M. CONSTANTINO

(21.Abril.1925 – 30.Novembro.2019)

CALEIDOSCÓPIO 27

EFEMÉRIDES – Dia 27 de Janeiro

Lewis Carroll (1832-1898) – Charles Lutwidge Dodgson nasce em Daresbury, Halton, Cheshire – Inglaterra. Lewis Carroll é pseudónimo literário deste matemático, fotógrafo e escritor. É educado na Universidade de Oxford, onde mais tarde é professor de matemática; é ordenado diácono pela Igreja Anglicana em 1832. De carácter tímido e bondoso vê o seu grande valor matemático ultrapassado pelo mérito da palavra escrita. Como escritor é um marco da literatura de fantasia e uma referência entre os grandes da Literatura Universal. Alice no País das Maravilhas (1865) e Alice do Outro Lado do Espelho (1871) são obras-mestras entre os clássicos. Todavia, se o matemático é ultrapassado pelo escritor, é justo não esquecer os Jogos de Lógica (1886) e Lógica Simbólica (1896) como adestrações intelectuais. Lewis Carroll tem uma paixão por enigmas, e por isso a sua obra literária contém jogos de palavras ou enigmas e é frequente a inclusão de acrósticos na sua poesia. Outra área em que é perito liga-se ao desenvolvimento de códigos e cifras. Entre 1858 e 1875 cria cinco cifras que utiliza na sua correspondência pessoal; todas são baseadas no sistema de substituição, onde cada letra é substituída por outra e a palavra-chave é a base da cifra. O interesse de Lewis Carroll pelos desafios lógicos está bem manifestado em A Tangled Tale (1885) um conjunto de contos curtos e enigmas, publicados pela primeira vez em revistas e posteriormente reunidos em livro.

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UM TEMA – LITERATURA: O QUE É A LITERATURA DE FANTASIA?

Tal como entendemos, não é possível conceber um conceito de literatura de fantasia, já que em boa verdade toda a literatura é invariavelmente fantasia, em razão dos elementos imaginários que comunica. Só na representação ou intenção se poderá distinguir a realidade empírica que se mostra aos seus sentidos, ainda que copie o que existe, ao contrário da fantasia. Esta, proveniente do latim phantasia significa irreal, quimérico, imaginário. Fantasia aplica-se de forma indiscriminada a qualquer tipo de literatura que não dê prioridade à representação realista, designadamente os contos de fadas, folclore dos mitos, lendas, alegorias utópicas, abrange a ficção científica e o terror. Fantasia representa a violação daquilo que se aceita como possível, implica o exagero ou distorção da natureza, sempre em ruptura da ordem da realidade.

CONTO – UM MUNDO MELHOR

O presente conto, com mais de duas décadas, da autoria de Luis Britto Goraz (Brasil?) contem uma tripla vertente:

É um conto de ficção científica;

É uma alegoria;

É uma lição de sabedoria destinada àqueles que na vida procuram dispensar o trabalho.

UM MUNDO MELHOR

E conseguiu-se a sociedade perfeita, atenuou-se a loucura da espécie humana e os homens ficaram dispostos a dedicar os seus esforços à consecução de um objectivo.

Então reconheceram que não havia objectivo algum ao qual se pudessem dedicar…

Entretanto, foi idealizado como objectivo a falta de todo o objectivo

Em primeiro lugar, a humanidade que libertar-se do trabalho, e assim se iniciou uma louca correria ao trabalho conjunto destinada ao objectivo – não trabalhar.

Finalmente, todo o trabalho humano foi feito por máquinas, e as máquinas foram construídos por outras máquinas, que por sua vez eram dirigidas por máquinas, assim se libertou a humanidade do trabalho.

Porque todas as faculdades mecânicas do homem, a sua musculatura, os seus membros e as possibilidades de mover-se e de mover objectos, deixaram de se úteis, atrofiaram-se – acabaram por desaparecer.

Em segundo lugar, havia que libertar-se a humanidade da escravatura do alimento.

Todas as potencialidades químicas se implementaram na síntese das proteínas e dos hidratos de carbono a partir de matéria inanimada e do calor, e, finalmente, mediante a energia atómica, força e matéria foram transmutadas nos laboratórios até que formaram a mais apurada – quinta-essência – alimentícia, susceptível de passar directamente ao canal sanguíneo sem prévia digestão.

Como a boca, o estômago, o intestino, o fígado e, em geral, as vísceras deixaram de ter a pesada tarefa de extrair energia dos alimentos, atrofiaram-se e acabaram por desaparecer.

Em terceiro lugar, que libertar-se a humanidade da morte. E os laboratórios eliminaram as toxinas que produziam a degeneração, antes conhecida por velhice, corrigiram os genes que suicídio a partir da matéria orgânica resultante da síntese do protoplasma, e desta a síntese da imortalidade.

Com a desnecessidade de reprodução os órgãos de geração atrofiaram-se e acabaram por desaparecer.

Nesta alvorada do espírito o intelecto, já dono e senhor do Universo, estava capaz de lançar-se à mais audaz das aventuras.

Libertado do trabalho, da fome, do sexo, libertado da morte, o cérebro humano dispunha-se a criar o seu mais potente fruto: aquele que não nascia das vísceras nem do apetite da carne.

Um acontecimento enorme, porém estava por surgir: com efeito, o cérebro humano também deixou de ser necessário, também se atrofiou e também havia acabado por desaparecer.

M. Constantino

In Policiário de Bolso, 27 de Janeiro de 2012

 

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