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22 de Março de 1957. É
publicado, na revista “Flama”, o 1º número da Secção “O Gosto do Mistério…”,
orientada por Jartur – curiosamente, por lapso
tipográfico, identificado como “Mr. Dartur”. Domingos Cabral, com 15 anos completados
recentemente, responde ao problema naquela inserido – “O Táxi Misterioso”,
transformando, assim, em “casamento” o “namoro” que à modalidade vinha
fazendo há algum tempo, através do contacto com a Secção do “Mundo de
Aventuras”, de que era leitor há alguns anos. Sabendo, por isso, que era habitual o uso de
pseudónimo, e perante a dificuldade que sentiu na escolha, rápida, de um,
acabou, por associação, por perfilhar o “Inspector
Aranha”. É que, naquele problema, o investigador (Marcos Dias), concebido
pelo Autor (Jartur), após resolver o caso,
dirige-se para o “Clube do Aranhiço”. Escolha pouco feliz, de facto, já que
ninguém inicia a construção de um edifício pelo telhado e o principiante
começava, nada modestamente, por se designar “Inspector”…
De qualquer forma, iniciou-se, assim, um longo caminho… In Mundo dos
Passatempos, 1 de Setembro de 2007 Correio Policial, 4 de Junho de 2021 |
PRIMÓRDIOS DA PROBLEMÍSTICA
POLICIÁRIA PORTUGUESA por DOMINGOS CABRAL (do livro com o mesmo título, a
editar) 38 CICLO REINALDO FERREIRA “REPÓRTER
X” CONCURSO DOS CONTOS
MISTERIOSOS Nº 43 VULCÃO DE ESTRELAS Os “stúdios”
cinematográficos da “Deutch-Film”,
eram alcunhados, entre a gente do “métier” pela
“Embaixada de Los Angeles”… De facto, construídos como estavam, nos arredores
de Berlim, á semelhança dos seus similares da Califórnia, reuniam em alguns
hectares quadrados de terreno, todas as maravilhas modernas da celebre capital americana das películas. Os artistas do
seu elenco – que se contavam por centenas – os seus figurantes, que
alcançavam alguns milhares, não necessitavam ir a Berlim para comer, dormir
ou divertir-se… Nas instalações da Deutch-Film
encontravam eles hotéis, “restaurants”, “bars”, “dancings”, bilhares… e até cinemas… …Mas se numeroso era o elenco da Deutch-Film – só um dos seus componentes atingira a
máxima fama universal: Edda Adger… Edda Adger era, até certo ponto, uma veterana da
cinematografia alemã – apezar de ter dobrado ainda
há pouco os trint’anos. Começára
a sua carreira aos doze anos – na época em que os “films”
de três actos eram considerados cá “monumentaes”… Durante toda a guerra trabalhou, em
pequenos papeis de ingénuas, com relativo êxito –
mas a retumbância do triunfo alcançara-o ela, ao entrar para a Deutch-Film, em 1918. Os “metteurs-en-scéne”,
na batalha de concorrência com os “yankees”, viram a necessidade de esgrimir
com “estrelas” e de as cercar de todas as luminosidades da propaganda. Edda era dócil, inteligente e, bem dirigida, não tardou a
entronisar-se lá pelas alturas da celebridade. De 1918 a 1926, trabalhara ininterruptamente
filmando dezenas de películas; até que, assustada pelos médicos e contra a
vontade dos directores, gozou as primeiras feria de repouso a que há muito tinha direito… E eil-a a percorrer o
sul da Europa, a banhar-se nas aguas de Biarritz; a
arriscar ás noites no tapete verde de Monte-Carlo, a
patinar nos “rings” da Suissa, a aplaudir os “diestros” das praças de touros de Espanha - e a
pavonear-se, encantada, pela paisagem-jardim de Portugal… E naquela manhã de agosto… Naquela manhã de agosto, a noticia
correu, rápida, pelo “studio”; Edda
regressara a Berlim, com belas côres e um enorme
entusiasmo em regressar á actividade do… silencio, á actividade dos films… E os seus camaradas, que corriam ao seu salão,
para cumprimental-a, cochichavam entre eles: – Quando ela souber o que se passa, morre de
desgosto… Cercaram-na e durante meia hora fonografou, acalorada, as suas impressões de viagem… – Mas de todos os paízes
que visitei, o que mais me enterneceu foi Portugal… Que curioso, que
pitoresco, que belo! Assisti ás festas dos seus
santos milagreiros – Santo António e S. João. Queimam então policromos fogos…
Possuem a mais maravilhosa pirotecnia que tenho visto até hoje… Calculem
vocês que eu me entusiasmei por tal forma que trouxe comigo grande quantidade
desse fogo para me entreter aqui, nas noites de socego… * * * Foi então que Mariana Meyer,
outra veterana do cinema, sem a protecção com que
Deus favorecera Edda e Fritz
Meyer, seu marido – um bilioso que odiava o mundo e
os homens, fizeram a Edda a terrível revelação. Na sua
ausência, Mae Muller, uma gatinha ambiciosa e
velhaca, conquistara por tal fórma a simpatia dos “metteurs-en-scéne” que lhe tinham dado o primeiro papel
no filme em preparação. E ela com tanta sorte e tão bem guiada, que
conseguira fascinar os “patrões”… Todos diziam que ficaria agora, como
estrela da Companhia, a substituir Edda… – Quantos films fez ela
já? Indagou Edda muito pálida. – Termina hoje a primeira série. Entraram no “studio” e viram-na
trabalhar… Mae Muller era realmente uma vocação;
mas, sobretudo, o que a fazia brilhar era a adaptação ao seu feitio felino,
do papel que lhe tinham distribuído. – Esta gente esta toda iludida – segredava
Mariana ao ouvido de Fritz. Dêem-lhe outro papel e
verão que estenderete… * * * Naquela tarde, o director
chamou ao seu gabinete Fritz, Mariana e Edda. A esta disse, com frases sinuosas, que tinham
combinado intermediar o seu trabalho com o da nova estrela… para que ela, Edda, não tornasse a adoecer, de fadiga… Para Mariana tinham uma triste noticia:
obrigados a comprimir um pouco os orçamentos, viam-se na triste necessidade
de suspender, durante algum tempo, os seus serviços… Fritz encolerisou-se,
insultou o director – atirou-lhe um tinteiro á
cabeça. Remate natural; marido e mulher foram despedidos. * * * Ao cair da tarde, retiniu aflictivamente
a campainha de alarme dos “studios” da “Deutch-Film”… Pela frente da casa de ferro, onde os
operadores guardavam o negativo dos films,
surdiram, como vermelhos punhaes, rubras chamas…
Quando os bombeiros do “studio” chegaram já todo o celoloide da ultima película –
da película que devia trazer os oiros da gloria e da fortuna a Mae Muller – tinha ardido… Não era natural aquele
incêndio. Tratava-se, evidentemente, dum crime… Mas o único indicio, era um
tubo de folha colorido, cheirando a pólvora e que dizia, no rotulo chamuscado: “Vulcão de Estrelas”… * * * O “metteurs-en-scéne”,
agitando nas mãos esse tubo de folha, exclamou: – Não dêem voltas á
cabeça… O incêndio do film só podia ter sido
lançado por… * * * NOTA: Ortografia da época (1927) ############### GENTIL MARQUES
RECORDANDO REINALDO FERREIRA Em 1927 Reinaldo Ferreira, com os seus “50 Contos
Misteriosos”, dava início, no “Jornal de Notícias”, problemística
policiária em Portugal. Seguiu-se-lhe, em 1929, L. Figueiredo, com a secção
“O leitor é Sherlock Holmes?”, na revista
"Notícias Ilustrado”. Mas sem dúvida que o grande divulgador da
modalidade, que decisivamente contribuiu para grande expansão que a partir
daí veio a registar ao longo dos anos, foi Gentil Marques. Gentil Marques (de quem aqui voltaremos a falar
em breve) foi licenciado em Biologia, mas foi à escrita (livros e jornalismo
- onde manteve estreita relação e colaboração com Reinaldo Ferreira - à rádio
e ao cinema que dedicou praticamente toda a sua vida. E foi precisamente sobre Reinaldo Ferreira que
Gentil Marques publicou, em 1979, no Jornal algarvio “Domingo”, umas quantas
crónicas cujas cópias então nos enviou, que, por conterem revelações curiosas
e algumas até inéditas sobre aquele, iremos a partir de hoje reproduzir. NOS CAMINHOS DA AVENTURA… Por: GENTIL MARQUES “E, de
repente, a Saudade voltou. Impetuosa, como sempre, E, como sempre também,
apaixonante! A próxima
realização em Santarém da festa final (de convívio e amizade) de uma
esplêndida (e oportuna) iniciativa de Domingos Cabral (com a boa e generosa e
útil colaboração de Constantino) intitulada sugestivamente “I Jogos Florais
Policiários” –de cujo Júri de classificação eu e a
Mariália fazemos parte, por convite honroso e amável - levou-me a regressar
(em pensamento) muitos anos atrás. No tempo. E no espaço. Lembrei-me dos
meus primeiros tempos em Lisboa. Chegara do Algarve (onde já me iniciara no
jornalismo aos 13 anos de idade, como director do
jornal "O Mocho" e correspondente da revista "Stadium" e do semanário "Repórter X") e
vinha carregadinho de sonhos e de esperança. Fui ainda um
dos últimos companheiros (e discípulo) do Mestre Reinaldo Ferreira, o
"Repórter X", no seu reduto do "Café Chave d’Ouro". Como este
homem escrevia, santo Deus! Não mais o poderei esquecer. Estou a vê-lo ainda,
ardendo em imaginação, debruçado sobre o papel branco e enchendo páginas e
páginas, com a sua letra nervosa e irregular. Novelas, reportagens, artigos,
crónicas, entrevistas, contos... sei lá o que saía
daquele talento em labareda?! Mas não me
recuso a aceitar que isso veio a ter grande influência na minha vida. Quando assumi
a chefia da redacção da revista "Vida Mundial
Ilustrada" – de parceria com o Leão Penedo e com o Rogério de Freitas,
deliberei criar uma Página de Mistério e Aventura, tentando fazer ressuscitar
os tempos áureos do famoso "Repórter X". E, talvez por imposição dele próprio - cujo
espírito, afinal, pairava sobre todos nós – criar também um pseudónimo para
dirigir essa página – "REPÓRTER MISTÉRIO". Foi o
princípio de tudo! Durante muitos anos o pseudónimo do "Repórter
Mistério" tornou-se popular em todo o País. Primeiramente,
tal como já referi, na revista "Vida Mundial Ilustrada". Depois,
uma nova série da revista "Detective",
continuando o êxito alcançado anteriormente pelo Mário Domingues, outro
grande companheiro. Mais tarde, no "Cartaz" (que eu fundei e
dirigi) - com a secção "Cartaz Policial, onde se revelaram autênticos
valores da actual Literatura de Ficção. E, ainda
mais tarde, numa secção do “Diário Popular” – também essencialmente destinada
a problemas de Mistério e Aventura”. Entretanto, eu
casara com a Mariália (que já colaborava comigo, nesses terrenos, usando o
pseudónimo de “Mini Sherlock Holmes”, que tanto
intrigou os leitores desse tempo) - e que se tornou para mim companheira
permanente no trabalho e na vida, nas alegrias e nas tristezas, nos sonhos e
nos desânimos, nas vitórias e nas derrotas, - e ambos enveredámos pela
carreira de escritores policiais com pseudónimos estrangeiros. Quantos
leitores terão seguido de fio a pavio os nossos
romances, julgando tratar-se de autênticos autores internacionais? Milhares,
muitos milhares - posso afirmar, atendendo ao número de volumes que
publicámos e às edições dos mesmos. Porquê o
pseudónimo estrangeiro? Os editores
impunham-nos esse ardil, porque, na opinião deles, “santos da casa não fazem
milagres”. E, assim, num País pequeno como o nosso, nada se poderia passar de
anormal que não fosse conhecido de toda a gente... Nem as
maravilhosas reportagens de Reinaldo Ferreira (“Repórter X”) entre elas a do
assassinato da actriz Maria Alves e a descoberta do
caso Alves dos Reis – nem a contribuição de outros valores, como Ferreira de
Castro, Mário Domingues e Fernando Pessoa (só há muito pouco tempo revelado
ao público sob esse aspecto) conseguiram modificar
a opinião formalizada. E hoje em dia
muitos dos nomes estrangeiros que se estampam nas capas de romances policiais
ou de ficção científica, editados no nosso País, são precisamente... pseudónimos de autores portugueses! Que – aliás – e
para esclarecimento dos leitores interessados no assunto, a chamada
modernamente “temática policiária” tem, em Portugal, pouco mais de um século
de existência. Iniciou-se,
por assim dizer, com “O Mistério da Estrada de Sintra”, publicado
primeiramente em folhetins no “Diário de Notícias”, em 1870, com autêntico
escândalo da opinião pública – e que se soube, mais tarde, ser apenas um
romance imaginado pelo talento de Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão. Porém, por
curiosa coincidência, no mesmo ano em que Edgar Allan
Poe, na América, publicava a sua primeira grande história de Mistério - que
iria abrir novos horizontes à Literatura de Ficção de todo o Mundo – em 1841 –
nascia em Lisboa aquele que se pode (e deve) considerar o primeiro escritor
policial português, na melhor acepção e com todas
as características do género. Refiro-me a Francisco Leite Bastos – um primo
de Gervásio Lobato, o notável humorista do século passado – e que escreveu
alguns romances consagrados no tempo e hoje praticamente desconhecidos do
grande público, como, por exemplo, “O Crime de Mata Lobos”, “O Incendiário da
Patriarca!” e, principalmente, “As Três Aventuras do Homem Pardo”. Mas disso
(e de outras coisas mais) falarei na próxima crónica de Domingo.” (Texto de 1979) (Continua)
Fontes: Secção
Correio Policial, 4 de Junho de 2021 | Domingos Cabral Blogue Repórter de
Ocasião, 30 de Junho de 2025 | Luís Rodrigues |
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© DANIEL FALCÃO |
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