Autor

Abrótea

 

Data

7 de Abril de 2013

 

Secção

Policiário [1131]

 

Competição

Campeonato Nacional e Taça de Portugal – 2013

Prova nº 3 (Parte I)

 

Publicação

Público

 

 

UMA QUESTÃO DE OBSERVAÇÃO

Abrótea

 

Mimosa Lúcia, 34 anos, uma beleza inconfundível e voluptuosa figura, mandou um beijo para aquele que era seu marido havia um ano, Canorço Honesto de 85 anos, cuja figura e “pilha”, não estavam na melhor forma.

 “E este é o Sr. Canorço Honesto”, disse, dando uma risadinha tímida e brincando com os seus cabelos. "Quero dizer, este é o meu marido”, disse ela docemente.

 Psiuu, Lúcia”, falou com uma voz envelhecida, mas amorosa, acariciando sua jovem esposa na cabeça.   

  Solerte Rufia sorriu para o casal e pensou em todos os segredos que ele já sabia sobre este casal incompatível, desde o dia do casamento. Ele sabia que ela tinha casado com o velho apenas pelo seu dinheiro, mas isso não era grande segredo. Com mil diabos, até mesmo o velhote já devia ter adivinhado isso.

  O que o velhote não sabia era que agora Solerte tinha 5.000 euros em sua posse, um pré-pagamento de Mimosa, que era mecânico a tempo parcial e vigarista e extorsionário a tempo inteiro, em troca de um plano para matar o Sr. Canorço, assim Mimosa poderia legalmente herdar todo “carcanhol”, e seria a viúva mais rica e a mais desejada de metade deste continente.

Solerte estendeu a mão. “Prazer em conhecê-lo, Sr. Canorço. Eu entendo, o seu Rolls ainda tem aqueles barulhos esquisitos?”

“Não que eu tenha notado, Sr. Rufia. Ainda assim, Mimosa continua a dizer que ouve algum tipo de som tinindo.”

 O Sr. Canorço riu. “A audição de Mimosa é, provavelmente, mais acentuada do que a minha e bem melhor. Ela diz que você é o melhor mecânico aqui da cidade e arredores.”

“Trabalho numa grande garagem local, onde só estão os melhores.”

Em parte era verdade. Solerte, na garagem, desempenhou um papel menor como mecânico; troca de óleo, pneus furados, etc. Levaria o seu amigo Espada para a oficina e este cortaria as linhas de freio tão habilmente que iria parecer um acidente. Espada, era o que se chamava de especialista em “assassínios acidentais”.

“Eu não conheço esse tipo pessoalmente”, disse Solerte no calor do momento, “mas meu chefe recomendaria ele.”

“Deixe-me chamar e ver se eu posso trazê-lo até aqui para dar uma olhada rápida no seu Rolls.”

Então não? se ele e Espada haviam crescido juntos. Espada era o tipo perfeito e se as coisas dessem para o torto…. Nunca fez mal a ninguém tomar algumas precauções antes de um trabalho como este. Cautela e caldos de galinha…

Solerte carregou um número, esperou alguns minutos e depois franziu a testa. “Hmm, ele parece estar a longe.”

“Talvez ele esteja fora da cidade”, disse Canorço Honesto.

“Não, ele estava na garagem esta manhã”, Solerte murmurou, “ainda vou deixar que o telefone toque mais um par de vezes. Eu quero dizer, meu chefe tinha-o lá. Estava a trabalhar para outro cliente. Já o vi lá mais vezes. É assim que eu o conheço. De vista.”

Solerte silenciosamente amaldiçoou o seu erro, esperando que não se tivesse espalhado ao comprido, e olhou de soslaio para Mimosa.

“Ele não está a responder”, disse Solerte para Mimosa. “Talvez seja melhor tentar mais tarde.”

“Não!” disse Mimosa, mais alto do que o devido, então forçou um sorriso e estendeu a mão para o braço do marido.  

“Eu quero dizer, aqui o Sefas vai a conduzir todo o caminho até Bragança esta noite. Quero ter certeza de que ele faz uma boa viagem.”

Ela franziu ligeiramente a testa para Solerte. “Sr. Rufia, esta é a era da tecnologia, não é? Se esse fulano, Espada não pode ser contactado por telefone, porque pode estar ocupado, ou não ouviu, não pode enviar msg de texto?”

O rosto Solerte iluminou-se. Era verdade que se o seu amigo Espada estava a almoçar ele não atendia o telefone e já era ao meio-dia. Fora inteligente Mimosa lembrar-se disso. Solerte rapidamente digitou a msg, um toque no "enviar para" número que ele queria e transmitiu a mensagem.

Tudo funcionou como por um encanto, ou quase… O Sr. Canorço decidiu fazer a sua caminhada diária, antes de se preparar para a longa viagem que o levaria ao Marão. Espada apareceu e, com Canorço Honesto, bilionário, fora do caminho, fez um trabalho especialista em cortar as linhas de freio do Rolls Royce. Então tudo o que, Espada, Solerte e Mimosa, tinham a fazer era sentarem-se e imaginar toda a massa que estaria caindo do céu, em suas mãos, dentro em breve. Mimosa, sabia que a estrada por onde Canorço estaria dirigindo naquela noite era mortífera, tinha sido obra de um engenheiro inglês, cheia de curvas e contracurvas, como Mimosa, esta ensaiou um olhar de choque e derramou algumas lágrimas de crocodilo sobre a morte inesperada de seu amado marido.

Somente quando o Sr. Canorço voltou, e com ele vários polícias, juntamente com outro homem à paisana, eles voltaram à Terra.

“Oficiais”, disse ele, apontando para as três pessoas totalmente apanhadas de surpresa. “Eu quero que os senhores prendam minha esposa, esta aqui, junto com esses dois homens como seus cúmplices por tentativa de homicídio.”

Ele virou se para o homem à paisana. “Detetive, acho que o senhor tem consigo um especialista para verificar o meu Rolls Royce estacionado aí fora. Eu acho que você vai encontrá-lo de algum modo “trabalhado” de jeito a provocar a minha morte prematura.”

“Não!” Mimosa gritou, saltando para seus pés.

“O quê?” Espada gritou, pulando para cima de um polícia e tentando saltar, antes de ser agarrado por outros polícias.

Solerte Rufia foi o único que permaneceu calmo. Levantou-se, suspirou, olhou para os olhos lacrimejantes azuis de Canorço Honesto:

“Como é que descobriu?”

 

SOLUÇÃO

© DANIEL FALCÃO