casal de idosos, que encerrava a habitual
incursão de cinco quilómetros diários, com chuva ou sem ela, deparou com o
cadáver de uma jovem mulher. De imediato, porque o telemóvel é outro hábito,
telefonou à polícia. Da Polícia… à Judiciária, cujos técnicos recolheram
fotos, indícios e poucos vestígios (a chuva caíra forte, após o crime) para
análise, depoimentos para confirmar. A vítima fora estrangulada com um cordão
incaracterístico. Estava caída de lado, de óculos escuros e um lenço,
apertado na cabeça, ocultando os cabelos louros. A carteira, caída perto,
continha duas notas de cem euros e uma de vinte, alguns trocos e a carta de
condução, que a identificava como uma conhecida modelo. O casal que a
encontrou estava, positivamente, fora de suspeita e não se encontrara, até
então, outras pessoas que tivessem contactado com o corpo. Aguardava-se,
porém, a comparência de Pedro Castro, um abastado jovem, canoísta amador, que
remava, frequentemente, nas águas do lago. O
inspector G.B. recuperara o bom-humor
e a vivacidade, perante o desafio de um novo caso. Chegou
o canoísta, acompanhado de um homem da Judiciária. Trazia um jornal onde se
publicava a notícia do crime, ilustrada com uma fotografia da modelo, que
colocou sobre a secretária de Gustavo, adiantando-se, ansiosamente, antes que
algo lhe fosse perguntado: – Reconhecia-a, logo que a vi passar na margem,
com um homem alto e bem vestido. Pareceu-me que discutiam. Não me aproximei
muito. Fiquei a 200 metros; aliás, não tinha nada com o assunto! Apesar de
bonita, não era o “meu género”… Afastei-me! –
Alguma vez tinha estado ou falado com a Mafalda, interrogou G.B.? –
Não. Nunca tive esse prazer, respondeu o inquirido. A minha ocupação favorita
é a canoagem. –
Então, lamento. Vai deixar de remar por uns tempos. Vou acusá-lo, por
suspeita de crime… Em
que se baseava G.B. para suspeitar de Castro? |
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© DANIEL FALCÃO |
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